Por Nuno Rosado (*)

A primeira página de internet foi publicada a 6 de agosto de 1991, marcando o início da web como a conhecemos hoje. A visão de base do fundador Tim Berners-Lee era a de criar um projeto descentralizado, sem necessidade de validações ou autorizações de uma autoridade central para publicar qualquer conteúdo, promovendo assim a liberdade de informação contra a censura indiscriminada e a vigilância.

Passados 32 anos e chegados à terceira geração de websites - Web3 -, aparentemente, estamo-nos a aproximar da visão do seu fundador: uma web descentralizada onde os dados são controlados e detidos pelo utilizador.

Nas gerações anteriores, os websites, frequentemente, detinham grande quantidade de informações pessoais sem rastreabilidade e, muitas vezes, sem permissão explícita dos utilizadores. Contrariamente, a Web3 utiliza tecnologias que facilitam a transparência, a rastreabilidade e um maior controlo dos dados pessoais. Outro ponto importante é a inclusão de todos na transição digital, isto porque é agora mais simples qualquer utilizador não ser apenas o “produto”, mas ser também o criador de websites e de software, tal é a facilidade de utilizar as novas ferramentas.

Embora a Web3 esteja muito associada ao advento das criptomoedas, que foi claramente o impulsionador desta geração de websites, na sua base está a tecnologia blockchain que veio revolucionar a forma como os dados são registados, armazenados, propagados e descentralizados de forma que a sua veracidade seja inquestionável.

O desafio que temos agora é conseguir alinhar estas políticas digitais de forma a aproveitar as inovações da Web3. Portugal, sob a égide do projeto INCoDe.2030, tem uma equipa dedicada a este tema com enfoque, neste momento, na educação, inclusão e inovação tecnológica e alinhada com o projeto europeu de Digitalização até 2030. Projeto este que pretende, em linhas gerais, dotar toda a população de competências digitais (pelo menos básicas), aumentar o número de especialistas em TIC, melhorar as infraestruturas e a velocidade de acesso à informação, a utilização generalizada nas empresas de ferramentas digitais de forma a atingir o denominado nível básico de intensidade digital - em Portugal, estamos neste momento com 50% das empresas neste nível – e, por fim, a completa digitalização de serviços públicos.

Pelos objetivos acima descritos, percebemos que existe uma vontade em alinhar estas tecnologias com o empoderamento do “cidadão digital” e não deixar ninguém para trás, garantindo assim que todos tenham controlo sobre os seus dados.

Com este passo vem também o enorme desafio da União Europeia (UE) em manter a integridade e a segurança do ecossistema digital. Esta visão não é nova na UE, o projeto eIDAS, já se encontra nas nossas carteiras físicas, como por exemplo o cartão de cidadão que já certifica de forma digital a nossa identidade em variadas situações ou permite a assinatura digital de documentos. O próximo passo é digitalizar não só o cartão de cidadão, como os restantes documentos, ou seja, uma carteira digital. Esta é a evolução que vamos presenciar ainda nesta década como europeus, a ligação dos conceitos eIDAS com a Web3, ou seja, um acesso único a todos os serviços e produtos e com controlo de informação partilhada.

Poderemos assim com a nossa “carteira digital” aceder a sites de redes sociais, empresas e serviços, optando por partilhar com estes sites apenas a informação estritamente necessária e que autorizamos e, muitas das vezes, por tempo limitado. Temos agora as ferramentas para revolucionar a internet e os serviços públicos, oferecendo novas formas de interação, de participação e de governação digital.

Aliamos assim a tecnologia de Web3, descentralizada, acessível a todos e com grande controlo de dados pessoais, à visão europeia de identificação digital. Mais do que uma evolução tecnológica, vemos este processo como uma mudança de paradigma relativamente à forma como utilizamos a internet e na nossa relação e valorização dos dados pessoais e da informação que criamos todos os dias.

(*) Co-founder & CEO da TechOf – Reskilling People