Na verdade os asteroides são como pequenos planetas que povoam o sistema solar, muitos deles resultando de explosões de planetas de maior dimensão, e ainda têm muito para contar sobre a formação do universo. As missões para descobrir mais dados sobre estes corpos celestes, que têm órbitas mais ou menos regulares no sistema solar, têm trazido mais informação e proporcionado encontros mediáticos, como que aconteceu com o Bennu ou o Ryugu, mas uma das grandes preocupações é a possibilidade de existir uma rota de colisão que ponha em risco a vida na Terra.

Hoje assinala-se o Dia dos Asteroides, ou Asteroid Day, uma data que se assume como uma chamada de atenção para uma hipotética ameaça à Humanidade como a conhecemos. A ESA organiza uma maratona de debates que vai decorrer online, mas este é um tema que preocupa a comunidade científica, e não se trata de ficção.

Não faltam filmes sobre histórias em que um asteroide se torna o objeto de destruição da vida na Terra, um cenário que é real, como a história já mostrou. E nem é preciso recuar ao tempo dos dinossauros.

Apesar dos sistemas de monitorização que têm sido construídos, mapear todos os rochedos espaciais que podem estar numa rota que tenha a Terra como alvo é uma tarefa complicada e, por vezes, mesmo impossível. A 16 de agosto de 2020, um asteroide com uma dimensão semelhante à de um Tesla Model 3 passou a 2.950 quilómetros do nosso planeta e os cientistas só se deram conta depois do sucedido.

O asteroide que agora toma o nome 2020 QG só conseguiu ser detetado pelo Observatório Paloma, na Califórnia, seis horas depois da sua passagem pela Terra. Os investigadores da NASA estimam que o fenómeno tenha sido um dos “voos” mais rasantes alguma vez registados. De acordo com Paul Chodas, diretor do Center for Near Earth Object Studies da NASA, a deteção do 2020 QG só se tornou possível depois da sua passagem devido à sua trajetória que se dirigia ao nosso planeta na mesma direção do Sol.

Há outros casos semelhantes, e perigosos. Em fevereiro de 2013, um asteroide chegou a entrar na atmosfera terrestre, explodindo no ar, e libertando entre 20 a 30 vezes mais energia do que as primeiras bombas atómicas.

A explosão, que ocorreu sob a região russa de Chelyabinsk, danificou cerca de 7 mil edifícios, feriu mais de mil pessoas com o calor resultante e a onda de choque quebrou janelas a mais de 93 quilómetros de distância. A identificação do asteroide foi impossível devido à sua trajetória, dirigindo-se ao planeta na mesma direção do Sol.

Asteroide de Chelyabinsk
Asteroide sobrevoa a região russa de Chelyabinsk, em fevereiro de 2013.

O último que foi considerado um perigo foi o Apophis, batizado com o nome do deus egípcio do caos, que poderia colidir com a Terra em 2068, mas essa hipótese já foi afastada e a próxima aproximação é só daqui a 100 anos.

Uma lista de risco de colisão que é monitorizada com atenção

Existem milhões de asteroides e cometas e os mais perigosos são mantidos sob observação pelo centro de coordenação de objetos próximos da Terra (NEOCC) que avalia o potencial de se tornarem um risco. Este mapa mostra os locais de entrada de bólides, pequenos asteroides que normalmente se desintegram ao entrar na atmosfera.

Impacto de pequenos asteroides
@nasa créditos: NASA

Há mais de 1.100 objetos que fazem parte de uma lista de maior risco. São asteroides e cometas que estão próximos da Terra e que foram classificados como risco não zero de colisão com o planeta.

Mas a observação abrange mais um número muito superior, de objetos que se aproximam mais da órbita da Terra, a menos de 0,2 au (unidade astronómica), o que corresponde a cerca de 30 milhões de quilómetros de distância. São mais de 25 mil asteroides próximos da Terra, 920 mil numa órbita considerada boa, mas distante, e ainda 3.7oo cometas.

No site do NEOC é possível ver os de maior interesse, que têm um registo de visualização da órbita em modo gráfico e pode ainda procurar um arquivo de imagens captadas pelos telescópios da ESA, ou que tenham acordos com a Agência Espacial Europeia.

