O primeiro GamIberica: Iberian Games Summit realizou-se durante o MEO XL Games prometendo uma aproximação entre os produtores de videojogos portugueses e espanhóis, com debates sobre o estado da indústria e como criar sinergias para alavancar a produção ibérica. O objetivo é falar a “uma só voz” sobre o tema.
Considerando que o mercado de videojogos em Espanha é bastante superior ao de Portugal, os promotores do GamIberica dizem que existem diversas proximidades, não apenas geográficas, como culturais relacionadas ao gaming.
O SAPO TEK assistiu a uma das talks, intitulada “Entering the Iberian Lobby”, que juntou produtores e associações para discutir os desafios e oportunidades em abrir estúdios de videojogos na Península Ibérica. Adriana Faria, da Saber Portugal, estúdio responsável pela série Dakar, começou por dizer que a empresa decidiu abrir o escritório em Portugal devido ao seu excelente fuso horário, permitindo estabelecer contato com todas as suas sucursais espalhadas pelo mundo durante o mesmo dia, seja com os Estados Unidos aos países orientais. Problema que tinha no seu escritório em São Petersburgo na Rússia.
A representante do estúdio salienta também as boas infraestruturas existentes em Portugal quando comparado com outros países. Pode deslocar-se de Gaia a Lisboa em três horas e está a minutos do aeroporto do Porto. “Para empresas como a Saber, que recebem estúdios e representantes de todo o mundo, isto é algo importante”, afirma, rematando que Portugal é um país que sabe receber bem as pessoas.
O painel contou com o produtor italiano Saverio Caporusso, da Troglobytes Games, que decidiu estabelecer o estúdio em Espanha, sendo a principal razão a proximidade das escolas e universidades que apoiam os estúdios independentes. Apontou ainda que existem muitos eventos em Espanha, em que se pode falar com possíveis investidores e editoras, fechando-se bons negócios no país. “Os investidores alemães e dos países nórdicos gostam de ir a Madrid e Barcelona para fazer negócio, devido ao bom tempo e ambiente em geral”.
Além de representantes de estúdios que decidiram fixar-se em Portugal e Espanha, o painel moderado por Ricardo Correia, do IndieX, contou com a presença de Jose Maria Moreno da Associação Espanhola de videojogos (AEVI), Tiago Sousa da Associação Portuguesa das Distribuidoras de Videojogos (AEPDV) e Diogo Rato da Associação de Produtores de Videojogos Portugueses (APVP).
Jose Maria Moreno considera que existem empresas que preferem uma gestão ibérica, tomando conta do mercado português a partir de Espanha, por exemplo. No caso da AEVI, a associação representa tanto os developers como editoras, uma vez que muitos estúdios estão a distribuir os seus próprios jogos. Por outro lado, algumas editoras começam a produzir os seus títulos, sendo necessário estar preparado para trabalhar nos dois lados do negócio.
O representante da associação espanhola traçou algumas comparações entre os dois países, incluindo o talento. Mas destaca que em Espanha existem atualmente mais de 100 cursos que preparam os estudantes para trabalhar na indústria de gaming. Na sua comparação aos dois países, salienta a qualidade de vida como atrativo, assim como os salários mais baixos que outros pontos do mundo, combinando com o excelente talento e infraestruturas. Refere que em Espanha não existe a chamada “taxa de saída”, em que certos países cobram 30% dos resultados do seu negócio. Em Espanha existem subsídios como incentivo à produção de jogos. O valor pode chegar aos 8 milhões de euros por ano, ajudando cerca de 120 projetos anualmente.
Tiago Sousa salienta todos os atrativos que Portugal tem em relação a Espanha, mas acrescenta que os ordenados ainda são mais baixos. Mas aponta a falta dos mesmos programas de formação do país vizinho como um longo caminho ainda a percorrer. Ainda assim, demonstra-se otimista pelas conversações que estão a ser feitas com a Administração Pública para beneficiar o sector. Apesar de estar à frente de uma associação que representa os AAA internacionais vendidos em Portugal, afirma que existe total interesse em apoiar o desenvolvimento interno. Foram feitos contactos com o Ministério da Cultura, mas espera-se falar com outros para alavancar o sector, porque os videojogos pertencem a um mercado global apetecível.
Falar a uma voz é uma necessidade reforçada por Diogo Rato. A associação já conta com mais de 20 empresas, reunidas nos 20 meses de existência da APVP. Se por um lado existe a Saber ou uma Miniclip com centenas de empregados, também há espaço para os pequenos estúdios vingarem, refere em apontamento. No entanto, olha para os incentivos fiscais existentes no estrangeiro no desejo que o Estado olhe para esses exemplos. E garante que também os produtores poderiam beneficiar dos inventivos de I&D existentes para a IA e Deep Tech. Salienta as boas ligações com a América do Sul e África que podem beneficiar da indústria em Portugal.
Diogo Rato refere ainda que existem necessidades específicas para cada país e dá o exemplo de como em Portugal é extremamente difícil de contratar produtores sénior, além de não haver orçamento para lhes pagar. E são os incentivos que as associações, a uma voz, devem tentar junto ao governo e ultrapassar as burocracias, mudar mentalidades sobre esta indústria e mostrar que gera emprego.
A Suécia e a Finlândia são países mais pequenos que a Espanha e relativamente do tamanho de Portugal que estão com uma indústria bem mais avançada, porque a estratégia foi muito bem delineada há vários anos. A Nokia deu uma ajuda no caso da Finlândia no seu arranque, com vários estúdios a conseguir sucesso internacional: A Supercell de Clash Royale, a Rovio de Angry Birds ou a Remedy Entertainment de Alan Wake e Max Payne são alguns dos exemplos.
Países como a Rússia e Estados Unidos que investiram há muitos anos nos videojogos e viram que estes eram lucrativos aconteceu há muitos anos, segundo Adriana Faria, criando os primeiros alicerces desta indústria. Defende que se Portugal e Espanha fossem mais próximos, criando sinergias para apresentar produtos ao resto do mundo, seria mais lucrativo para ambos. Defende que todos querem ter uma indústria automóvel, porque se sabe que é lucrativa.
A Saber diz que quer investir mais em Portugal e Espanha, mas continua à espera dos respetivos governos para criar as melhores condições. “Temos escritórios em Madrid e em Gaia prontos a gastar dinheiro para contratar pessoas”, acrescentando que há um esquecimento generalizado que a indústria dos videojogos é mais lucrativa que a música e cinema juntos.
Veja na galeria imagens do MEO XL Games:
E por falar em cinema, Jose Maria Moreno diz que em Espanha há muitos incentivos para o audiovisual, existindo grande investimento de fora, mas não vê isso a acontecer no gaming. E por isso, nota que existe muito talento a sair para o Canadá.
Para o produtor italiano, observando também a situação no seu país, salienta que existe uma grande dificuldade em saber como falar com um publisher ou mesmo como montar o seu próprio negócio no Steam. E muitos ainda veem os videojogos como não sendo um emprego real, sendo vítimas de algum tipo de “bullying”.
Mas há um otimismo generalizado em todo o painel, acreditando que seja uma questão de tempo para as coisas começarem a andar. Sente-se que há mais respeito e abertura, muito devido aos números que a indústria já gera. Até aqui, as crianças que tinham o sonho desde pequenas em trabalhar nesta indústria, mas eram incentivadas a trabalhar num “emprego real”. Para os intervenientes, isso tem de mudar, começando pela universidade, na necessidade de se criarem cursos e acima de tudo, demonstrar a credibilidade da indústria.
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