O nascimento da World Wide Web fez correr muita tinta, entre manifestações efusivas acerca do potencial da tecnologia, visões mais moderadas e críticas, mas também muitas previsões acerca do seu futuro.
É verdade que ainda não existem bolas de cristal ou outros artifícios mágicos que permitam prever o futuro com exatidão, mas algumas previsões acabaram mesmo por não vingar. Aliás, como relembrou recentemente Tim Berners-Lee, quando a World Wide Web surgiu, muitos acreditavam que seria apenas uma moda.
Na data em que se assinala o Dia das Telecomunicações e da Sociedade da Informação, aproveitamos para fazer uma viagem no tempo e recordar algumas das previsões falhadas sobre a Internet.
Clique nas imagens para ver algumas das previsões falhadas sobre a Internet
Em fevereiro de 1995, um artigo de opinião publicado na revista norte-americana Newsweek, assinado pelo astrónomo, autor e professor Clifford Stoll, chamou a atenção com o cabeçalho “A Internet? Bah!” (numa tradução para português), frisando os motivos pelos quais considerava que nunca seria possível atingir um estado de “nirvana” através do ciberespaço.
Apesar da sua experiência com a tecnologia que esteve na base da Internet, Clifford Stoll admitia sentir desconforto em relação ao futuro que os visionários da época preconizavam: do trabalho remoto às bibliotecas interativas e salas de aula multimédia, passando pelas comunidades virtuais, negócios e comércio online e até pela possibilidade de a liberdade das redes digitais tornar os governos mais democráticos. Para o autor, tudo não passava de “tretas”.
“A verdade é que nenhuma base de dados online vai substituir os jornais diários, nenhum CD-ROM vai tomar o lugar de um professor competente e nenhuma rede de computadores vai mudar a forma como o governo funciona”.
Muitos anos mais tarde após a sua publicação, a peça passou a constar de múltiplas listas online de previsões falhadas sobre a Internet. Em 2017, a propósito do 28º aniversário da World Wide Web, a Newsweek publicou uma versão “corrigida” do artigo.
No entanto há ainda quem defenda que uma leitura mais aprofundada permite ver que alguns das questões mencionadas por Clifford Stoll acabaram por se tornar desafios com os quais lidamos atualmente, sobretudo, no que toca à desinformação, ou até no impacto da Internet na forma como nos relacionamos socialmente.
Uma “morte” catastrófica?
Também em 1995, num artigo de opinião publicado na revista InfoWorld, Robert Metcalfe, co-inventor da Ethernet, deu a conhecer que acreditava que a Internet iria explodir tal como uma supernova e depois colapsar de forma catastrófica em 1996, deixando para trás um rasto de websites “fantasma”.
Curiosamente, Robert Metcalfe prometeu comer as suas palavras caso a sua previsão não se concretizasse, numa promessa feita nesse mesmo ano, na quarta edição da World Wide Web Conference.
O que é certo é que em abril de 1997, durante uma edição da World Wide Web Conference, o autor cumpriu à letra o que prometeu, não sem antes passar uma cópia impressa do seu artigo por uma liquidificadora, como reconta um artigo da InfoWorld.
Mas Robert Metcalfe não foi o único a dar um prazo de validade curto ao mundo online. Em 1998, o economista Paul Krugman, que foi laureado com o prémio Nobel da Economia em 2008, previa num artigo na revista Red Herring que o crescimento da Internet iria desacelerar drasticamente.
O motivo? Tal aconteceria “à medida que a falha na Lei de Metcalfe, que indica que o número de potenciais ligações numa rede é proporcional ao quadrado do número de participantes, se torna aparente: a maioria das pessoas não tem nada para dizer às outras”.
“Por volta de 2005 ficará claro que o impacto da Internet na economia não terá sido maior do que o da máquina de fax”.
Em janeiro de 1997, numa edição da revista Popular Mechanics, Brian C.Fenton, editor da secção de eletrónica, alertava para a possibilidade da Internet sucumbir ao “peso” do seu sucesso, ficando tão lenta que acabaria por se tornar inútil.
Nas palavras do autor, recordadas num artigo mais recente, onde a revista aponta várias das suas previsões tecnológicas que não se concretizaram, tendo em conta a procura, com um número de utilizadores que estava a crescer a um ritmo anual de 200%, o facto de a Internet não ter colapsado era “impressionante”.
Nem a Microsoft se "escapou"
No final dos anos 90, até mesmo Bill Gates, que co-fundou e durante anos dirigiu a Microsoft, mostrava algumas incertezas quanto à Internet. Num artigo de 1997, o jornal The New York Times, apontava o responsável da gigante tecnológica como um dos “céticos” da época.
Segundo o artigo, no livro “The Road Ahead”, publicado em 1995, Bill Gates detalhava que a tecnologia para as “killer apps”, isto é, aplicações não era a mais adequada para atrair os consumidores para a Internet. Mais tarde, a obra foi revista, passando a incluir um capítulo sobre a Internet.
Já em 2020, por ocasião do 25º aniversário do lançamento do livro, Bill Gates aproveitou para rever as suas previsões com novos olhos. “Fui muito otimista em relação a algumas coisas, mas outras aconteceram mais depressa ou mais dramaticamente do que eu imaginava”, admitiu numa publicação no seu blog.
Esta não foi a única previsão falhada do antigo responsável da Microsoft. Alegadamente, Bill Gates terá dito, num evento da feira de tecnologia Comdex em 1994, que não via grande potencial para a Internet para os próximos 10 anos. Já em 2004, durante a edição desse ano do Fórum Económico Mundial em Davos, onde garantiu que o problema do spam seria resolvido em dois anos.
A verdade é que, hoje, o spam continua a ser um problema, tendo assumido contornos ainda mais preocupantes, com o crescimento do phishing e outros esquemas fraudulentos, indo muito além das caixas de correio eletrónico.
O sucesso do motor de busca da Google foi um dos aspectos subvalorizados pelo responsável durante o seu discurso em Davos. Mas Bill Gates não seria o único responsável da Microsoft a partilhar uma opinião semelhante sobre a empresa que, mais tarde, se tornaria numa gigante tecnológica.
Quatro anos depois, numa entrevista ao Financial Times, Steve Ballmer, antigo presidente executivo da Microsoft, não previa o melhor futuro para a Google. “Eles têm apenas um produto”, afirmou, referindo-se ao motor de busca da tecnológica. “Eles têm o Gmail agora, mas têm um produto que lhes traz todo o dinheiro e ele não mudou em cinco anos”.
Voltando aos anos 90, se alguma vez teve curiosidade em descobrir que previsões de futuro marcavam o panorama das comunicações e dos "primórdios" da Internet no início da década, a Universidade de Elon tem uma "cápsula do tempo" com mais de 4.200 citações de mais de 1.000 personalidades da época.
Nota de redação: A notícia foi atualizada com mais informação. (Última atualização: 14h58)
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