Ao longo de 20 páginas, a Provedora de Justiça analisa a questão, referindo que a lei portuguesa não está a cumprir a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia. “O legislador português acolhe a solução que, expressamente, o Tribunal de Justiça censurou: prevê a conservação generalizada e indiferenciada de todos os dados de tráfego e dos dados de localização de todos os assinantes e utilizadores em relação ao todos os meios de comunicação eletrónica, sem limitar tal obrigação em função dos critérios função dos critérios indicados pelo TJUE".
A recomendação é citada pela Associação D3 – Associação dos Direitos Digitais, que em dezembro de 2017 tinha feito chegar à Provedora de Justiça uma queixa sobre o assunto. Na altura, explicava que estava em causa o facto da inviolabilidade da correspondência e comunicações privadas ser um direito fundamental dos cidadãos.
A Provedora de Justiça entendeu não enviar a questão para o Tribunal Constitucional, dando uma última oportunidade ao legislador de resolver o problema pela via legislativa. “O melhor será que o legislador previna a sua invalidação por intermédio da competência estritamente cassatória do Tribunal Constitucional, adequando-o desde já às exigências decorrentes dos direitos fundamentais”, considera.
Para a D3, “esta é mais uma voz que se vem juntar ao coro que há muito vem alertando o legislador para a necessidade de alteração da lei”, refere em comunicado, apontando como exemplo a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), que “tem insistentemente chamado a atenção para o problema”, através de pareceres e deliberações.
Recorde-se que em junho de 2018, numa acção global conjunta, 62 organizações não governamentais, redes comunitárias, académicos e activistas de 19 Estados-membros enviaram à Comissão uma carta aberta relativa à retenção indiscriminada de metadados. No âmbito dessa iniciativa, foram ainda apresentadas queixas formais à Comissão Europeia por incumprimento, por parte diversos Estados-membros, incluindo Portugal, do Direito da União Europeia.
A Lei nº 32/2008, que transpôs a Directiva n.º 2006/24/CE, consagrou a obrigatoriedade das operadoras de comunicações electrónicas conservarem todos os dados de tráfego e de localização pelo período de um ano. Mais conhecidos por “metadados”, estes dados são todos os dados relativos a uma comunicação, com excepção do próprio conteúdo da comunicação.
No entanto, há muito que o Tribunal de Justiça da União Europeia declarou inválida a directiva que esteve na origem da lei, declarando não ser admissível “uma conservação generalizada e indiferenciada de todos os dados de tráfego e de todos os dados de localização de todos os assinantes e utilizadores registados em relação a todos os meios de comunicação eletrónica” - acórdãos Digital Rights Ireland e Tele2/Watson.
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