Por Filipa Fixe (*)
Os últimos dois anos de pandemia demonstraram a importância crucial da revolução digital e a centralidade em cada pessoa. Segundo o relatório da OCDE Digital Economy Outlook 2020, os países da OCDE estão a investir estrategicamente numa nova abordagem das políticas públicas para a transformação digital, nomeadamente uma estratégia nacional de IA.
Enfrentar os efeitos socioeconómicos da pandemia tornou-se uma prioridade política: Governos, universidades e empresas dos países da OCDE desenvolveram sistemas baseados em tecnologias emergentes para prever e monitorizar a propagação da doença.
Os gestores reagiram 20-25 vezes mais rápido e introduziram melhorias significativas de como mitigar redundâncias na cadeia de abastecimento, melhorar a segurança dos dados e aumentar a utilização de tecnologias avançadas nas operações.
No passado, foi preciso mais do que uma década para que as tecnologias revolucionárias contribuíssem para ganhos de produtividade. A pandemia acelerou em anos esta transição em áreas como IA, IoT e 5G.
As empresas estão 3x mais capacitadas para realizar, pelo menos, 80% das interações com o cliente de forma digital, de acordo com o estudo da McKinsey & Company, por Kevin Sneader e Shubham Singhal: “The next normal arrives: Trends that will define 2021—and beyond”. No entanto, tudo isto aconteceu sob intensa pressão. O próximo passo consiste agora em ultrapassar a reação à crise e tornar consistente o que foi bem feito.
Para as indústrias de consumo, e particularmente para o retalho, isso pode significar melhorar os modelos de negócio digital e omnicanal. Para a saúde, trata-se de estabelecer opções virtuais como opção e/ou norma e uma necessidade urgente de investir na construção de capacidades. A crise decorrente da COVID-19 criou um imperativo para as Instituições de saúde reverem as suas operações, assim como uma oportunidade de transformá-las, na medida em que, se o fizerem, haverá sociedades mais saudáveis, mais produtivas e consequentemente mais prósperas.
Como podemos beneficiar da onda digital que invade o nosso dia na gestão do bem-estar, da saúde e da doença? Os avanços na ciência e as tecnologias emergentes estão a fazer enormes progressos na eliminação, na prevenção e no tratamento personalizado de muitas doenças.
A telemedicina, a telemonitorização, os dispositivos médicos aptos para inteligência artificial, o 5G ou a Gamificação são apenas alguns exemplos da transformação digital na área de saúde e que estão a remodelar completamente a forma como interagimos com os profissionais de saúde.
O conceito de inovação é, sem dúvida, o ponto principal aqui, no qual o objetivo é o de agilizar o trabalho dos médicos, otimizar sistemas, melhorar os resultados em saúde para os doentes, reduzir o erro humano e diminuir os custos, através de experiências mistas, ou seja, físicas e presenciais. Por outro lado, através da incorporação da tecnologia é possível obtermos uma melhor gestão dos cuidados de saúde, assegurando o princípio da equidade, beneficiando todos os cidadãos, sem exceção e sem marginalizar os que se encontram a grandes distâncias dos grandes centros urbanos ou com maiores dificuldades económicas.
Telemedicina e Telemonitorização
A telemedicina é uma grande tendência, a qual pode, de facto, melhorar o acesso a cuidados de saúde por parte dos cidadãos localizados em geografias mais remotas e com menores condições de acessibilidade e de mobilidade. Este conceito tem vindo a traduzir-se na realização de consultas à distância (teleconsulta) e na monitorização remota de doentes (telemonitorização).
No contexto português e segundo o barómetro desenvolvido pela APAH, Glintt e ENSP em 2022, 84% das instituições têm pelo menos um projeto implementado na área da Telessaúde, sendo que a Teleconsulta é a área de Telessaúde mais utilizada (96%), seguida da Telemonitorização (63%) e do Telediagnóstico (39%). As plataformas informais são a solução mais utilizada para realização de teleconsultas (71,4%). Este é um ponto critico de atuação na área do digital e da consistência de protocolos e de dados que todos enquanto utentes desejamos. As tecnologias utilizadas devem ter por base uma arquitetura de referência que permita a continuidade e integração efetiva de dados e de cuidados.
