Hugo Santos Mendes falava ontem, em plenário, na apresentação da proposta da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE) que transpõe a diretiva que estabelece o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (CECE), o mesmo diploma que tinha sido apresentado há um ano, o qual foi criticado pelos vários partidos da oposição, que apontaram que este poderia ter sido melhorado. Recorde-se que a transposição da lei está atrasada e que Bruxelas já iniciou o processo de incumprimento no Tribunal da Justiça.
"A nossa relação com os grupos parlamentares, em particular com o grupo parlamentar do Partido Socialista, será de inteira disponibilidade para rever algumas questões, sobretudo nos direitos dos consumidores, que me parece ser a matéria mais sensível e que será alvo de mais intervenções", referiu o secretário de Estado das Infraestruturas.
O governante destacou "a questão bastante levantada" pela Comissão Nacional da Proteção de Dados (CNPD), nomeadamente no que respeita à Lei da Privacidade nas Comunicações Eletrónicas e à remuneração dos dados (previsão legal de mercantilização dos dados pessoais, como refere a CNPD no seu parecer).
"Estamos inteiramente disponíveis para rever essa disposição ou eventualmente eliminá-la", acrescentou Hugo Santos Mendes, salientando a "inteira abertura" do Governo "para negociar e para melhorar" a lei. Este diploma "veio como veio precisamente para ser melhorado", rematou.
Tendo em conta o atraso da transposição da diretiva, que "levou a que a Comissão Europeia tenha anunciado formalmente a remessa do processo de incumprimento ao Tribunal de Justiça da União Europeia, dando assim início a uma fase contenciosa, o que poderá culminar com a aplicação de sanções a Portugal, o Governo exorta [...] esta Assembleia, dispondo de todos os contributos já prestados no âmbito do grupo de trabalho das comunicações eletrónicas na legislatura anterior" que "possa fazer o seu trabalho de reflexão, debate e deliberação com a brevidade possível para que esta lei, robusta e equilibrada, possa ser aprovada o quanto antes", apelou o governante, no início.
A deputada do PSD Márcia Passos criticou a proposta de lei, salientando que passado um ano "o Governo parece que não aprendeu nada", porque o diploma "traz as mesmas fragilidades", apontando a privacidade das comunicações eletrónicas, a mercantilização dos dados que "contraria a Constituição da República Portuguesa".
Além disso, salientou, "não assegura os direitos dos consumidores", apesar "dos alertas" da DECO e da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), deixando-os "refém das fidelizações". A deputada social-democrata criticou também o facto da proposta de lei não considerar os contributos de várias entidades que foram ouvidas neste âmbito.
"São horas de trabalho feito nesta casa, contributos valiosos que o Governo não considerou", acrescentou a deputada, salientando que o PSD está disponível para trabalhar o diploma na especialidade", apontando que o executivo vai "evidenciando alguns sinais de poder absoluto".
Em resposta, o secretário de Estado recordou que o mesmo diploma foi apresentado ao parlamento há um ano, altura em que o PS não tinha maioria absoluta.
"O debate que aqui temos hoje é um bom exemplo das promessas falhadas dos vários processos de liberalização em vários setores importantes da economia portuguesa", começou por dizer Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda.
Apontou que o mercado das telecomunicações é repartido "por três empresas que fazem o que bem entendem, que enredam os clientes em pacotes que são impossíveis de comparar, que prendem esses clientes a programas de fidelização dos quais é impossível sair, que não garantem a cobertura de todo o território" e que excluem pessoas com deficiência e que não protegem os dados dos seus clientes.
Tudo isto "é fruto da maravilha do processo de liberalização que iria proteger os direitos dos consumidores", prosseguiu.
O Governo entregou "uma má proposta de lei à Assembleia da República no passado, a Assembleia da República fez o seu trabalho", continuou Mortágua, criticando o diploma.
"O Governo conhece as críticas da DECO, da Anacom e dos vários grupos parlamentares, teve tempo para melhorar a proposta de lei, não quis melhorar, entrega a proposta de lei à Assembleia da República com os mesmos problemas, dizendo" que quer que o parlamento "faça o seu trabalho, mas ao mesmo tempo diz: 'por favor despachem-se que a Comissão Europeia está à perna e vamos ser multados'", criticou.
"Senhor secretário de Estado, diga-nos o que é que pretende. Porque se havia pressa, fizesse o trabalho de casa e entregasse à Assembleia da República uma proposta que resolvesse os problemas, se afinal não há pressa, então estou certa que o grupo parlamentar do Partido Socialista vai acolher as propostas da Anacom e da DECO para mitigar os vários problemas que aqui foram encontrados", disse a deputada.
Em resposta, Hugo Santos Mendes afirmou: "Não há, do nosso ponto de vista, nenhuma incompatibilidade entre fazer um bom processo de especialidade e não arrastar excessivamente este processo".
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