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José Afonso, coordenador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa) explicou ao SAPO TEK por altura da edição de 2020 do Asteroid Day que a capacidade de mapear e seguir estes corpos no sistema solar é muito baixa.

"Não temos a capacidade de os conhecer a todos, muitas vezes só sabemos à posteriori", sublinhou o investigador, adiantando que "para ter uma noção da escala, no sistema solar, [os asteroides] são como cabeças de alfinete dentro de um estádio de futebol".

Mesmo assim, José Afonso elucidou que "não é esperado, estatisticamente, que haja maior aproximação, nas próximas centenas e milhares de anos, em rota de colisão com a Terra", indicando, porém, que é admirável que se continue a estudar estes objetos e a mapeá-los para os conhecer melhor.

25 anos de missões de investigação de asteroides

A história das missões de investigação conta com mais de duas décadas, desde que a NASA lançou a missão NEAR-Shoemaker, que partiu em 1996 para estudar o cometa Eros, onde acabou por pousar em 2000, terminando a sua missão de estudo e análise em 2001. Este ano novas missões de asteoides querem continuar a descoberta, já com novos instrumentos e ambições, e mais projetos estão definidos para os próximos anos.

A DART da NASA é a primeira a testar uma técnica de desvio de rota de asteróide, e vai ser acompanhada pela missão Hera, da ESA, que vai observar o resultado do impacto no asteroide Dimorphos, um corpo menor, ou Lua, de um sistema de asteroides duplo conhecido por Didymos. A Hera vai fazer o mapeamento científico, visual e de laser de alta resolução da lua, o primeiro objeto no Sistema Solar que terá sua órbita deslocada pelo esforço humano de uma forma planeada, e transformar a informação numa técnica de defesa planetária que pode ser repetida.

Uma missão com intervenção portuguesa

A Efacec, GMV e Synopsis Planet fazem parte da missão Hera, um dos projetos mais ambiciosos da Agência Espacial Europeia e que envolve testar a possibilidade de desviar grandes asteroides da rota da Terra.

Na primeira fase da missão, marcada para a segunda metade de setembro de 2022, a Agência Espacial Norte-Americana fará um Double Asteroid Redirect Test (DART), onde se prevê que a nave enviada colida com o menor dos dois corpos a uma velocidade de cerca de 6,6 km/s.

Dois anos após a colisão do DART, a missão Hera vai proceder ao levantamento detalhado dos efeitos do impacto com o objetivo de transformar a experiência numa técnica que permita desviar asteroides sempre que seja necessário.

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Os sistemas binários de asteroides representam cerca de 15% de todos os asteroides conhecidos, mas esta será a primeira vez que se fará a sua aproximação e exploração. Estima-se que em 2022 o sistema binário chegue a cerca de 16 milhões de quilómetros da Terra.

O corpo principal, de tamanho semelhante a uma montanha de 780 metros de diâmetro, é orbitado por uma lua de 160 metros, aproximadamente com a mesma dimensão da Grande Pirâmide de Gizé.

O que é que as empresas portuguesas vão desenvolver?

O projeto foi adjudicado em 2020 e os contratos têm um valor de 2,9 milhões de euros para as empresas portuguesas, como foi explicado na altura. Na nova missão, a Efacec vai desenvolver um altímetro LIDAR, um “equipamento baseado em tecnologia laser capaz de medir distâncias até 20 quilómetros com uma precisão de 10 centímetros”, explica Vasco Granadeiro, responsável pelo departamento de aeroespacial da Efacec. O altímetro vai permitir fazer o estudo do asteroide, assim como recolher dados que serão usados pelo sistema de navegação do satélite.

A contribuição da Efacec traduz-se no PALT (Planetary ALTimeter). Para o desenvolver, a empresa lidera um consórcio composto por mais uma empresa portuguesa, a Synopsis Planet, duas empresas romenas (Efacec-Roménia e INOE) e uma empresa da Letónia (Eventech).

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Já a GMV Portugal será responsável por desenvolver “um sistema autónomo altamente inovador de Orientação, Navegação e Controlo (GNC na sigla inglesa) para garantir o sucesso da missão”, elucida João Branco responsável do segmento Espaço da empresa.

“Somos responsáveis pelo sistema de controlo de manobras orbitais a bordo, incluindo a definição de estratégias de navegação híbrida entre o Segmento de Terra e o sistema de Controlo Automático GNC da nave”, indica o responsável.

