A digitalização da economia e da sociedade é um propósito da União Europeia, mas com uma lógica que quer ser diferenciadora, com padrões que procuram o equilíbrio do desenvolvimento tecnológico e o respeito pelos princípios éticos e direitos humanos. É um “modelo europeu de fazer negócio” que se quer promover na Declaração de Lisboa - Democracia Digital com Propósito, uma iniciativa da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia que quer deixar marcas para o futuro.
A declaração foi apresentada esta manhã no evento “Leading the Digital Decade”, a Assembleia Digital, que decorreu em formato híbrido, e a ideia da democracia digital e do uso da tecnologia com um propósito humanista está bem marcada nas várias intervenções que apoiaram a iniciativa, onde também se promove a cooperação internacional e a economia baseada nas tecnologias verdes.
Roberto Viola, diretor geral da direção geral de redes, conteúdos e tecnologia da Comissão Europeia, lembrou que o objetivo da Europa é que a tecnologia esteja ao serviço das pessoas e possa trazer liberdade e a possibilidade de vivermos em paz e com mais qualidade de vida.
O secretário de Estado da Transição Digital, André de Aragão Azevedo, que tem vindo a desenvolver e promover este conceito, admite que o apoio à Declaração de Lisboa é um marco importante desta presidência e está ligado aos princípios estruturais que a União Europeia definiu para o futuro.
"O princípio é simples, temos de garantir que cada direito que é legalemnte protegido offline também é protegido online, mas vai mais longe e define esforços comuns em áreas específicas para reforçar o modelo de desenvolvimento social e económico que a Europa representa no contexto da economia digital", defendeu hoje o secretário de Estado durante a sua intervenção no evento de apresentação da declaração. Mas lembra ainda quea defesa da ética tem também benefícios económicos, já que promove a confiança e abre novos mercados.
O que é a Declaração de Lisboa - Democracia Digital com Propósito ?
O objetivo inicial era que fosse assinada uma carta dos direitos digitais, mas os princípios da Democracia Digital com Propósito acabaram por fazer parte do anexo da Declaração de Lisboa, que foi adotada por todos os Estados membros, embora alguns não apoiem este anexo.
O texto tem por base iniciativas anteriores, como as declarações de Tallin e Berlim, e pretende contribuir para a consulta pública que foi lançada pela Comissão Europeia e que pretende recolher opiniões sobre os princípios digitais.
Na base está a definição de três domínios principais, elencados da seguinte forma:
- Defender os direitos humanos, os valores éticos e a participação democrática no contexto da era digital, nomeadamente combatendo a discriminação, a desinformação e outras atividades online maliciosas, mas também afirmando a importância da conectividade acessível e da formação de competências digitais.
- Promoção de múltiplas partes interessadas e uma cooperação internacional mais ampla no contexto digital, em áreas como padrões, infraestrutura, fluxos de dados e serviços online seguros e confiáveis.
- Reconhecendo a importância das tecnologias verdes e digitais, como elemento-chave para um novo paradigma de crescimento econômico, equilibrando inovação e competitividade com desenvolvimento socioambiental sustentável.
No site da declaração de Lisboa são descritos os termos da Declaração de Lisboa e o anexo com 13 linhas para um quadro comum de princípios digitais:
- na identidade digital1.1.Todos devem poder ter uma identidade digital pessoal, gozar plenamente da cidadania no ambiente digital e usufruir de proteção jurídica contra qualquer forma de discriminação no ambiente online.1.2.Todos devem poder utilizar meios de identificação eletrónica convenientes, fiáveis e seguros e serviços fiáveis que possam ser utilizados para aceder a serviços em linha públicos e privados, incluindo transfronteiras, onde o utilizador possa exercer cada vez mais os seus direitos sobre os seus próprios dados.
- sobre privacidade, proteção de dados e cibersegurança
2.1. Todos devem ser capazes de usar a Internet de uma forma aberta, segura e protegida que proteja sua privacidade.
2.2. Todos devem ser capazes de manter o mais alto nível possível de confidencialidade de sua vida privada e das comunicações no ambiente digital.
2.3. Todos devem poder utilizar comunicações seguras e cifradas, nomeadamente para permitir o livre exercício dos seus direitos.2.4.Todos devem poder transferir os seus próprios dados pessoais de um prestador de serviços para outro gratuitamente, de acordo com a legislação aplicável. - no acesso, uso e neutralidade da internet
3.1.Todos devem poder ter acesso à Internet de forma não discriminatória.
3.2. Todos devem ser protegidos contra interrupções deliberadas de acesso à Internet, ou limitações à informação que pode ser trocada online, no respeito pelos princípios da neutralidade da rede. - sobre o uso de inteligência artificial
4.1. O projeto, o desenvolvimento, a implantação e o uso da inteligência artificial devem respeitar plenamente os direitos dos indivíduos e ser confiáveis.
