A multinacional Henkel é uma empresa alemã fundada em 1876 que construiu uma história de sucesso assente em diferentes áreas de negócio. Com mais de 53 mil empregados espalhados por mais de 80 países, 85% dos quais fora da Alemanha, é atualmente líder de três unidades de negócio: os adesivos, que representam 47% do negócio, com vendas na casa dos 9.387 milhões de euros; produtos de beleza, que incluem coloração de cabelo, tratamento de pele e higiene oral, com 19% de negócio e um valor de 3.868 milhões de euros; e os detergentes domésticos e da roupa, responsáveis por 33% das vendas, gerando receitas de 6.651 milhões de euros.
Apesar de albergar quase 6.000 trabalhadores na sua sede em Dusseldorf, e ser uma multinacional de grandes proporções, a Henkel ainda continua a ser uma empresa familiar, detendo 50% das suas ações.
E até pode nunca ter ouvido falar da Henkel, mas quase de certeza que já experimentou alguns dos seus produtos mais conhecidos. A empresa alega ter inventado o primeiro detergente do mundo, o Persil, expandindo-se depois para a cosmética, onde refere igualmente ter contribuído para o primeiro shampoo (através da aquisição de uma outra empresa alemã). Apesar do seu principal negócio em Portugal serem os detergentes, também já deve ter utilizado as suas colas e vedantes Pattex, por exemplo.
O negócio dos adesivos é o mais forte da empresa tanto pela sua presença na área do consumo, como na indústria. A Henkel desafia as pessoas a olharem para qualquer objeto banal e pensar que, algures, tem cola, possivelmente com um toque da empresa: computadores, telemóveis, automóveis, aviões, tudo utiliza colas e adesivos. Um carro normal gasta em média 20 quilos de cola, o que dá que pensar. Nos automóveis, os adesivos são capazes de absorver a energia quando há acidentes, amortecendo e repartindo o impacto pelas unidades metálicas.
A Henkel assume que mantém o espírito empreendedor de startup com que foi fundada há 140 anos, e dessa forma continua a investir com 3% das vendas na investigação e desenvolvimento. O SAPO TEK foi convidado pela empresa para testemunhar a sua nova estratégia corporativa, a ser implementada até 2020, em torno das suas principais áreas de negócio, mas procurando expandir para outros segmentos.
Bastou observar a área do quartel-general da empresa em Dusseldorf para perceber o investimento feito ao longo das décadas, e sobretudo nos últimos anos. A Henkel é alimentada por uma central energética totalmente autónoma e independente da cidade, com uma taxa de eficiência de 85% (o normal ronda entre 40 a 50%), tendo-lhe valendo reconhecimento na sustentabilidade. A área do enorme campus tem 1.5 quilómetros quadrados com uma linha ferroviária interna com ligação ao exterior. As suas fábricas e armazéns, e até empresas independentes alojadas no seu interior estendem-se por uma área que necessita de 45 minutos para percorrer a pé de norte a sul, segundo as informações do guia da nossa visita de autocarro.
A empresa construiu um gigantesco armazém geral e nos últimos anos investiu 37 milhões de euros para automatizá-lo, resultando em drones e empilhadoras autónomas. Estão espalhados pelo campus 24 estações de carga para alimentar os veículos elétricos que circulam. Ainda que a descrição crie uma ideia de uma gigantesca fábrica, repleta de chaminés a espalhar fumo no céu, o cenário é exatamente o contrário, com as áreas repletas de zonas verdes, áreas de lazer, lojas, escritórios e até o primeiro edifício da empresa que foi transformado num museu. Todos os restantes edifícios que visitámos eram modernos, e no seu interior repleto de ideias tecnológicas que motivaram a presença de cerca de 50 jornalistas de mais de 30 países do mundo.
A Henkel abraça a aceleração digital
Apesar da longa contextualização da empresa, não foram os mecanismos ou as inovações presentes nas suas instalações que motivou o convite da Henkel, mas sim, como a aceleração digital poderá contribuir para o próximo passo de evolução dos seus negócios.
A primeira visita foi ao centro de beleza e tratamento estético Lighthouse da Henkel. Neste espaço, a empresa demonstrou a sua visão para os cabeleireiros do “futuro”, encontrando um ecossistema entre os dispositivos sempre ligados online à gama de produtos disponíveis. Neste caso, a coloração dos cabelos será abraçada pela digitalização, tendo sido criada uma tecnologia que permite antecipar o resultado de uma mudança de “look” no penteado. A ideia é utilizar o sistema alimentado por machine learning para identificar quais os produtos ou serviços são os melhores para o cabelo dos clientes.
