
Por Manuel Dias (*)
Vivemos uma transformação sem precedentes, impulsionada pelos avanços da Inteligência Artificial (IA), que molda economias, sociedades e o quotidiano de todos nós. Para Portugal, este contexto é ao mesmo tempo um desafio — exigir mais competências digitais, infraestruturas sólidas e serviços públicos modernizados — e uma oportunidade única para reforçar a competitividade e criar uma Administração Pública mais inovadora, eficiente e próxima dos cidadãos.
A criação do novo Ministério da Reforma do Estado surge como peça estratégica para acelerar esta transição e modernizar profundamente a Administração Pública. Será determinante para alinhar políticas, investimentos e recursos humanos com as metas da Década Digital 2030, assegurando não apenas o cumprimento dos objetivos europeus, mas também ganhos concretos na competitividade da economia e na qualidade dos serviços prestados a cidadãos e empresas.
O mais recente relatório da Comissão Europeia sobre o estado da Década Digital confirma o progresso positivo do país, com avanços consistentes na disponibilização de serviços públicos digitais e liderança no acesso a registos de saúde eletrónicos. A conectividade encontra-se em níveis robustos, com quase total cobertura de 5G (98,7%) e redes de muito alta capacidade (94,6%).
Apesar destes avanços, persistem desafios relevantes. A adoção de IA pelas empresas continua a ser limitada (8,6%, muito abaixo da meta de 75%) e as competências digitais básicas mantêm-se desigualmente distribuídas na população (56% vs. meta de 80%). O ecossistema de start-ups ainda enfrenta dificuldades no acesso a financiamento, com um número muito baixo de unicórnios ativos.
Clique no link para ver o relatório interativo:

Infraestrutura Tecnológica Competitiva, Soberana e Resiliente
Portugal mantém uma infraestrutura de conectividade sólida, com uma cobertura de rede fixa de elevada capacidade de 94,6% e cobertura de fibra óptica de 93,2%, ambas acima da média da UE (82,5% e 69,2% respetivamente). Estes valores colocam o país entre os líderes europeus, próximo da meta de 100% em 2030. Na rede 5G, a cobertura já atinge 98,7%, igualmente acima da média europeia (94,3%), embora persistam desafios na atribuição das bandas pioneiras e na promoção da sua utilização plena.
Em tecnologias emergentes, Portugal quase duplicou o número de edge nodes, passando de 14 em 2023 para 27 em 2024 (+92,9%). Apesar do crescimento acelerado, a meta da UE (10.000) continua longínqua.
Nas PME, 74,3% apresentam pelo menos intensidade digital básica, superando ligeiramente a média da UE (72,9%) mas ainda distante da meta de 90%. Já a adoção de inteligência artificial não ultrapassa 8,6%, muito abaixo da média europeia (13,5%) e do objetivo europeu para 2030 (75%).
No ecossistema de inovação, Portugal continua a contar apenas com um unicórnio (de acordo com os critérios definidos pelo Eurostat), sem evolução face ao ano anterior. Embora o número de start-ups tenha crescido, a meta de dois unicórnios até 2030 é modesta e depende de melhores condições de financiamento.
Capacitar Pessoas, Empresas e Sociedade para a Era Digital
Portugal mantém um nível de competências digitais básicas de 56%, alinhado com a média da UE mas longe da meta de 80%. O fosso digital continua marcado entre jovens e idosos, entre cidadãos com diferentes níveis de escolaridade e entre zonas urbanas e rurais.
O número de especialistas em TIC já representa 5,2% da população ativa, superando a média da UE (5,0%). No entanto, a meta nacional é de 7% para 2030, abaixo do objetivo europeu de 10%, revelando menor ambição estratégica.
Nos serviços públicos digitais, Portugal apresenta 84,5 pontos para cidadãos, acima da média europeia (82,3), e 84,3 pontos para empresas, ligeiramente abaixo da média da UE (86,2). Apesar disso, a taxa de progresso é estável e em linha com as trajetórias nacionais.
A área da saúde digital mantém-se um dos grandes destaques: 88,1 pontos no acesso a registos médicos eletrónicos, colocando Portugal entre os líderes europeus, acima da média da UE (82,7) e bem posicionado para atingir a meta de 100% em 2030.
Além dos indicadores, destaca-se a aplicação Gov.pt, que simplifica a interação com a Administração Pública, e a crescente aposta em literacia mediática e proteção de menores no ambiente digital.
O Roteiro Nacional da Década Digital
Portugal apresentou em dezembro de 2024 um roteiro revisto com 157 medidas, 12 metas e 8 trajetórias, representando um reforço significativo face a anos anteriores. O documento, com um orçamento de 2,15 mil milhões de euros (0,75% do PIB), centra-se em três eixos principais: competências digitais, administração pública digital e digitalização das empresas.
As atualizações alinham-se com as prioridades da Comissão em IA, soberania digital e simplificação, mas áreas como sustentabilidade, inclusão e competitividade continuam a carecer de maior enfoque.
Em termos de investimento, Portugal dedica 21% do PRR ao digital (4,5 mil milhões €) e 11% dos fundos de coesão (2,4 mil milhões €) a projetos digitais.
Recomendações da Comissão Europeia para Portugal
De acordo com o estado atual de Portugal nas várias perspetivas medidas neste relatório, a Comissão Europeia recomendou um conjunto de ações para que Portugal:
- Inteligência Artificial: Acelerar a adoção pelas empresas e implementar as medidas planeadas.
- Cloud: Incentivar a utilização e avance com infraestruturas soberanas.
- Competências Digitais: Combater o fosso social e territorial, visando a meta de 80%.
- Especialistas TIC: Aumentar a atratividade da área e elevar a ambição para convergir com a meta europeia de 10%.
- PME: Reforçar a utilização de tecnologias avançadas (IA, cloud, analytics) em colaboração com academia e setor público.
- Start-ups e unicórnios: Melhorar o acesso a financiamento para scale-ups e I&D empresarial.
- Semicondutores e 5G: Continuar a investir em semicondutores e atribuir as bandas pioneiras de 5G.
- Transição Verde: Adotar uma estratégia integrada que articule digital e sustentabilidade.
Conclusão: Da Reforma do Estado à Liderança Digital
Num momento em que a competição entre mercados pela atração de empresas, investimentos e talento é cada vez mais intensa, torna-se imperativo apostar numa força de trabalho mais qualificada, dotada de competências digitais avançadas, e em empresas mais competitivas e orientadas para a inovação. Neste contexto, a estratégia do Governo para a digitalização e simplificação da Administração Pública assume um papel decisivo. O Ministério da Reforma do Estado, sob a liderança do Ministro Gonçalo Matias, agora dotado de poderes alargados para intervir em institutos e direções-gerais, será determinante garantir que a reforma administrativa se traduz em processos mais ágeis, interoperáveis e digitais, capazes de responder melhor às necessidades dos cidadãos e de criar condições mais competitivas para as empresas.
Estamos no caminho certo para alcançar bons resultados na digitalização do país, mas precisamos de transformar ambição em concretização. O futuro de Portugal dependerá de um único fator: a capacidade de execução — assente na coragem política, na cooperação entre setores e no investimento contínuo em talento, inovação e modernização do Estado.
(*) Diretor Nacional de Tecnologia da Microsoft Portugal
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