A operação de aproximação e navegação em torno de asteroides é um grande desafio devido às gigantescas velocidades e distâncias que o corpo celeste se encontra da Terra. Segundo João Branco, o desafio pode ser comparado a "fazer acertar uma bala disparada a 2 kms noutra bala disparada a igual distância”.

A Synopsis Planet, spin-off da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, vai desenvolver o laser microchip do altímetro da Efacec, além de participar na criação do front-end ótico. “O laser que estamos a desenvolver é um laser microchip, que gera pulsos de laser de 1535nm de 2ns e é usado como a fonte de luz do altímetro”, explica Paulo Gordo, fundador da startup e membro da equipa científica da ESA que trabalha na missão Hera.

Para além da defesa da Terra, a missão HERA tem também como objetivo o desenvolvimento científico e investigação da origem do Sistema Solar, considerando que todos os corpos do universo são réplicas do Sistema Solar primitivo, uma vez que se formaram nas primeiras etapas do seu desenvolvimento e se mantiveram sem alterações, fornecendo assim uma grande quantidade de dados científicos para serem recolhidos.

O que já aprendemos com os asteroides?

A agência espacial japonesa, a JAXA, foi a primeira a trazer para Terra amostras recolhidas do asteroide Ryugu depois do encontro com a sonda Hayabusa2. As amostras foram deixadas a partir de órbita, numa cápsula.

A sonda Hayabusa2 passou um ano e meio a recolher amostras da composição do asteroide, e desde que chegou ao seu destino, em junho de 2018, realizou uma série de experiências para descobrir o que se esconde na superfície do asteróide: desde o envio de rovers ao disparo de uma mini "bola de canhão".

Veja na galeria algumas das experiências realizadas pela sonda japonesa, assim como fotografias que tirou ao longo da sua missão.

Uma vez que o Ryugu é um asteróide carbonáceo, os cientistas esperam encontrar, nas amostras recolhidas pela sonda, informação não só acerca da sua formação, mas também sobre a origem e evolução de planetas à semelhança da Terra, para além de Mercúrio, Vénus e Marte. De acordo com a JAXA, estas poderão ajudar os investigadores a descobrir de que forma é que a vida surgiu no Mundo.

As amostras já estão a ser analisadas, e há entusiasmo também pela sua dimensão, que a JAXA afirma ser relevante, mais 10 a 20 vezes mais do que as 100 miligramas esperadas.

Existe também esperança na informação que a missão da sonda OSIRIS-REx da NASA possa trazer. A sonda “pousou” com sucesso no asteroide Bennu para recolher amostras depois de um longo namoro com este corpo celeste que está a ser estudado desde 2016.

A sonda conseguiu recolher amostras de uma zona apelidada de Nightingale, uma das quatro localizações anteriormente identificadas pela agência para a missão.

Depois de uma descida de quatro horas, a OSIRIS-REx estendeu o seu braço robótico, contornando múltiplos rochedos à superfície do asteroide, incluindo o “Mount Doom”, uma rocha com o tamanho de um prédio de dois andares, para encontrar uma zona livre.

Ao entrar em contacto com Bennu, um dos três recipientes de nitrogénio pressurizado da sonda libertou uma pequena explosão, de forma a agitar a superfície, possibilitando a recolha de uma amostra: tudo num espaço de segundos.

Agora, os engenheiros e cientistas da NASA vão recorrer a um conjunto de técnicas para examinar a amostra recolhida remotamente. No topo da lista de tarefas está a comparação da superfície da zona em Nightingale para verificar quanto material é que foi recolhido.

De seguida, a equipa vai tentar determinar a quantidade que foi recolhida através da SamCam. A câmara da OSIRIS-Rex, dedicada a documentar todo o processo de recolha, vai tirar uma fotografia do Touch-and-Go Sample Acquisition Mechanism (TAGSAM) do braço robótico.

Já este ano, em maio, a sonda abandonou o asteroide para trazer de volta as amostras que recolheu durante a missão. A OSIRIS-Rex tem agora um longo caminho de regresso, que inclui duas voltas ao Sol, cobrindo 2,3 mil milhões de quilómetros para conseguir alcançar o planeta Terra, o que está previsto acontecer em setembro de 2023.

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