O mundo do software proprietário e do open source já não se divide entre o preto e o branco, e a tecnologia está a evoluir para um modelo mais aberto, que promove a inovação e é reconhecido como influência positiva da Inteligência Artificial, Software Defined Networks e plataformas de Cloud, mas também como um “guia cultural”, que ajuda as empresas a promover a agilidade e a inovação, defende Edgar Antunes Ivo em entrevista ao SAPO TEK.

O gestor da Red Hat para Portugal fala de uma mudança de percepção e uma maior maturidade do mercado, um crescimento transversal a várias indústrias, impulsionado inicialmente pela Administração Pública, e de alguns projetos.

Com a aquisição da IBM a Rede Hat poderá acelerar de forma exponencial e capitalizar a “confiança continuada na estratégia e nos objetivos a logo prazo da Red Hat”, define o executivo.

SAPO TEK: O mundo da tecnologia mudou muito nas últimas décadas. Como vê a evolução do open source?

Edgar Antunes Ivo: O open source empresarial é agora importante a nível estratégico na estratégia de software empresarial de infra-estruturas da maioria das organizações. Isto é visível no recente inquérito global a 950 líderes TI – 69 por cento afirmaram que o open source empresarial era muito ou extremamente importante, e apenas um por cento não o considerou de todo importante. 68 por cento revelaram ter aumentado o seu uso de open source empresarial nos últimos 12 meses e 59 por cento esperam continuar a fazê-lo nos próximos 12 meses.

Esperamos que o crescimento do open source empresarial prossiga, suportando as empresas com a sua modernização de TI (em novas abordagens, desde a contentorização ao armazenamento definido por software e o networking) e desempenhando um papel cada vez mais relevante na transformação digital – 42 por cento dos inquiridos disse já estar a abraçar novas possibilidades de transformação digital graças ao open source.

Há várias razões para este crescimento. No passado, o open source era sobretudo valorizado como forma de diminuir custos. Agora, as organizações reconhecem que ele é capaz de dar acesso a uma inovação mais rápida, o que é crucial para o sucesso dos seus negócios. E se optarem por utilizar open source empresarial ‘com suporte’ de uma marca como a Red Hat, elas podem beneficiar de maior segurança e estabilidade, suporte e acordos de nível de serviço, acesso contínuo a competências e documentação, um ciclo de vida previsível e longo, um ecossistema de parceiros vasto e grande interoperacionalidade com outras tecnologias.

Outro grande desenvolvimento é que o mercado está a começar a ver que o open source não é apenas um modelo de desenvolvimento, é um guia cultural. Uma organização pode usar princípios open source como a colaboração aberta, a meritocracia e as poucas ou muitas repetições, para ajudar a sua cultura de modo a melhor apoiar a agilidade e a inovação.

SAPO TEK: A relação com o mundo do software proprietário já é mais pacífica hoje em dia?

Edgar Antunes Ivo: Actualmente, muitas empresas estão a abraçar o open source, incluindo aquelas que por tradição tinham orgulho no software proprietário. Todas reconhecem que o que é aberto é, em muitos casos, uma forma melhor de fazer as coisas e que, se elas têm de competir com startups ágeis e companhias à escala da web que muitas vezes são movidas a open source, é necessário tirar o máximo partido das opções abertas. Não vivemos numa paisagem a preto e branco – a Red Hat tem fortes parcerias e colaborações com muitas empresas de software proprietário, bem como com congéneres open source.

SAPO TEK: Qual é a situação em Portugal? O uso de software open source aumentou?

Edgar Antunes Ivo: Desde que comecei a trabalhar na Red Hat em 2015, assisti a uma ascensão clara do open source. Em Portugal o percurso é similar ao de muitos outros locais – a percepção do open source empresarial no mercado amadureceu, passando de uma forma de cortar na despesa para a forma mais rápida de inovar, ser mais ágil e conseguir transformar ideias em rendimento de modo mais eficiente. Um excelente exemplo é o de um nosso cliente, o Novo Banco, que está a executar o seu programa de transformação digital com o apoio de open source, incluindo a plataforma de aplicações contentorizadas da Red Hat, a OpenShift, que ajuda o Novo Banco a implementar uma estratégia Hybrid Cloud, Multi Cloud. Mas estamos a ver este movimento em muitos sectores, à medida que as organizações adoptam tecnologias inovadoras e mais ágeis do mundo do Open Source.

Tal como o exemplo do Novo Banco demonstra, uma área de crescimento fulcral para a Red Had é a open hybrid cloud. Mudar para a cloud apresenta inúmeras vantagens potenciais, mas as empresas também querem manter o controlo e a responsabilidade sobre as suas operações e os seus dados, e não querem ficar amarradas a uma única marca de cloud pública. É por isso que procuram modelos multicloud ou híbridos. Todavia, acreditamos que o segredo está na ‘abertura’ – a open hybrid cloud refere-se à integração e gestão de implementações cloud de marcas diferentes usando uma camada comum baseada em ferramentas open source e infra-estruturas que unifiquem o que está on-premise, na private cloud e em múltiplas clouds públicas. Isto dá às empresas um ponto de visibilidade e gestão central, total propriedade e controlo dos dados, e a capacidade de reagir mais depressa a alterações nas exigências de reguladores e clientes.

