
Por Tiago Cunha Martins (*)
É já este domingo, 18 de maio 2025, que os portugueses elegem os deputados à Assembleia da República, num momento em que o digital ocupa, cada vez mais, um lugar central nas agendas políticas. Não se trata apenas de tecnologia. O digital é, hoje, uma questão económica, social, política e até cultural. Está em jogo a forma como o Estado se relaciona com os cidadãos, como as empresas inovam e competem, e como a sociedade se prepara para os desafios da inteligência artificial, da conectividade e da proteção de direitos fundamentais no espaço digital.
É por isso que vale a pena olhar para os programas dos partidos (com assento parlamentar) e perceber como cada um deles se posiciona sobre o futuro digital de Portugal. O que defendem? Que papel atribuem ao Estado? Como pretendem regular a inteligência artificial? O que propõem para garantir que ninguém fica para trás na transformação digital?
Duas visões em confronto: Estado regulador ou facilitador do mercado?
Na análise que fiz estes dias, permitiu identificar padrões, centrados em dois blocos principais.
Por um lado, partidos como o Partido Socialista (PS), o Bloco de Esquerda (BE), o Livre, o Partido Comunista Português (PCP) e o PAN – Pessoas-Animais-Natureza advogam um papel ativo e estruturante que lidera a transição digital e garante que a tecnologia serve o interesse público. Estas forças políticas sublinham a importância de políticas públicas robustas para garantir o acesso universal às tecnologias digitais, combater as desigualdades e assegurar uma regulação ética e democrática da inovação tecnológica. Por exemplo, o PS aposta numa transição digital transversal e empreendedora, enquanto o BE e o PCP defendem a utilização da tecnologia ao serviço do interesse público e da soberania nacional. O Livre propõe uma gestão pública das infraestruturas digitais e o reconhecimento de bens digitais como património público. Já o PAN enquadra a transição digital como parte de uma estratégia mais ampla de desenvolvimento sustentável e de justiça intergeracional.
Por outro lado, a Aliança Democrática (PSD/CDS-PP), a Iniciativa Liberal (IL) e o Chega apresentam uma visão mais liberal da transição digital. Estas forças políticas privilegiam a desburocratização do Estado, a simplificação administrativa e o estímulo à iniciativa privada. Por exemplo, a AD propõe um Estado mais ágil e orientado para o cidadão, através da modernização tecnológica dos serviços públicos; a IL defende a fusão de várias estruturas de serviços digitais numa só estrutura para liderar a digitalização da administração pública; e o Chega concentra-se em medidas de segurança para a proteção das jovens no ambiente digital.
O Que Une os Programas? Serviços Públicos, Conectividade e Capacitação
Apesar das diferenças ideológicas, existem pontos de convergência. Todos os partidos defendem a modernização da administração pública, com serviços digitais mais simples, acessíveis e próximos dos cidadãos. A expansão da infraestrutura de conectividade é uma prioridade comum, com o objetivo de combater as desigualdades territoriais e garantir que todos os cidadãos e empresas têm acesso às infraestruturas digitais.
Outro ponto comum é a capacitação digital da população. Todos reconhecem que é necessário investir na formação em competências digitais, seja em áreas básicas, seja em domínios mais especializados como a inteligência artificial, a ciência de dados ou a cibersegurança. A diferença está na ambição e na forma de operacionalizar essa capacitação: enquanto uns defendem políticas públicas universais, outros preferem deixar o protagonismo à iniciativa privada.
Inteligência Artificial: O Tema que Mais Divide
O debate em torno da regulação da inteligência artificial (IA) é, talvez, o que mais visões alternativas. PS, BE, Livre, PCP e PAN defendem uma abordagem ética e responsável, alinhada com os direitos fundamentais, a proteção da privacidade e a não discriminação. Estes partidos querem garantir que a IA não aprofunda desigualdades nem viola direitos humanos.
Em contrapartida, AD, IL e Chega adotam uma perspetiva mais favorável à inovação e à competitividade. Defendem uma regulação leve, que não crie barreiras desnecessárias ao desenvolvimento tecnológico. A IL, em particular, defende que o Estado deve atuar como parceiro do ecossistema tecnológico, criando condições para a experimentação e o crescimento de soluções inovadoras.
A execução: o verdadeiro desafio da próxima legislatura
Embora os programas estejam cheios de boas intenções e propostas ambiciosas, o verdadeiro teste estará na capacidade de as concretizar. A experiência de anos anteriores mostra que a execução das políticas digitais em Portugal tem sido lenta e desigual, com muitas iniciativas a ficarem aquém das expectativas.
O próximo governo terá o desafio de transformar os compromissos eleitorais em resultados concretos e mensuráveis, garantindo que a transição digital melhora efetivamente a vida das pessoas, a competitividade das empresas e o funcionamento das instituições públicas.
Num contexto político fragmentado, a capacidade de diálogo e de construção de consensos será decisiva para que o digital se afirme como uma prioridade nacional transversal e não apenas como uma bandeira de campanha.

(*) Especialista em Políticas Públicas, Tecnologia e Governação digital
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