Este ano não era fácil “navegar” entre os pavilhões do Mobile World Congress (MWC). Depois de algumas edições menos concorridas em termos de visitantes, e com espaços mais vazios, como aconteceu no ano passado, a feira de Barcelona organizada pela GSMA voltou a números de visitantes ao nível de antes da pandemia de COVID-19, mesmo que isso ainda não aconteça em espaço exposição ocupado. O valor oficial para o MWC24, que decorreu entre os dias 26 e 29 de fevereiro, ultrapassa os 100 mil, acima das previsões anunciadas.

O interesse por novas soluções e gadgets, mas também a necessidade de retomar contactos presenciais, promovendo o “networking”, pode ter ajudado a promover os números. Mas, mesmo que a organização não o admita, este ano havia muito mais visitantes jovens do que é habitual, grande parte deles de universidades ou cursos de tecnologia. O MWC estava habitualmente mais reservado a profissionais da indústria de telecomunicações e tecnologia, sem a visita de consumidores que muitas vezes “inundam” estas feiras, como acontece por exemplo na IFA de Berlim, e essa distinção não aconteceu este ano.

No pavilhão 3, onde se concentraram as principais fabricantes de smartphones, era quase impossível circular nos corredores. As áreas do 4YFN, a feira de startups, estavam bastante concorridas, assim como os pavilhões 2 e 4, alguns dos que atraiam mais visitantes de entre os 8 da Fira Gran Via, que acolhe o MWC. Mas mais visitantes não foi equivalente a mais novidades, e não faltaram testemunhos de alguma desilusão de quem identificou poucas novidades, especialmente a nível de produtos.

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A Inteligência Artificial, mais concretamente a IA generativa, estava em todo o lado, das soluções para operadores aos equipamentos terminais, e a tecnologia dominou as atenções. Para Francisco Jerónimo, analista da IDC, os anúncios de IA nos telemóveis, PCs e soluções podem estar um pouco exagerados, até porque muitas das funcionalidades já existiam, mas a diferença é que tudo está agora “embrulhado” à volta da Inteligência Artificial.

“Ainda são os primeiros passos e vamos ver como a tecnologia evolui e como pode influenciar a nossa vida […] estamos a entrar numa jornada que se afasta do conceito de smartphone para um telefone inteligente”, explica.

Para o analista esta é uma mudança refrescante. “Em vez de discutirmos as especificações do ecrã, da câmara ou da bateria, o tema agora é como o hardware pode ajudar-nos a garantir funcionalidades que não temos atualmente”, defende.

Smartphones topo de gama com mais IA

Entre as novidades mais interessantes anunciadas no MWC, e que estão a chegar ao mercado, os novos topo de gama da Xiaomi, o Xiaomi 14 e 14 Ultra, e o Honor Magic6 Pro, dominaram as atenções. As duas marcas ocuparam um espaço que já foi da Samsung e da Huawei, com grandes lançamentos no dia anterior à feira, reservando tempo de antena para os seus novos topo de gama que têm cada vez mais inteligência artificial integrada nas funcionalidades. Um “batalhão” de novos wearables, de relógios a tablets, acompanha também os smartphones, e todos vão chegar às lojas nas próximas semanas.

Mais longe estão outros gadgets, como o carro elétrico da Xiaomi, o SU7, que era um dos focos de atenção. O stand da marca estava sempre cheio de visitantes que queriam ver o automóvel que foi revelado em dezembro e que ainda não tem data para chegar ao mercado. Em exposição no centro do stand, só podia ser visto e não tocado, e ninguém teve direito a entrar no carro.

Xiaomi SU7

O Xiaomi SU7 não era o único protótipo em exposição e logo ao lado a Lenovo estava a mostrar o Project Crystal, o portátil de ecrã transparente, e o smartphone flexível que se transforma em pulseira. Esses conseguimos experimentar e partilhámos já as nossas impressões e vídeos.

No pavilhão 6 a Tecno, uma marca da Transsion,  trouxe também ao MWC alguns conceitos, como o Phantom Ultimate, com um ecrã deslizante, mas ainda sem data para chegar ao mercado, ao contrário dos novos dobráveis que a empresa e a consola Pocket Go.

Dois conceitos que fogem aos modelos tradicionais de smartphones estão entre os mais interessantes que vimos no MWC, o AI Pin da Humane e o AI Phone da T-Mobile, que experimentámos. O primeiro dispensa totalmente o smartphone, e o segundo abandona o conceito de apps, respondendo de forma mais natural aos pedidos do utilizador e “acompanhando” o pensamento, com um interface mais natural.

Pouco, ou quase nada, naturais eram as interações com os vários robots que algumas empresas trouxeram ao MWC, com soluções para a área industrial ou de apoio aos visitantes. O CyberDog da Xiaomi voltou a mostrar a sua capacidade acrobática enquanto no stand da China Mobile vários robots jogavam Go com os visitantes, ou Xadrez chinês.

