Já se imaginou num mundo sem um computador portátil ou mesmo o desktop na secretária onde pode trabalhar, jogar ou comunicar com o mundo? Os computadores domésticos e pessoais devem ao lançamento do primeiro microprocessador 4-bit 4004 pela Intel, no dia 15 de novembro de 1971. Exatamente há 50 anos.

O microprocessador, um pequeno elemento produzido em silício, teve o feito de transformar os computadores de grande porte, estacionados em salas repletas de sistemas de ar condicionado para os manter arrefecidos, apenas ao alcance das grandes corporações, em equipamentos pessoais, usados em cima da secretária, por qualquer pessoa.

E a sua evolução e transformação ao longo dos seus 50 anos faz parte da nossa vida em diversos níveis, não só a alimentar computadores, mas também os smartphones, automóveis, aspiradores e qualquer outro equipamento tecnológico utilizado atualmente. E não deixa de ser irónico como a pandemia de COVID-19 fez disparar uma crise sem precedentes na indústria dos semicondutores, realçando o quanto estamos dependentes das pequenas “bolachas de silício”.

Veja na galeria imagens do primeiro chip da Intel

A procura e a necessidade é tanta em todos os sectores tecnológicos, que as fábricas deixaram de ter capacidade de produzir as quantidades necessárias. E não há um fim à vista para a crise, com certos especialistas a apontar para algures em 2022 uma melhoria na retoma, mas bem mais tarde a total recuperação, considerando as construções de fábricas de empresas como a TSMC unida à Sony, a expansão da Samsung e Intel em parceria com a Qualcomm e Amazon.

Os primeiros produtos da Intel

Como empresa, a Intel comemorou os seus 50 anos em 2018, mas nos primeiros anos foram lançadas outras tecnologias inovadoras, como foi o caso da EPROM, criada por Dov Frohman em 1970. EPROM significa “erasable programmable read-only memory”, ou seja, um sistema de memória capaz de manter a sua programação mesmo sem energia. Uma tecnologia considerada tão importante para o desenvolvimento da indústria dos microcomputadores, como o próprio microprocessador inventado pelo italiano Federico Faggin ao serviço da Intel.

Federico Faggin
Federico Faggin foi o inventor do primeiro microprocessador.

Mas sabe qual foi o primeiro produto comercial da Intel, depois da sua formação em agosto de 1968? Foi simplesmente uma placa de RAM (random access memory), a 3101, lançada em 1969. Durante os primeiros tempos a empresa dedicou-se a fundo na investigação e desenvolvimento, para que o seu início fosse pautado por produtos tecnológicos novos, e não apenas a replicação do que já existia no mercado.

E para acelerar o seu processo, focou-se em três tecnologias em simultâneo: memória bipolar; semicondutor baseado em silício (que viria a revolucionar a indústria, mas primeiro precisou de ser inventado); e memória multichip, em que quatro pequenos chips de memória ligados para formar um outro maior, que embora seja frágil, é barato. Dos três, o referido sistema de RAM 3101 foi o primeiro a ser lançado.

O nascimento do microprocessador que possibilitou o computador pessoal

O processador Intel 4-bit 4004 tinha uma velocidade de relógio de 740 kHz, composto por 2.300 transístores de 10 micrómetros. Tinha uma memória de 640 bytes e era capaz de gerir 92.000 operações por segundo.

O chip foi originalmente desenhado para ser utilizada numa calculadora da Busicom, uma empresa japonesa que comprou os direitos do microprocessador, numa parceria realizada no ano anterior. Masatoshi Shima, um engenheiro eletrónico da Busicom, também contribuiu no design da arquitetura e na sua lógica. Também Marcian Hoff é um novo creditado ao primeiro microprocessador pela formulação das primeiras arquiteturas.

O primeiro e o mais recente processador da Intel
O primeiro chip 4004 e o mais recente processador da Intel, de 12ª geração.

O primeiro equipamento a utilizar um protótipo do microprocessador Intel 4-bit 4004 foi a calculadora com impressora 141-PF da Busicom Corp., que atualmente está em exposição no Museu da História dos Computadores em Mountain View, na Califórnia.

A principal contribuição de Federico Faggin para a indústria dos computadores foi a criação de um chip pequeno, capaz de colocar os 2.300 transístores numa bolacha de silício com cinco vezes mais velocidade e o dobro da densidade do circuito, do que a tecnologia da altura gravada em metal. A sua técnica permitia mais velocidade, capacidade e redução nos custos de produção.

Até à altura, empresas como a IBM utilizavam grandes estruturas computacionais, fechadas em salas, onde se usava gás árgon em vez de água para combater incêndios gerados nestes locais. Em caso de incidente, os trabalhadores tinham de ser evacuados de imediato para não serem sufocados. Veja-se assim como o microprocessador veio alterar o paradigma da época.

