A Inteligência Artificial (IA) pode estar prestes a dar um salto qualitativo graças a um modelo criado em Portugal, que foi inspirado diretamente na forma como os primatas vêem o mundo. Designado de EVNets (Early Vision Networks), estas foram desenvolvidas por investigadores do INESC-ID, Instituto Superior Técnico e Fundação Champalimaud.

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O trabalho, que foi recentemente apresentado na NeurIPS 2025, em San Diego, uma das conferências mais prestigiadas e competitivas da área, propõe uma mudança de paradigma no desenvolvimento de novas plataformas de IA. Segundo os investigadores associados ao estudo, os novos modelos de IA devem procurar inspiração na biologia, como os processos neurais de animais e humanos no design algorítmico, evitando assim as questões ambientais e de escalabilidade associadas aos modelos cada vez maiores e mais poderosos.

Usando como exemplo as capacidades de reconhecimento de objetos por IA, que avançou rapidamente na última década, esta continua vulnerável a perturbações visuais mínimas, como alterações subtis de brilho ou contraste. A visão humana, pelo contrário, lida com essas variações com grande naturalidade. Para colmatar esta diferença, a equipa recorreu ao conhecimento da neurociência para criar uma arquitetura que replica os cálculos realizados pela retina, pelo núcleo geniculado lateral e pelo córtex visual primário.

EVNets
EVNets

As EVNets, agora apresentadas, combinam um bloco inspirado no módulo V1 criado anteriormente por Tiago Marques no MIT, com um novo módulo que simula etapas subcorticais fundamentais no percurso entre o olho e o cérebro. Os resultados mostram não apenas uma robustez superior em tarefas de visão por computador, mas também uma maior proximidade ao funcionamento biológico quando avaliados por métricas como o Brain-Score.

Segundo os autores, esta aproximação não só melhora o desempenho, como torna o modelo mais interpretável, uma qualidade cada vez mais valorizada num panorama dominado por sistemas pouco transparentes. Partindo de mecanismos já conhecidos da biologia, é mais fácil compreender e explicar o que o algoritmo faz e porquê.

A investigação abre ainda portas a aplicações fora do domínio tradicional da visão por computador. Uma das primeiras está já a ser explorada no Programa de Investigação em Cancro da Mama da Fundação Champalimaud, onde os investigadores procuram perceber se as EVNets conseguem lidar melhor com imagens médicas provenientes de fabricantes diferentes, um problema real que tem dificultado a adoção de IA na área clínica.

Se as melhorias em robustez e precisão observadas em tarefas de visão por computador se traduzirem para os problemas de imagiologia médica, então a solução proposta pelas EVNets poderá contribuir para diagnósticos mais consistentes e um apoio mais fiável aos profissionais de saúde.

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