A robot humanoide Ameca da Engineered Arts, respondia a questões no stand da etisalat, uma operadora dos Emirados Árabes Unidos, mas a maior parte das perguntas não estavam relacionadas com as soluções da empresa. “As pessoas fazem perguntas sobre Barcelona, se a Ameca vai dominar o mundo ou se fala espanhol”, explicou ao SAPO TEK Carlo Sangilles, engenheiro da empresa.

A tecnologia de realidade aumentada e virtual não desapareceu mas foi substituída pelo conceito da IA em termos de interesse. Os óculos de realidade aumentada da TCL, os RayNeo X2, trazem agora assistentes inteligentes e embora não estejam no circuito comercial começaram a ser vendidos na Indiegogo. E a HTC era das poucas empresas a apostar em demonstrações de realidade virtual, com grupo de jogadores em longas filas para experimentar os óculos HTC Vive e lutar com zombies, ou ver o VIVERSE para tradução e assistente de voz com Inteligência Artificial.

HTC no MWC24

A Vodafone mostrou também um novo conceito de experiência de computação espacial com o HyperRealityHub+ para experiências imersivas de toda a família, ou nas empresas, que passa o processamento para uma “black box”, libertando peso dos óculos.

Curiosamente, ou talvez não, os Vision Pro da Apple estavam ausentes do MWC24, e nem faziam parte das experiências com que as empresas habitualmente tentam atrair visitantes à feira. A Apple não se mistura neste tipo de eventos e há muitos anos que não marca presença nas feiras, mas os únicos Vision Pro que vimos estavam a ser usados por participantes particulares, que passeavam pelo MWC com os óculos colocados e “apanhavam” elementos do ar, parecendo completamente alheados da realidade.

Prémios para redes portuguesas e espaço de negócios

O MWC é muito mais do que gadgets e no SAPO TEK acompanhámos alguns dos anúncios importantes, como a adesão da MEO à iniciativa da GSMA para APIs abertas, em parceria com a Microsoft, Ericsson e a AWS. A GSMA Open Gateway Services foi anunciada em 2023 e o número de parceiros está a crescer, com potencial para dinamizar o desenvolvimento de soluções para o 5G.

Foi também por causa do 5G que as redes móveis portuguesas foram destacadas, em prémios entregues pela MedUX. O Porto destaca-se com a melhor cobertura 5G, com 90% de registos da tecnologia. Em termos de velocidade foi Lisboa que ficou à frente, no download e upload de dados, ganhando pela maior consistência.

A qualidade de rede da NOS foi também mais uma vez distinguida pela Ookla que a classificou como "a rede mais rápida da Europa". No MWC 24 a operadora recebeu mais o prémio com os resultados do estudo que tinha sido divulgado em janeiro.

Esta foi também a maior participação de sempre de empresas portuguesas, que ganharam mais espaço no MWC.  A Aptoide, a Crossjoint Solutions, a TimWeTech e a WIT Software tinham stand próprio e o número foi impulsionado pela presença de 1o startups que tiveram oportunidade de expor no 4YFN, apoiadas pela Startup Portugal. Somam-se a estas outras 10 empresas que receberam apoio para ir a Barcelona.

Empresas portuguesas no MWC24

O balanço é muito positivo, como explicou António Dias Martins, Diretor Executivo da Startup Portugal, ao SAPO TEK. "Foram feitos centenas de contactos e reuniões com potenciais investidores, incubadoras e aceleradoras locais, parceiros e clientes. Todos reconheceram a elevada qualidade desta delegação com destaque para os investidores que avaliaram os pitches que as mesmas fizeram no palco “Pitching Point””.

Para o próximo ano está já pensada a possibilidade de repetir a iniciativa, aumentando até a comitiva de empresas portuguesas, colocando o MWC como "uma importante paragem do programa Business Abroad da Startup Portugal".

O SAPO TEK falou com algumas das startups e empresas que partilharam boas impressões de contactos com potenciais clientes, parceiros e investidores.   "Sentimos que a feira está novamente com muita gente e as reuniões que marcámos foram muito interessantes", adiantou Paulo Trezentos, CEO e fundador da Aptoide, que há 10 anos é uma presença habitual no MWC.

Também Diogo Madeira, da Huawei Portugal, admite que este ano "pareceu o regresso definitivo do MWC aos tempos áureos pré-pandemia". O domínio da IA também foi destacado. "Em termos de conteúdos, parece-me que estamos a aproximar-nos rapidamente de um mundo inteligente e cada vez mais conectado, com a proliferação da Inteligência Artificial a ser evidente um pouco por todos os pavilhões".

A Huawei voltou a ocupar praticamente todo o pavilhão 1, com soluções para a área de consumo, empresarial e operadores, mostrando a evolução para o 5.5G que vai ter uma utilização comerciala ainda em 2024. "Neste contexto, seria uma pena se Portugal passasse ao lado das mais recentes ondas de inovação tecnológica e se colocasse numa posição desfasada em relação aos seus pares europeus", nota.

A data do MWC para o próximo ano já está marcada para 3 a 6 de março de 2025 e contamos estar por lá! 

O SAPO TEK acompanhou todas as novidades do MWC 24, que decorreu entre os dias 26 e 29 de fevereiro, e pode seguir todas as notícias no nosso especial.