Por Tiago Esteves (*)
Desde que o fluxo de dados transfronteiriços se tornou o foco da presidência japonesa do G20, em 2019, o enquadramento da confiança no fluxo de dados – Data Free Flow with Trust (DFFT) – tem sido uma prioridade dos responsáveis das 20 principais economias do mundo na promoção da digitalização a nível global.
O e-commerce transfronteiriço aumentou 45 vezes numa década, e prevê-se que chegue a um valor estimado de 2,7 biliões de dólares (do inglês trillion) este ano de 2023. Também está estimado que 70% do valor acrescentado criado na economia nos próximos dez anos estará assente em modelos de negócio e plataformas digitais.
No mais recente relatório Data Beyond Borders, a Salesforce examinou a abertura das economias do G20 no que diz respeito a fluxos de dados transfronteiriços, assim como o impacto dos mesmos na sua competitividade.
Torna-se clara a relação direta e positiva entre o movimento transfronteiriço integrado de dados e a capacidade de um país oferecer oportunidades às suas populações, comunidades e empresas, num contexto de uma crescente digitalização da economia. Por outro lado, a implementação de medidas de restrição e localização de dados podem impedir a inovação e a liberdade económica individual.
Podemos prever que a presidência Indiana do G20, em 2023, irá aproveitar este potencial de crescimento económico. No entanto, estamos perante um desafio importante no que diz respeito à conciliação de diferentes abordagens ao controlo de dados digitais entre os países do G20, assim como na forma como enfrentam as preocupações em torno dos direitos de detenção dos dados.
Ao trabalharem em conjunto, as maiores economias do mundo têm o poder de criar um futuro mais aberto para todos.
Lutar contra a exclusão digital, com dados
Embora o relatório mostre que a simplificação dos fluxos de dados transfronteiriços está a progredir de forma clara nas economias do G20, também expõe uma lacuna económica entre os países que adotam políticas abertas de transferência de dados e aqueles que não o fazem. Se não forem devidamente abordadas, essas divisões acentuadas podem ser ampliadas ao longo do tempo, afetando os potenciais benefícios de promover economias digitais mais abertas.
Uma economia que simplifica os fluxos de dados transfronteiriços tem maior probabilidade de criar um ambiente económico propício ao crescimento de um ecossistema dinâmico de startups e inovações baseadas em dados.
O relatório identifica cinco formas através das quais os países podem apoiar o fluxo de dados transfronteiriço e incentivar a inovação.
1. Promover a convergência e interoperabilidade nas leis de privacidade
A diversidade regulatória apresenta um desafio significativo na transferência eficaz de dados entre fronteiras. Os governos devem procurar reduzir a variação nas leis de privacidade, algo que apoia as empresas e promove uma maior cooperação e confiança entre os países.
Os esforços para harmonizar obrigações e requisitos em relação às transferências de dados internacionais aceleraram significativamente desde 2021, um crescimento que deve ser sustentado. O G7 desenvolveu um plano de ação para promover o fluxo livre de dados com confiança, em maio de 2022, promovendo a futura interoperabilidade regulatória digital.
2. Expandir os acordos da economia digital, com provisões de dados transfronteiriços
Os acordos internacionais para facilitar o acesso regulatório aos dados além das fronteiras estão a expandir-se. Várias economias do G20 também assumiram compromissos em Acordos de Livre Comércio (FTAs) para promover o livre fluxo de dados e limitar as medidas de localização dos mesmos.
3. Criar estruturas de partilha de dados confiáveis
A incorporação da confiança nas transferências internacionais de dados através de enquadramentos regulatórios robustos de proteção de dados, segurança cibernética e estruturas de classificação de dados, irá permitir fluxos de dados seguros e contínuos.
Os fluxos de dados transfronteiriços são essenciais para a segurança cibernética. Por exemplo, ajudam a detetar e prevenir fraudes, monitorizar padrões de tráfego, identificar anomalias e desviar ameaças potenciais. Além disso, armazenar dados em diversos locais pode reduzir o risco de ataques físicos e ajudar a gerir o encobrimento da rede.
4. Acelerar a digitalização de empresas e serviços governamentais
Os governos estão a realizar esforços de transformação digital para simplificar os processos internos e ampliar e expandir a prestação de serviços públicos.
As expectativas dos cidadãos em relação ao governo também estão a aumentar – pois esperam serviços de alta qualidade que sejam confiáveis, convenientes e rápidos, e que protejam a sua privacidade. Quase dois terços dos consumidores espera que os serviços governamentais digitais tenham um desempenho no padrão das principais empresas privadas.
5. A soberania de dados precisa de ser articulada dentro de um enquadramento definido
A soberania de dados tem como premissa a ideia de que as economias nas quais os dados são recolhidos, mantidos ou processados podem usar as suas leis e estruturas regulatórias para aceder ou utilizar os dados em questão.
Existem formas de gerir a soberania digital, ao permitir plataformas digitais que operam extraterritorialmente. Ter uma forte autoridade independente de proteção de dados, que nem todas as economias do G20 possuem, também pode ajudar muito a lidar com as questões de soberania de dados.
(*) Principal Solution Engineer da Salesforce Portugal
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