Por João Silva Santos (*)

A democratização do uso de Inteligência Artificial (IA) tomou de assalto as nossas vidas, assim que, com o advento dos modelos generativos textuais, como o ChatGPT ou o Gemini, estes foram disponibilizados ao utilizador comum. Até então, os fenómenos de entidades digitais com raciocínios perspicazes resumiam-se às simpáticas vozes de assistentes virtuais, como a Siri ou a Alexa, ou a um ou outro chatbot mais humanizado. Já eram fascinantes, mas até os seus maiores entusiastas se renderam rapidamente à incrível sensação de nos tornarmos os maiores especialistas de qualquer campo do conhecimento, em segundos, que o novo “brinquedo” da OpenAI foi pioneiro em trazer.

A multiplicação destes produtos começou desenfreadamente a desfilar à frente dos nossos olhos, passando do texto à imagem, áudio, vídeo, etc... Como qualquer advento, rapidamente suscitou amor e ódio, fascínio e medo. Certezas e dúvidas.

E, no meio do turbilhão, rapidamente apareceram inúmeros profetas convictos do fim de inúmeros ofícios, agora alegadamente caídos em desgraça. Espíritos inquietos com o fim dos tempos laborais, em linha com os seus ancestrais, cujo pânico se originou aquando do aparecimento de toda a tecnologia que despoletou a primeira revolução industrial. O certo é que estes solavancos evolucionários da tecnologia nunca, até hoje, provocaram uma balança deficitária entre velhos e novos ofícios.

A renovação funcional, que vai subtraindo algumas profissões ao longo dos tempos, também nos tem apresentado um ritmo multiplicativo de novas ocupações. Basta compararmos a lista de labores existentes na idade média e a quantidade galáctica de profissões hoje existentes.

Certo, certo foi que, enquanto este dilema fraturante se instalava um pouco por todo o lado, no âmbito empresarial os use cases destas novas ferramentas foram também aparecendo, quais cogumelos silvestres. Na empresa que dirijo, a merytu, foi rápida a invasão da IA, desde o departamento comercial, operações, a área de desenvolvimento e programação, passando pelas equipas de Marketing e de Design. E rápidas, também, foram as primeiras constatações. Desde logo, que a perfeição continuava a não existir, e que aquela sensação de “maior especialista” em qualquer campo do conhecimento também não era bem assim. Pelo contrário, rapidamente se constatou que quem usava a IA da melhor forma para determinada matéria era exatamente o especialista nessa respetiva área de autoridade.

Ou seja, após as primeiras aprendizagens da recém-chegada prompting science, ninguém conseguia melhores outputs do que os mestres de cada matéria. Por exemplo, nenhum membro da equipa comercial se tornou num ótimo designer, nem das operações em excelentes depuradores de código. Facilmente se percebeu que o leigo não substituía o especialista, e muito menos a própria IA, com a sua (ainda) grande margem de erro, o conseguia fazer por si.

Contudo, o consenso também se gerou rapidamente relativamente ao facto de que a eficiência e a eficácia dos processos de cada área ganharam incrivelmente com as ferramentas de IA agora ao dispor. Seja para desbloquear criatividade, seja para encontrar uma agulha no palheiro das intermináveis linhas de código. Existe definitivamente um antes e um depois, e uma alucinante integração destas tecnologias no dia-a-dia das equipas.

Se por um lado permanecemos expectantes sobre o que o futuro reserva, por agora, o que é certo é que o verdadeiro potencial da “varinha mágica” está reservado aos únicos que dominam bem o “feitiço”.

(*) CEO da merytu