A empresa está a construir uma base de dados para todas as colorações possíveis, analisando os cabelos das pessoas à volta do mundo, pois tal como nos foi explicado, a estrutura capilar é distinta, tendo em conta fatores como a temperatura típica da região. Quando uma pessoa decide mudar a cor, os dados recolhidos pela inteligência artificial do cabelo natural são cruzados com os diversos tipos de coloração, criando um algoritmo com uma projeção em tempo real do resultado. A leitura é feita por um dispositivo, que analisa o cabelo ao nível molecular, desde a sua raiz às suas pontas. Tal como o SAPO TEK testemunhou, o protótipo presente na demonstração tinha um led colorido que mudava para o tom do cabelo digitalizado. O dispositivo ficará apenas disponível para profissionais ligados ao negócio dos cabeleireiros e funcionará através de uma aplicação de smartphone.
Como explicou a Henkel, o sistema vai facilitar os clientes a encontrar as tintas de cabelo apropriados para si, entre as centenas de variações de produtos disponíveis, além de fornecer informações adicionais na app e embalagens dos químicos. No futuro as pessoas poderão tirar uma fotografia ao seu cabelo, que será lido pela aplicação, que devolve a informação do produto a aplicar. A empresa refere que a aplicação já apresenta resultados positivos na casa dos 98%, conseguindo ainda identificar se o cabelo está danificado ou se a sua cor não é natural.
Aposta na impressão 3D
As impressoras 3D são uma nova área de investimento da empresa, não nos aparelhos, que ficarão a cargo de parceiros, como a HP e a Carbon, mas ao nível dos materiais utilizados nos projetos. A empresa, que já há 30 anos criava acrílicos para as primeiras soluções, considera que existe uma oportunidade de introduzir novos materiais baseados em silicone e resinas de poliuretano, com diferentes cores e resistências, por exemplo. A Henkel referiu que muitas das soluções atuais de impressão falham nos acabamentos, pois é preciso aplicar camadas de polimento ou tratamentos para resistir a altas temperaturas, ao fogo, a químicos e outras condições específicas.
A empresa acredita que através de elementos da indústria 4.0 e IoT é possível utilizar as informações digitais em produtos físicos, impressos em 3D. Dando o exemplo de como hoje em dia os sapatos não são caracterizados, que apenas existem variações de tamanho, mas através das impressoras 3D, as pessoas podem entrar numa loja e personalizar o seu modelo através de materiais impressos.
Outro exemplo de como a impressão 3D pode influenciar a indústria é numa linha de enchimento de garrafas de uma fábrica. Os suportes e a estrutura estão construídos para as garrafas de um certo tamanho ou formato. Se houver uma campanha de marketing que seja necessário mudar o aspeto da garrafa, será necessário muito tempo e dinheiro para criar a maquinaria em torno da produção. Com a impressão 3D, fazem-se os ajustes no software, aplica-se a impressão e no dia seguinte está novamente a produzir, com custos reduzidos na mudança, explica a Henkel.
Além dos materiais, a empresa quer investir no software de impressão, criando soluções para ajudar os engenheiros a criarem as peças mais facilmente. A Henkel esteve a sondar o mercado durante dois anos, procurando perceber onde deveria atuar, falando com os clientes. Aliás, uma das estratégias da empresa em todos os negócios está na sua capacidade de ouvir as pessoas com quem trabalha, clientes, fornecedores e parceiros, criando extensas bases de dados com dados Big Data.
A área dos automóveis é onde vai também procurar ganhar mercado, sobretudo a desenvolver soluções para os suportes das baterias. Os carros do “futuro”, os veículos autónomos, vão ter dezenas de computadores e centenas de radares e sensores óticos. Segundo a empresa isso vai gerar qualquer coisa como seis quilómetros de cabos para interligar os dispositivos. Ao encontrar soluções de materiais para tornar a construção mais leve, os veículos terão uma maior autonomia. Para já a empresa refere que a fibra de carbono, utilizada na impressão 3D, é a melhor solução. Por outro lado, é necessário encontrar formas de arrefecer os veículos, utilizando materiais de condução térmica. Para as baterias pretende vender os condutores e materiais avançados de selagem de forma a otimizar a sua autonomia. No pensamento da empresa está o custo de 7 euros de materiais de selagem e adesivos, mas um carro elétrico e autónomo chegam aos 107 euros por unidade, e é uma oportunidade em que quer apostar.