A partir, a Intel nunca mais parou de investigar e a desenvolver chips cada vez mais poderosos nestes 50 anos. O sucessor do 4004 foi o 8008 de 8 bits em 1972 com 3.500 transístores; depois o 8086 de 16 bits com 29.000 transístores foi introduzido em 1978, capaz de realizar 710 mil operações por segundo. A IBM criou a sua linha de computadores pessoais com o processador Intel 8088 em 1979.

A lei de Moore

O cofundador da Intel, Gordon Earle Moore, escreveu num artigo publicado na Electronics Magazine no dia 19 de abril de 1965, que a cada 18-24 meses, a capacidade dos computadores aumentaria 100%, ou seja, o dobro da potência, mantendo os mesmos custos para o utilizador. Ou seja, a cada upgrade em cerca de ano e meio, os utilizadores podem atualizar o seu processador pelo mesmo preço que tinha pago o anterior. Esta publicação ficou conhecida como a Lei de Moore, que durante muitos anos manteve-se correta.

Atualmente os especialistas dizem que a Lei de Moore “morreu”, uma vez que a melhoria em termos de performance de processamento tem vindo a abrandar na casa dos 30% anualmente. A Lei de Moore serve como um ponto de referência e não como uma regra literal, como anteriormente.

Lei de Moore
A Lei de Moore

Mas o próprio patrão da Intel já tinha feito uma antevisão de que as suas palavras iam ficar desatualizadas com os anos, e por isso, em 1975, quatro anos depois do seu primeiro microprocessador, fez uma revisão na sua “lei”: a cada dois anos, cada placa de circuito teria o dobro dos transístores. Assim, os processadores ficariam mais potentes, mas os transístores iam ficando mais pequenos (e numerosos).

E essa sim, tem sido a toada tecnológica ao longo dos anos, funcionando como uma meta que todas as fabricantes querem alcançar na evolução tecnológica. Se olharmos para o primeiro microprocessador, lançado há 50 anos, com 2.300 transístores, em comparação com o estado de arte atual, o mais recente processador M1 Max da arquitetura Apple Silicon da Apple, tem qualquer coisa como 57 mil milhões de transístores. É um salto tecnológico sem precedentes neste meio século de microcomputadores.

Mas há 30 anos que se fala que a tecnologia e as técnicas de produção das “bolachas” estão no limite da capacidade. Ainda não se sabe quando será, mas vai chegar a um ponto em que não se conseguem colocar mais transístores nos processadores. Para já, os transístores têm um tamanho de 5 nanômetros, mas já se começa a falar de 3 nm em futuros equipamentos topo de gama. Também o silício utilizado nos processadores podem ser usados por outro tipo de materiais mais eficientes, tais como o grafeno, mas os custos podem definir o processo de transição.

O futuro do processamento

Nas últimas duas décadas assistimos a saltos constantes de performance nos microprocessadores, muito salientado pela indústria de gaming. À medida que os jogos se tornam mais exigentes, a nível do software, os computadores necessitam de responder com mais processamento a nível de CPU e GPU (processamento de gráficos). Nesse sentido, são adicionados mais núcleos aos processadores, sendo atualmente a média entre os 4 e 8 núcleos nas ofertas normais de consumo. O processador mais poderoso da Apple tem 16 núcleos de processamento, mas a AMD já disponibiliza o Threadripper 3990X composto pelos abismais 64 núcleos, numa solução que custa quase 5.000 dólares.

A Intel acaba de lançar no mercado a sua 12ª geração de processadores, com 12 núcleos. Mas o futuro do processamento está a rumar em outras direções. A introdução da computação em cloud e a inteligência artificial com as suas redes neurais, têm sido um complemento importante na evolução da tecnologia. Ou seja, vamos chegar ao ponto em que o processamento nas próprias máquinas é reforçado pela cloud, seja nos serviços de assistentes virtuais, como o Alexa ou Google Assistant. E ao nível dos videojogos já não precisamos de ter um computador com o mais recente processador e gráfica, já se pode jogar no Stadia ou xCloud a partir do “micro-ondas”.

Veja-se a introdução no mercado do primeiro chip da Google nos smartphones Pixel 6, o Tensor, com foco em inteligência artificial e machine learning, como mais um indicador do caminho que a tecnologia pretende seguir.

Outro caminho tecnológico que as grandes empresas procuram atualmente é a supremacia quântica, com gigantes como a IBM a mostrarem novos avanços tecnológicos como o recém-revelado processador de 127 qubits.

Computador quântico da Google

Este tipo de processadores quânticos consegue fazer processamentos impossíveis, sequer, de serem simulados em supercomputadores tradicionais. Mas claro, são computadores gigantes, com formas pouco convencionais, lembrando candelabros, que “regressam ao tempo antigo” à invenção do microprocessador, ocupando autênticas câmaras frigoríficas para conseguirem ser arrefecidos. Não por água, mas por praticamente gelo. Os ciclos “repetem-se” no avanço da tecnologia computacional.