4.2. Quando forem utilizados sistemas de inteligência artificial em áreas de alto risco, devem ser transparentes, devidamente documentados, sem efeitos discriminatórios, precedidos de avaliação de risco quando exigida por lei, sujeitos a adequado escrutínio humano e auditáveis pelos órgãos competentes, sem prejuízo do o cumprimento das regras de proteção de dados pessoais da UE, incluindo as relacionadas com a avaliação do impacto da proteção de dados e os direitos dos titulares dos dados no que diz respeito aos processos de tomada de decisão automatizados. - sobre a liberdade de expressão e informação
5.1. Todos devem ser capazes de expressar, compartilhar, receber e manter ideias livremente no ambiente digital, sem quaisquer limitações arbitrárias, censura ou intimidação, respeitando a lei e os direitos dos outros, em condições que facilitem a imprensa pluralista e livre e a alfabetização mediática.
5.2.Todos devem ser protegidos de quaisquer formas de discriminação e de crimes no meio digital.
5.3. Todos devem ter autonomia para fazer escolhas informadas sobre as informações a que estão expostos e devem ser protegidos de ataques intencionais ou coordenados que manipulam espaços online (incluindo aqueles conduzidos sem intervenção humana por meio de processos automatizados) para a disseminação de desinformação, criada para ganho econômico ou para enganar intencionalmente o público e com um efeito negativo real ou previsível para os processos democráticos, políticos e de formulação de políticas, bem como para a saúde do cidadão, o meio ambiente ou a segurança. - sobre a liberdade de participação e associação
6.1. Todos, incluindo grupos em situação de vulnerabilidade, devem ser capazes de participar da vida pública e de se associar e se encontrar com outras pessoas de forma pacífica e lícita no ambiente digital. - sobre a proteção da criança, cuidado e liberdade de expressão
7.1. As crianças devem ser protegidas e receber informações adequadas à idade para ajudá-las a se manterem seguras online, com base na implementação de segurança desde o projeto e por princípios padrão que levam em consideração suas necessidades específicas a fim de garantir seu bem-estar e segurança.
7.2. As crianças podem expressar suas opiniões livremente no ambiente digital. Essas opiniões devem ser levadas em consideração nos assuntos que lhes dizem respeito, de acordo com sua idade e maturidade. - na educação digital
8.1. Todos devem ser capazes de aceder à educação digital de qualidade e de melhorar suas próprias habilidades, competências e alfabetização digitais, em uma perspetiva de aprendizagem ao longo da vida, onde todas as condições necessárias, como infraestrutura, conectividade, equipamentos, conteúdos e práticas pedagógicas estejam presentes . - em plataformas digitais
9.1. Todos devem receber informações claras, simples e inequívocas sobre as regras de funcionamento das plataformas digitais, incluindo informações sobre eventuais alterações contratuais, devendo neste último caso poder rescindir o contrato nos termos da lei.
9.2. Todos devem ter seus direitos de consumidor protegidos no ambiente digital, incluindo serviços e mercados digitais, de acordo com a legislação de defesa do consumidor aplicável. - em serviços públicos digitais
10.1. Todos devem ter acesso a serviços digitais de fácil utilização que sigam procedimentos claros e transparentes e receber atendimento de acordo com suas necessidades e preferências.
10.2. Todos devem ser capazes de aceder a serviços públicos digitais centrados no ser humano, inclusivos e seguros, fornecidos por administrações públicas eficientes que, seguindo os Princípios Uma vez e o Digital por padrão, reutilizam dados e prestam serviços de forma proativa sempre que possível, reduzindo assim a carga administrativa em indivíduos e empresas.
10.3. A digitalização não deve restringir o direito de acesso aos serviços públicos por parte das pessoas que não possam utilizar os meios digitais.10.4. Todos devem poder aceder a serviços públicos digitais em outros países, seguindo os mesmos princípios na medida do possível, embora reconhecendo que podem ter que se registrar ativamente nos serviços para obter acesso. - sobre direitos de autor e outros direitos de propriedade intelectual
11.1. Os autores e outros titulares de direitos têm direito à proteção e à participação justa no uso de sua propriedade intelectual e ao acesso a recursos legais para defender seus direitos no ambiente digital.
11.2. Todos devem ter acesso a educação sobre direitos autorais e direitos de propriedade intelectual. - no legado digital
12.1. Todos devem ser capazes de decidir sobre seu próprio legado pessoal digital. - sobre o recurso eficaz e acesso à justiça
13.1. Todas as pessoas cujos direitos e liberdades garantidos por lei tenham sido violados no ambiente digital devem ter o direito de acesso a um recurso efetivo.
13.2. Todos devem poder apresentar, individual ou coletivamente, aos órgãos competentes ou a quaisquer autoridades independentes, petições, representações e denúncias, a fim de defender os seus direitos no meio digital, bem como o direito de serem informados, no âmbito de um prazo razoável, sobre o resultado da respetiva avaliação.
13.3. Para fazer justiça às vítimas e manter a segurança de nossa sociedade, deve haver um processo criminal eficaz. No cumprimento das suas responsabilidades legais, a aplicação da lei exige o acesso aos dados com base nos poderes conferidos por lei necessários numa sociedade democrática, de forma proporcional e respeitando os direitos fundamentais.
Há no site um convite a todos os que quiserem apoiar a subscrever a Declaração de Lisboa, o que pode ser feito por governos, empresas, organizações da sociedade civil ou pelos cidadãos.
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