A DECO já tinha revelado a intenção de avançar com um processo judicial no âmbito do escândalo da Cambridge Analytica e o SAPO TEK tem vindo a questionar a associação portuguesa de defesa do consumidor sobre o estado deste processo. Hoje a DECO confirma que a ação judicial já avançou em tribunal.
Logo que se soube da manipulação e utilização massiva de dados dos utilizadores por parte da Cambridge Analytica, a DECO e as associações similares da Bélgica, Espanha e Itália estabeleceram uma conversa direta com o Facebook privilegiando o diálogo, reunindo em abril deste ano com o gigante americano. “Mark Zuckerberg prometeu na altura a estas associações de consumidores, avaliar uma possível compensação dos utilizadores cujos dados tenham sido abusivamente utilizados”, lembra a associação, mas até à data não há qualquer proposta, pelo que a DECO avança para tribunal à semelhança das associações de consumidores europeias, OCU, Test Achats e Altroconsumo.
Recorde-se que o CEO do Facebook admitiu por várias vezes a culpa da empresa. "Não tivemos uma visão ampla da nossa responsabilidade, e isso foi um grande erro", admitiu Mark Zuckerberg em vários depoimentos, defendendo que "o Facebook é uma empresa idealística e optimista. Na maior parte da nossa existência focámo-nos nas vantagens que a ligação entre as pessoas pode trazer".
Para calcular o valor a que cada utilizador terá direito, a DECO estabeleceu um montante mínimo de compensação de 200 euros por consumidor e por cada ano de registo na rede social. Como o Facebook está disponível em Portugal desde 2008, um consumidor com registo desde essa data pode obter uma compensação até 2 mil euros. O valor foi calculado recorrendo aos direitos consagrados pela Lei e a vários instrumentos, estudos e relatórios que permitem perceber o valor dos dados e dos perfis de cada indivíduo.
Segundo a associação, para terem acesso à compensação através da mediação da DECO, quando houver uma decisão judicial ou um acordo, os consumidores têm de se inscrever usando o formulário disponível no site da associação. Para isso têm de se registar, mas não é obrigatório ser associado da DECO.
Até á data já estão inscritos mais de 16 mil consumidores que terão o processo simplificado se existir compensação, ao passo que todos os outros podem ter de recorrer ao Ministério da Justiça para verem os seus créditos reconhecidos.
Manipulação de dados influência de eleições
O escândalo rebento em março deste ano quando começaram a ser reveladas as suspeitas de que a Cambridge Analytica, uma empresa especializada em perfis psicológicos, teria tido acesso a dados de milhões de utilizadores do Facebook, utilizando esta informação para influenciar o comportamento eleitoral nas eleições dos Estados Unidos.
Tudo terá começado com o acesso a dados através de uma app "Esta é sua vida digital", onde para participar os utilizadores tinham de fazer login com os dados do Facebook. Na altura participaram 270 mil pessoas, sobre as quais foram recolhidas informação de perfil, chegando também aos dados dos seus amigos na rede social. Ao todo a Cambridge Analytica terá conseguido acesso a informação de 87 milhões de utilizadores, com dados de localização, lista de amigos, gostos e partilhas. Em Portugal terão sido afetadas cerca de 63 mil pessoas.
Estes dados foram utilizados para criar um programa informático de propaganda destinado a influenciar os resultados de referendos e eleições, nomeadamente a campanha de Donald Trump para as presidenciais dos Estados Unidos, mas também o referendo do Brexit, onde foi decidida a saída do Reino Unido da União Europeia.
Mas é possível que não tenha ficado por aqui, já que o modelo de utilização de dados de perfil pode ter sido usado para muitas outras finalidades.
Depois de ser conhecido o esquema, o Facebook baniu as apps ligadas à Cambridge Analytica e iniciou um processo de investigação e limpeza que resultou numa primeira fase no bloqueio de 200 aplicações, mas que depois se estendeu a 400 ao fim de cinco meses de análise.
Inquéritos no Senado norte americano e no parlamento britânico, questões da Comissão Europeia e multas são algumas das consequências deste escândalo para o Facebook, assim como a perda de confiança dos utilizadores, mas os danos poderão não ficar por aqui e as ações judiciais para obter compensações poderão ser mais um revés para Mark Zuckerberg.
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