Os sinais dos riscos que o novo coronavírus poderia trazer para a nossa realidade começaram a chegar pela internet, as redes sociais e a televisão, mas pareciam bastante distantes, um problema “asiático”. Só quando os casos se avolumaram na Europa, e chegaram a Portugal no início de março é que a realidade pareceu concretizar-se, e o que se assemelhava a um filme “de fim do mundo” passou a ser o dia a dia de todos nós. Por muito mais tempo do que era esperado.
O mundo ficou mais silencioso e até a qualidade do ar melhorou com o confinamento e a redução de trânsito. Fechados em casa, em teletrabalho (pelo menos os que podiam), começámos a assistir a um desenrolar de acontecimentos que ainda pareciam longínquos.
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A redação do SAPO TEK pegou nos computadores e mudou-se para as suas casas na semana de 10 de março, ainda antes do confinamento determinado pelo Governo, e as ferramentas digitais que já usávamos no dia a dia passaram a ser ainda mais importantes.
Tínhamos acabado de assinalar os 20 anos do SAPO TEK e estávamos a meio de uma celebração planeada para ser um momento de união e confraternização com leitores e as empresas que acompanhámos nestas duas décadas, e tudo teve de ser repensado.
Este artigo faz parte do Dossier O melhor e o pior de 2020. E as expectativas para 2021. Leia aqui todas as análises e artigos deste especial
O telefone e as videoconferências substituíram as conferências físicas e as entrevistas presenciais, as reuniões de redação passaram a ser virtuais e as plataformas colaborativas ajudaram a fazer a ponte para a planificação do trabalho, enquanto as redes de comunicações sustentavam tudo, felizmente com muito poucas falhas.
Foi assim no país inteiro, e o balanço feito das infraestruturas é positivo, tendo sido medido amiúde pelos operadores e os reguladores, que mostram um cenário em que grande parte dos profissionais passaram a trabalhar a partir de casa e em que as crianças e jovens se mudaram para salas de aula virtuais, no computador, no tablet, no smartphone ou na televisão.
Mas não foi tudo fácil, como fomos percebendo. Muitos tiveram de levar os computadores de secretária para casa, não tinham largura de banda suficiente para fazer o trabalho, ou espaço físico para estarem concentrados durante as horas de expediente. Houve uma corrida aos computadores portáteis, routers e impressoras, para garantir condições de funcionamento em teletrabalho, mas muitas famílias não tinham equipamentos suficientes para garantir o trabalho dos pais e a escola dos filhos em plataformas eletrónicas, aumentando um fosso digital que já se conhecia. E as empresas enfrentaram os mesmos problemas, de escassez de equipamentos de mobilidade e falta de preparação de infraestruturas de acesso e de segurança para trabalho à distância.
Transformação digital forçada
Os ecrãs das plataformas digitais passaram a ser o acesso ao mundo, para coisas tão simples como falar com os amigos e a família, enquanto os números da pandemia e a informação sobre os números de pessoas infetadas e em cuidados intensivos eram partilhados diariamente na conferência do ministério da Saúde e da DGS. Os temas relacionados com o coronavírus estavam nos tops das pesquisas e de notícias lidas, enquanto se procurava informação sobre os sintomas, a forma de nos protegermos e maneiras de reenquadrar a vida naquilo que se convencionou chamar “o novo normal”.
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O combate à desinformação, ou as chamadas fake news, tornou-se mais crítico, com as plataformas a desenvolverem sistemas de alerta e widgets de informação fidedigna para manter as pessoas (bem) informadas.
Até porque tudo passou, ainda mais, a fazer-se online. As formas de equilibrar a vida pessoal e profissional, fazer exercício em casa, a confeção de pão e a resolução de problemas de comunicação e videoconferências ocuparam os primeiros lugares das preocupações, das pesquisas e das partilhas.
O resultado imediato de toda a mudança foi uma transformação digital “forçada”, em que se assume que foram dados passos que de outra forma poderiam levar anos a conseguir. Mudaram-se mentalidades de empresas e trabalhadores que não acreditavam ser possível o trabalho com horários flexíveis e à distância, e prepararam-se condições para telescola e a garantia de equipamentos a quem não os tinha. Neste caso as iniciativas solidárias foram uma mais valia e mostraram o potencial da capacidade de mobilização, como a Tech4Covid, que juntou dezenas de projetos de áreas muito diferentes, de plataformas de explicações online a aplicações, recondicionamento de equipamentos e ferramentas de colaboração A própria OCDE reconheceu o papel importante que a inovação estava a ter em Portugal nesta área.