Porém, e se antes já se tinha identificado que a maioria dos consumidores afirmavam que era conveniente ter acesso à saúde virtual, agora, mais do que nunca, faz todo o sentido o desenvolvimento e adoção de soluções digitais neste setor.
Inteligência Artificial
Segundo o estudo do EIT Health, em parceria com a McKinsey & Company, a inteligência Artificial pode revolucionar a assistência médica, através de melhores resultados neste acompanhamento, na experiência do paciente e no acesso a serviços de saúde, através da melhoria da produtividade e eficiência. Atualmente esta tecnologia, na área da saúde, é já aplicada nos processos de diagnóstico, no entanto, nos próximos 5 a 10 anos, os profissionais de saúde esperam que a tomada de decisões clínicas passe a ser a aplicação digital mais relevante.
Neste sentido, do ponto de vista da gestão hospitalar, a IA pode também auxiliar os gestores na tomada de decisão, através da análise de informação e do cruzamento de dados disponibilizados nos vários sistemas de informação. Poderão também ser desenvolvidas ferramentas baseadas em IA focadas na entrega de informação aos gestores hospitalares relativamente à implementação das estratégias mais eficazes, com base na análise dos episódios de urgência, conjugando com relatórios da atividade gripal dos anos homólogos, por exemplo. Tendo este conhecimento prévio, as respostas às situações de doenças virais, como a Covid-19 e a gripe, poderão ser previamente planeadas de forma eficiente e mais eficaz, permitindo antecipar a necessidade de alocação de determinado número de profissionais de saúde e camas, bem como prever o consumo de medicamentos.
A IA permite, de facto, o desenvolvimento de ferramentas inovadoras. Um exemplo disso são as assistentes virtuais de saúde, que podem ser os personal trainers do próprio doente. Podem também prestar informação e até ser uma companhia, no caso de doentes e, simultaneamente, desempenhar um importante papel no apoio a cuidados menos especializados.
A capacidade de diagnóstico através de IA poderá mudar o paradigma da prestação de cuidados de saúde, bem como capacitar cada profissional de saúde para tomar uma decisão mais informada e mais orientada para cada doente.
5G
O 5G abre horizontes inteiramente novos para os telecuidados, marcando o salto para uma nova era de hiperconectividade, permitindo a conexão e interação de biliões de pessoas e coisas enquanto promete desencadear o potencial de áreas da tecnologia como IA ou Extended Reality.
Perante este contexto, os profissionais altamente qualificados com competências únicas serão capazes de executar tarefas remotamente com facilidade. Cirurgias que salvam vidas ou consultas remotas com médicos altamente especializados também serão possíveis em áreas remotas ou rurais, pois serão apoiadas por uma transmissão de imagem rápida e confiável. Assim, o 5G conduzirá a um mundo hiperconectado, o que cria uma infinidade de novas oportunidades de negócio orientadas aos dados e à IoT. Cada vez mais soluções de IoT serão adaptadas às necessidades específicas da indústria, adicionando uma camada digital ao mundo analógico, monitorizando processos de negócio e criando serviços para um ecossistema em rede.
Caminhamos para um futuro mais sustentável no setor da saúde, no qual a tecnologia não irá substituir os médicos, mas, em contrapartida, será um braço extensível dos seus serviços. E, por isso, a incorporação de tecnologias neste setor será cada vez maior. A digitalização da saúde já não é o futuro, mas sim, o presente!
A exigência de cada pessoa, de cada doente, vai aumentar e irá conduzir ao aparecimento de soluções na saúde que serão digitais by design, as quais exigem maior compromisso de cada cidadão, mas também um tratamento mais personalizado e exponenciado pela capacidade de gerarem valor e conhecimento a partir de dados que recolhem. O futuro da saúde será at the point-of-care, ou seja, junto ao doente e no momento em que necessita de informação e apoio de profissionais de saúde para a melhor decisão.
A jornada na saúde deve ser definida por uma equipa multidisciplinar (e com vários saberes): doente, profissionais de saúde, engenharia e ciências sociais, impulsionados pela tecnologia certa no momento certo.
(*) Executive Board Member da Glintt
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