Por Luís Ribeiro (*)

Nos últimos três anos, a IA deixou de ser apenas “buzzword” para se tornar matéria-prima do quotidiano de quem desenvolve software. Modelos de linguagem avançados (LLMs, GPTs) já não são demonstrações de laboratório: são ferramentas de produção com impacto real em prazos, qualidade e ambição. Mas há um ponto essencial que, por vezes, se perde no ruído: esta revolução não substitui o pensamento humano, amplifica-o. E essa amplificação só é virtuosa quando o humano assume o papel certo: o de líder responsável de uma equipa híbrida, onde os “colaboradores” de IA executam com velocidade e consistência e o humano governa com propósito, contexto e rigor.

A metáfora mais útil que encontrei para este momento é a de uma equipa. Os modelos mais recentes — LLMs e GPTs — devem ser encarados como assistentes diligentes: incansáveis, rápidos e profundamente literais. Dão o máximo quando lhes dizemos o quê, por quê, com que restrições e como medir o resultado. O utilizador, por sua vez, é o líder técnico deste coletivo digital: define objetivos, prioriza, impõe padrões, liga os pontos entre requisitos de negócio, arquiteturas e operações.

No entanto, importa sublinhar um facto que o entusiasmo não pode encobrir: é praticamente garantido que o output da IA não estará 100% correto. Não por malícia, mas por natureza. Modelos probabilísticos são inerentemente não-determinísticos, não dão garantias de respostas 100% corretas. Logo, a responsabilidade pela correção final é inalienavelmente humana. Isto exige duas disciplinas: (1) engenharia de instruções (saber pedir: o já muito conhecido prompt engineering), e (2) validação sistemática (saber verificar). Sem estas, o risco não é a IA “errar”; é nós errarmos ao delegar sem governar. O papel do humano é ser curador e árbitro: definir os critérios de aceitação, orientar o assistente com exemplos bons e maus, e recusar aquilo que não cumpre. É aqui que reside a diferença entre “brincar com a IA” e usar a IA em produção.

A IA aplicada a Cobol/Mainframe

A aplicação de inteligência artificial ao contexto de Cobol/Mainframe está a abrir novas possibilidades para modernizar sistemas críticos, automatizar processos repetitivos e acelerar a entrega de software. Estas soluções permitem aumentar a produtividade das equipas, reduzir o risco operacional e preservar o conhecimento especializado acumulado ao longo de décadas.

Nestas ferramentas, o humano é a peça fundamental que orienta, configura e valida. Desde o início, uma estratégia de aplicação de IA a esta área, deve integrar o princípio human-in-the-loop: toda a geração é auditável, as explicações são legíveis e criámos pontos de controlo para aceitação humana. Não é opcional, é um requisito de engenharia.

Desde o Knowledge Management à migração para novas arquiteturas/tecnologias, passando pelo suporte aos developers, as possibilidades de aplicação e melhoria (não só de produtividade, como também da qualidade de vida dos profissionais da área) são intermináveis.

Isto significa que vamos precisar de menos colaboradores na área de Cobol/Mainframe? Na minha opinião, muito pelo contrário. Vamos conseguir capacitar os nossos colaboradores de um “fato” que lhes dará “superpoderes” que os tornarão mais rápidos, mais produtivos, mais confiáveis e que os vai transformar em líderes de equipas híbridas de humanos e máquinas. Estas características são altamente valiosas para clientes de serviços de IT. Os sinais que estou a receber é que, paradoxalmente, iremos precisar de ainda mais pessoas na área de sistemas core pois, quem se adaptar a esta realidade irá ter que dar resposta a muitos mais pedidos dos seus clientes.

Conclusão: não é a IA que nos substitui, é a IA que nos amplia

O futuro do desenvolvimento de software será escrito por equipas híbridas: humanos que pensam, decidem e assumem responsabilidade; máquinas que sugerem e geram sem se cansar. A união certa não acontece por acaso, constrói-se: com processos, métricas, governação e uma cultura que honra a qualidade.

O próximo passo? Institucionalizar esta parceria. Porque o futuro do software não é humano ou máquina. É, inevitavelmente, o humano + máquina — e é no “mais” que está todo o valor.

(*) Chief Technology Officer na KLx