Os eurodeputados votaram hoje a proposta de regulamentação para criptoativos, que passou com 517 votos a favor e 38 contra, e 18 abstenções. A MiCA (Markets in Crypto Assets) é uma peça fundamental para a adoção de legislação na União Europeia e a aprovação é um passo importante para a aplicação de uma legislação que deverá entrar em vigor em 2024. Pode ainda ajudar a impulsionar o sector na Europa, já que é a primeira zona económica com regulamentação nesta área.
Numa votação separada foi ainda aprovada a regulação de transferências de fundos, que obriga os operadores de criptoativos a a identificarem os clientes para evitar esquemas de lavagem de dinheiro. Os eurodeputados votaram massivamente a favor deste pacote, com 529 votos favoráveis.
"Isto coloca a UE na vanguarda da economia sustentada por tokens com 10.000 criptoativos diferentes. Os consumidores serão protegidos contra a fraude e o setor, que foi afetada pela falência da [corretora de criptomoedas] FTX pode recuperar a confiança", defende Stefan Berger, eurodeputado responsável pelo Regulamento MiCA.
O texto já tinha sido provisoriamente acordado pelos negociadores do Parlamento e do Conselho em junho de 2022 e pretende garantir que as transferências de criptomoedas podem ser sempre rastreadas e as transações suspeitas bloqueadas. As mesmas regras que são aplicadas aos movimentos financeiros são agora aplicados às transferências de criptoativos. As informações sobre a origem do ativo e sobre o seu beneficiário terão que acompanhar a transação e ser armazenadas em ambos os lados da transferência, naquela que é também conhecida como a "regra de viagem".
O novo pacote legistaltivo abrange transações superiores a 1.000 euros provenientes das carteiras privadas quando quando interagem com carteiras geridas por entidades prestadoras de serviços de criptoativos. As regras não se aplicam às transferências entre pessoas realizadas sem um prestador ou entre prestadores que atuem em seu nome.
"Atualmente, os fluxos ilícitos de criptoativos são movimentados rapidamente por todo o mundo, com grande probabilidade de nunca serem detetados. A reestruturação do regulamento sobre a transferência de fundos vai obrigar os prestadores de serviços de criptoativos a detetar e a pôr termo aos fluxos de criptomoedas criminosas, e também a assegurar que todas as categorias de empresas de criptomoedas estão sujeitas ao conjunto de obrigações relativas à luta contra o branqueamento de capitais", explica Ernest Urtasun, correlator da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários sobre as transferências de criptoativos.
Para o eurodeputado, esta aprovação "vem colmatar uma grande lacuna no nosso quadro de luta contra o branqueamento de capitais e aplicar na UE a legislação mais ambiciosa do mundo em matéria de 'regras de viagem', em plena conformidade com as normas internacionais".
A aprovação da MiCA tem também savaguardas para esquemas de manipulação de mercado e criminalidade financeira. As regras são aplicadas a quem emite e negoceia criptomoedas e outros ativos digitais, exigindo transparência, divulgação e supervisão das transações. O novo quadro jurídico vai ainda ter em conta a integridade do mercado e a estabilidade financeira, regulando as ofertas públicas de criptoativos.
Para combater os riscos de branqueamento de capitais, a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) deverá criar um registo público para os prestadores de serviços de criptoativos que não cumprem as regras na União Europeia e atuam sem a autorização devida.
Clarificação é bem vinda, mas há dúvidas sobre a implementação
Ao SAPO TEK, Hugo Volz Oliveira, secretário e membro fundador do Instituto New Economy, admite que este é um passo que pode trazer maior clareza para o enquadramento da blockchain na Europa. “Apesar de não ser uma regulação perfeita, o regulamento dos Mercados de Criptoactivos tem sido bem recebido pela indústria europeia e reconhecido internacionalmente como um enquadramento pioneiro e que pode ajudar a consolidar a cripto economia na Europa, ajudando a que o velho continente lidere os próximos passos na transformação digital trazida pela blockchain e no desenvolvimento da nova geração da internet - já que claramente não aproveitou a era dot com", explica.
Embora reconhecendo que uma lei não tem a capacidade de, por si só, desenvolver o ecossistema, Hugo Volz Oliveira diz que "este é um bom primeiro passo nesse caminho e sem dúvida que contribuirá para tornar mais segura a participação dos cidadãos europeus na cripto economia, já que - como Lídia Pereira também notou - apesar “dos escândalos que aconteceram não pudessem ter sido evitados pelo MiCA, teriam pelo menos sido mitigados" - já que este regulamento obriga os CASPs (as bolsas e plataformas de custódia) a segregar fundos dos clientes e a obedecer a outros requisitos bem construídos se quiserem servir o mercado comum da UE"
Há porém dúvidas sobre os próximos passos da regulação, que são partilhados pelo secretário e membro fundador do Instituto New Economy. "Por um lado, quanto ao trabalho que a EBA e ESMA, duas autoridades supervisores da indústria financeira, irão desenvolver standards para implementar a MiCA ao longo dos próximos 12 a 18 meses. Por outro lado, quanto às pressões do Banco Central Europeu para que a Comissão Europeia desenhe uma nova versão do MiCA, que aperte o cerco à indústria de um modo que - por agora - parece ser altamente restritivo e parecido com o ataque que está a ocorrer nos Estados Unidos", descreve.
"Felizmente, o MiCA (e a TFR) serviu para unir a indústria dos cripto activos na Europa, colocando as várias associações nacionais em diálogo próximo. Pelo que acreditamos que seremos capazes de resistir às pressões dos incumbentes e garantir que a Europa continua a beneficiar das inovações trazidas por esta tecnologia emergente", sublinha.
Nota da Redação: A notícia foi atualizada com mais informação e comentários. Última atualização 17h46
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