Nove meses depois do início da pandemia o balanço desta transformação digital forçada não é todo cor de rosa, e a noção é que haverá muitas empresas que poderão mesmo ficar pelo caminho. Um estudo da Deloitte mostra que a percentagem de empregos que não podem ser “digitalizados” é grande e a própria Confederação Industrial Portuguesa (CIP) indica que há uma falta de competências digitais que tem de ser ultrapassada. O Plano de Ação para a Transição Digital tem desenhadas uma série de medidas que foram preparadas antes da COVID-19 mudar a realidade mundial e muitas já estão a ser implementadas, mas é preciso que cheguem a tempo.
Tecnologia cada vez mais próxima
Sem surpresas o combate aos efeitos do coronavírus assumiu este ano o maior protagonismo e trouxe maior visibilidade à tecnologia ligada à saúde e à investigação biomédica, com muitos recursos a apostarem nesta área e em toda a ajuda que a supercomputação e a cloud podem dar para o desenvolvimento de sistemas preditivos e o desenvolvimento de novos fármacos, assim como apoio e assistência aos mais necessitados. As aplicações de rastreamento de contactos, como a portuguesa StayAway COVID foram apresentadas como uma solução para quebrar as cadeias de contágio mas geraram polémica sobre os efeitos negativos na privacidade, e os benefícios acabaram por ainda não se concretizar pelo baixo nível de casos positivos reportados.
Mas nas outras áreas não parou a inovação, apesar dos consumidores parecerem estar mais focados em resolver problemas imediatos do que em comprar os topos de gama dos smartphones, o que teve impacto no mercado global. Ecrãs enroláveis, dobráveis, mais capacidade de processamento e bateria, uma nova geração de consolas e a aposta em plataformas de gaming na cloud estão nos primeiros lugares do que de melhor o ano trouxe em termos de novidades no consumo, tudo suportado em plataformas mais potentes, onde a inteligência artificial contribui para uma personalização mais eficiente com base em dados reais de utilização.
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Experimentámos muitas das novidades do mercado, em laboratórios improvisados nas “redações” provisórias. Foi a solução possível com os grandes eventos cancelados, a começar no Mobile World Congress de Barcelona que foi apanhado logo no início da chegada do coronavírus à Europa. As feiras e conferências passaram a realizar-se online, num modelo que se tornou muito menos interessante, como provou o Web Summit 2020, e sem possibilidade de experimentação local.
E parece que assim continuará. Já em janeiro a CES vai optar também pela plataforma online em vez da exposição em Las Vegas, e apesar de haver projetos para o MWC em Barcelona em junho 2021 é possível que nessa data ainda seja cedo demais para voltar a juntar milhares de visitantes e expositores no mesmo espaço.
O potencial do 5G por concretizar
Um dos dossiers que continuámos a acompanhar de perto foi o do lançamento do 5G em Portugal. Antes da pandemia tudo indicava que em julho poderíamos ter novos serviços a funcionar com a quinta geração móvel e todas as promessas de maior velocidade e menor latência, assim como de lançamento de novos serviços, mas o leilão acabou por ter de ser atrasado e com isso agudizou-se uma guerra que já estava latente entre os operadores de comunicações móveis e o regulador do mercado. Depois de ter sido conhecido o regulamento final para o leilão, as acusações e ameaças de recurso a tribunais e congelamento de investimentos multiplicaram-se, mas a verdade é que o procedimento seguiu o seu curso e tudo indica que deverá arrancar por estes dias, o que coloca como possível o lançamento de serviços no primeiro trimestre de 2021. Nós cá estamos para o experimentar assim que estiver disponível, depois dos primeiros vislumbres que já tivemos nos testes piloto.
Com todos os problemas tão perto, 2020 foi também um ano de “olhar para cima” e o espaço parece ter-se tornado ainda mais interessante. Todos os eventos ligados à astronomia e astrofísica geraram enorme curiosidade e estão entre os artigos mais lidos no SAPO TEK, num ano em que a SpaceX voltou a fazer história, com a NASA na primeira missão comercial a partir do território norte americano para a Estação Espacial Internacional com a Crew Dragon. Depois do primeiro teste bem-sucedido entre março e agosto, a primeira missão oficial já chegou à “casa” dos astronautas em órbita, no ano em que a ISS assinala o vigésimo aniversário.
Mas os olhos dos cientistas estão colocados para lá da órbita do planeta Terra, numa nova corrida à Lua e a Marte com datas marcadas e com metas bem definidas para os próximos anos, à medida que as descobertas apontam também para a existência de mais exoplanetas e que os instrumentos permitem descobrir mais sobre a origem do universo.
Parece que ninguém sabe como desinstalar 2020 e de forma mais prosaica já estamos a olhar para 2021, embora a incerteza do regresso a uma normalidade ameace os desejos para um ano melhor. Por muito digitais que continuemos a ser, faz muita falta o “modo analógico” dos relacionamentos presenciais e da possibilidade de contacto humano que certamente todos estamos desejosos de retomar.
Este artigo faz parte do Dossier O melhor e o pior de 2020. E as expectativas para 2021. Leia aqui todas as análises e artigos deste especial
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