O futuro do laboratório digital e Indústria 4.0
A Henkel quer utilizar a Big Data dos quase 20 anos que detém de informação armazenada pelo departamento de pesquisa e desenvolvimento para acelerar a produção, sem cometer erros do passado. Além dos sistemas de crowdsourcing que conduz, para reunir a informação dos clientes, procura automatizar diversos processos e mecanismos que eram feitas por pessoas através do seu laboratório digital. A ideia é tirar as tarefas básicas das mãos dos cientistas, deixando-os trabalhar naquilo para que foram formados.
Ao receber informações de 130 fábricas, de mais de 70 mil produtos que disponibiliza no seu catálogo e com 130 mil clientes, e 11 milhões de consumidores, estas são reunidas em pacotes de Big Data que são analisados. A empresa refere que diariamente são recolhidos mais de 500 milhões de informações, desde os materiais, máquinas, processos, logísticas, planeamento e clientes, e como tal, tudo é registado para que, segundo foi explicado “se consiga obter informações de qualidade do produto, antes mesmo deste ser construído”. No passado, quando se fazia algo bem, o processo era repetido ao infinito, mas a empresa considera que fatores como a humidade, temperatura e a qualidade das matérias-primas é variável, por isso é necessário utilizar inteligência artificial para entender as condições de fabrico para obter os melhores produtos.
Uma das tecnologias que está a utilizar nas suas fábricas inteligentes é o planeamento virtual. Seja para modificar a disposição da maquinaria ou construir uma fábrica de raiz, ou mesmo simular a forma como as pessoas trabalham, é utilizada realidade virtual, com um sistema denominado por Powerwall. A área da fábrica e as maquinarias são replicadas em detalhe para a aplicação de realidade virtual, que o SAPO TEK teve oportunidade de experimentar, e rapidamente considerar se é possível substituir um motor de uma máquina dentro do espaço onde está inserido, por exemplo. Poupa-se tempo e dinheiro a projetar e a pensar estes detalhes, refere a empresa.
Apesar destas soluções estarem disponíveis sobretudo para consumo interno, a Henkel pretende vender os serviços de análises e a sua experiência com Big Data, para resolver os espaços de empresas e fábricas.
Segundo Michael Merget, líder de operações, esta solução de realidade virtual permite ainda à sua equipa estar em todo o mundo, sem na verdade lá estar. É preciso informações ou esclarecimento de dúvidas técnicas num ponto do mundo? Basta ligar o sistema de realidade virtual e interagir com os colaboradores que estão no local de forma remota. “Imagine a construção de uma nova fábrica no México. Apenas necessitamos da mão-de-obra que esteja no local para a construir, porque se for necessário a ajuda de um técnico de hidráulica, intervimos remotamente”, explicou o responsável.
Durante a nossa "passagem" pela Henkel, visitámos o Centro de Experiência Global da empresa. Trata-se de um espaço físico onde são feitas apresentações de produtos e novidades aos seus clientes e parceiros. Aqui até se ensina a forma como devem atuar os agentes de marketing, desde a utilização dos produtos, ou como agir nos diferentes países onde a empresa tem negócios.
Na Experience Room é disponibilizada uma sala de cinema com um ecrã de 180 graus onde passam os novos produtos e produções de marketing em ambiente cinematográfico. A experiência é envolvente, recorrendo a truques inteligentes, tais como libertar no ar o cheiro das fragâncias dos produtos que estão a passar no ecrã. No nosso caso, sentimos o cheiro de um novo detergente para limpar sanitas.
As inovações apresentadas são apenas o início da transformação digital que a Henkel está a viver. Até 2020 todos os processos e produtos vão estar disponíveis, preparando a empresa centenária para o futuro onde cada vez mais se ouve falar de machine learning, inteligência artificial, Big Data ou Internet das Coisas. E por falar em IoT, foi também apresentado o primeiro difusor repelente de mosquitos inteligente, que atua mediante as condições meteorológicas ou durante as "épocas altas" de insetos…
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