Essa é uma das razões pelas quais a Red Hat OpenShift tem mais de 1000 clientes agora e é a mais abrangente plataforma Kubernetes empresarial do sector. A Red Hat OpenShift afasta a complexidade subjacente para fornecer um ponto de controlo único para as organizações construírem, implementarem e dimensionarem aplicações numa hybrid cloud, com a flexibilidade para direcionar volumes de trabalho para qualquer dos ambientes cloud sem ter de recorrer a reengenharia ou novos testes.

SAPO TEK: Quais são os principais sectores que utilizam open source actualmente? A Administração Pública é um bom exemplo?

Edgar Antunes Ivo: Vemos que há uma adopção de tecnologias abertas e de práticas de uma cultura aberta transversal a vários sectores. Os dados de clientes da Red Hat mostram que 100% das companhias aéreas, 100% das empresas de telecomunicações e 100% dos bancos comerciais na Fortune Global 500 utilizam tecnologia Red Hat. Os serviços financeiros e as telecomunicações são conhecidos proponentes do open source em Portugal, tal como acontece a nível global. Nas telecomunicações, isto é impulsionado pela mudança para redes definidas por software e pela necessidade de uma inovação mais célere para conseguir suportar aumentos rápidos de dados móveis. As instituições financeiras também enfrentam a necessidade de se modernizarem rapidamente para se manterem a par das exigências do mercado e das alterações às regras, aproveitando a escalabilidade baseada na cloud e uma necessidade de atrair talentos digitais.

Devido ao modelo de desenvolvimento da comunidade do open source, ele está a influenciar muitas das novas categorias de software, da inteligência artificial às infra-estruturas definidas por software, passando pelas plataformas nativas da cloud e muito mais. As organizações que dependem do software para suportar o seu negócio (e é difícil nomear um sector que dele não precise) querer poder aproveitar essa inovação.

Em Portugal, a Administração Pública foi um early adopter e influencer das tecnologias Open Source. Aos poucos, está a aumentar a sua adopção, mas a um ritmo inferior ao de alguns sectores como os mencionados acima. Um dos desafios é haver lacunas nas competências digitais – a ausência das pessoas certas nestas tecnologias. Esta é uma das áreas em que a Red Hat se está a focar, treinando e activando o ecossistema tanto dos nossos clientes como dos nossos parceiros.

SAPO TEK: Quais continuam a ser as principais barreiras ao crescimento do open source?

Edgar Antunes Ivo: Olhando de novo para o inquérito sobre open source empresarial mencionado anteriormente, quando perguntámos aos respondentes acerca dos obstáculos à sua utilização, a segurança continua a ser citada como uma das preocupações relativas ao open source. Isto significa que a segurança está tanto entre as principais vantagens de escolher open source como entre as principais barreiras à entrada para as empresas. Alguns desses receios podem dever-se a preocupações genéricas com a segurança, porque os hacks e as fugas de dados parecem ter-se tornado comuns hoje em dia. Esta preocupação também pode reflectir uma desconfiança face ao código de open source não gerido — que se encontra na web ou se importa através de dependências — e às vulnerabilidades que este pode trazer às soluções open source e às soluções proprietárias. É por isso que é importante distinguir entre software open source gratuito e software open source empresarial fornecido por fontes de confiança. Quando decidimos consumir open source empresarial, estamos a consumir um produto, não um projecto, e a marca fornecerá ferramentas automatizadas para rapidamente descobrir e remediar problemas de segurança, a par de certificar o produto face a determinados padrões.

SAPO TEK: Como está a Red Hat no mercado português e qual a influência que a aquisição pela IBM teve no negócio? Já a sentem?

Edgar Antunes Ivo: A Red Hat cresceu nos últimos quatro anos em Portugal em linha com o seu crescimento a nível mundial, que é 15 por cento superior de ano para ano, com cerca de 30 por cento de crescimento nas nossas tecnologias emergentes e relacionadas com o desenvolvimento de aplicações, tipo OpenShift e Ansible Tower.

Estamos a trabalhar activamente com um grande número de clientes de quase todos os sectores, desde grandes empresas de telecomunicações a bancos, seguradoras, retalhistas ou companhias na área da energia ou dos transportes, só para dar alguns exemplos.

Também estamos a alargar o nosso ecossistema de parceiros, que inclui desde grandes SIs até parceiros especializados mais pequenos. Este ecossistema é estratégico para suportar o crescimento continuado e o elevado nível de serviço que os nossos clientes merecem e exigem.

Alimentada pela IBM, a Red Hat pode dimensionar e acelerar de forma exponencial aquilo que faz hoje. Teremos mais recursos para responder à oportunidade que temos pela frente. Poderemos investir ainda mais e mais depressa para acelerar a inovação open source em áreas emergentes, conseguir alcançar todos os cantos do mundo com relações ainda mais profundas do que as que temos atualmente com clientes e parceiros e ajudar ainda mais clientes a tirar partido da escolha e flexibilidade permitidas pelas tecnologias hybrid cloud e multicloud. Unir forças com a IBM permite tudo isso, anos antes de termos capacidade para o fazermos isolados. Em conjunto, a Red Hat e a IBM podem tornar-se a principal fornecedora de soluções hybrid cloud.

Em Portugal estamos a assistir a uma confiança continuada na estratégia e nos objectivos a longo prazo da Red Hat, pois o nosso foco permanece em ajudar os clientes a suportarem as suas decisões estratégicas com as nossas tecnologias e orientação. A par de uma maior visibilidade no mercado da estratégia e visão da transformação TI da Red Hat para a transformação TI.