Em declarações à Lusa, o magistrado – que representa o país na Procuradoria Europeia (EPPO na sigla em inglês) – sublinhou que estão em causa “dezenas de milhões de euros de fraude em Portugal” e que foi em território português que o processo teve a sua origem.
“O processo estava pendente nas autoridades portuguesas. A investigação começa com a Autoridade Tributária (AT) e o Ministério Público (MP) de Coimbra e, mais tarde, verificamos que havia até um processo mais antigo pendente no MP do Porto. Os processos foram juntos e, inicialmente, havia duas equipas da Polícia Judiciária (PJ) e da AT a trabalhar no processo”, recordou, explicando que a investigação foi comunicada à EPPO em meados de 2021.
De acordo com José Guerra, foi fundamental “não olhar à atividade criminosa de um ponto de vista nacional” para que o processo tivesse desenvolvimentos, levando à operação de hoje, que foi materializada a nível nacional pela PJ, com cerca de 100 buscas domiciliárias e não domiciliárias de norte a sul do país e 14 detenções no Norte, Centro e na zona de Almada pela alegada prática dos crimes de associação criminosa, fraude fiscal e branqueamento.
“A investigação ganhou um impulso quando chegou à procuradoria europeia. Uma vez que não estava definido um prejuízo para Portugal, as próprias autoridades discutiam se devia haver investigação em Portugal”, referiu, continuando: “Se não fosse a perspetiva europeia, o processo não ia a lado nenhum”.
A informação da EPPO aponta para uma fraude global ao IVA de 2,2 mil milhões de euros e uma operação desencadeada em 14 Estados-membros (Bélgica, Chipre, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Itália, Lituânia, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal, Roménia, Eslováquia e Espanha). No âmbito desta investigação tinham também sido efetuadas buscas na República Checa, Hungria, Itália, Países Baixos, Eslováquia e Suécia no passado mês de outubro.
Para o procurador europeu de Portugal, o “êxito” desta operação passou pela forma diferente com que as autoridades olharam para a investigação, com a adoção de uma visão transnacional. As atividades criminosas estendem-se pelos 22 Estados-membros da EPPO, além de Hungria, Irlanda, Suécia e Polónia, juntamente com países terceiros, incluindo Albânia, China, Maurícias, Sérvia, Singapura, Suíça, Turquia, Emirados Árabes Unidos, Reino Unido e Estados Unidos.
“Com um intercâmbio de informação mais amplo que temos na Procuradoria Europeia, é possível a nível central - com os analistas financeiros que temos - fazer uma análise em permanência nos vários estados dos ‘tentáculos’ desta rede e a verdadeira profundidade da operação”, sintetizou.
O comunicado divulgado também pela EPPO adiantou que a investigação a nível europeu durou cerca de ano e meio e terá exposto “a maior fraude carrossel em matéria de IVA” na União Europeia, permitindo estabelecer “ligações entre a empresa suspeita em Portugal e cerca de 9.000 outras entidades jurídicas, e mais de 600 pessoas singulares localizadas em diferentes países”.
A atividade criminosa passava pela constituição sucessiva de uma complexa cadeia de empresas, na sua maioria de venda de equipamentos informáticos em plataformas ‘online’, que operavam executando os atos necessários para se “enriquecerem” com as quantias de IVA recebidas da venda desses produtos a clientes finais, num esquema típico da ‘Missing Trader Intra-Community (MTIC) Fraud’, que lesa os cofres da União Europeia, explicou a PJ.
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