Em entrevista ao jornal Expresso, George Glass, embaixador dos EUA em Lisboa, admite que Portugal é uma vítima do conflito comercial entre EUA e China ao fazer parte do “campo de batalha” na Europa, onde uma das frentes de conflito é a nova tecnologia 5G, relativamente à qual Portugal equaciona trabalhar com a chinesa Huawei, ainda que não em aspectos fundamentais da rede, mas apenas na distribuição do sinal de rádio.

“Há países que estão a trabalhar numa verdadeira parceria como aliados. Se não formos capazes de comunicar a esse nível, então haverá também reflexos na atmosfera política e nos desenvolvimentos da relação política. Por agora, é um assunto de Defesa Nacional e não de política”, afirmou George Glass em entrevista ao Expresso.

O diplomata avisa que as consequências serão de âmbito técnico, como a atividade da NATO ou a troca de informação classificada, e não políticas, pelo menos para já.

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Para os EUA é preferível que Portugal não tivesse qualquer equipamento da Huawei na rede de 5G. “Se não tivermos parceiros confiáveis na rede de telecomunicações portuguesa, mudará a forma como interagimos com Portugal em termos de segurança e de Defesa. Temos feito chegar esta mensagem alto e bom som: a forma como trabalhamos com a NATO ou como trocamos informação classificada será afetada. Se tivermos confiança nas telecomunicações, seremos capazes de continuar a relacionar-nos como no passado. Se não tivermos, teremos de mudar a forma como comunicamos com Portugal”, disse o embaixador.

Os Estados Unidos já proibiram a utilização de tecnologia da Huawei dentro do país e a colocação da empresa chinesa na lista negra impede as empresas norte americanas de fazer negócio com a Huawei, o que tem levado ao bloqueio de produtos e serviços, como a utilização dos Google Mobile Services nos smartphones da marca. Mas a diplomacia da administração Trump tem levado mais longe este bloqueio, pressionando os países aliados para tomarem opções semelhantes.

Recorde-se que esta não é a primeira vez que os Estados Unidos alertam Portugal para os riscos da utilização de tecnologia chinesa nas redes 5G.  Em fevereiro, numa visita a Lisboa, Robert Strayer, responsável pela política cibernética do Departamento de Estado norte-americano, defendeu que as empresas chinesas "não devem participar na evolução do 5G em Portugal", dizendo ainda que está confiante que, a longo prazo, as operadoras portuguesas implementarão “apenas tecnologia fiável”.

Ainda em  dezembro de 2019, Mike Pompeo, o secretário de Estado norte-americano, visitou Lisboa e deixou avisos em relação a empresas como a Huawei. Também no início do ano Ajit Pai, presidente da Comissão Federal das Comunicações dos EUA (FCC), reuniu-se com responsáveis do Governo português para abordar questões relativas à segurança no 5G e partilhar a sua visão – e receios – sobre o tema.

Governo português diz que toma as suas próprias decisões

Na sequência da entrevista, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, em declarações à agência Lusa, explicou que “O Governo português regista as declarações […]. Mas o ponto fundamental é este: em Portugal, quem toma as decisões são as autoridades portuguesas, que tomam as decisões que interessam a Portugal, no quadro da Constituição e da lei portuguesa e das competências que a lei atribui às diferentes às diferentes autoridades relevantes”.

Segundo o ministro, "as decisões tomadas em Portugal são tomadas de acordo com os valores democráticos e humanistas, os valores portugueses, de acordo com os interesses nacionais de Portugal, de acordo com o processo de concertação a nível da União Europeia (UE), quando esse processo é pertinente e com o sistema de alianças em que Portugal se integra, que é bem conhecido e está muito estabilizado”, acrescentou.

Sobre questões relacionadas com a possibilidade de uma rede 5G da Huawei poder afetar a segurança e defesa nacionais, Santos Silva sublinhou que existem critérios de avaliação. “Sabemos muito claramente que, em certos aspectos que têm a ver com questões de segurança nacional ou com sistemas de defesa em que Portugal se integre, os critérios de avaliação incorporam também esses critérios”, concluiu.