O sarcasmo, palavras-chave ou referências ambíguas têm sido usados para denunciar o impacto da estratégia "zero covid", assumida como um triunfo político pelo secretário-geral do Partido Comunista Chinês, Xi Jinping.
No Weibo, alguns utilizadores desabafaram de forma sarcástica sobre o quão fantástica a China é, em resposta a um tópico promovido pela rede social sobre violações dos Direitos Humanos nos Estados Unidos. Outros postaram imagens do filme “La La Land: Melodia do Amor”, em referência às declarações de um porta-voz do Governo sobre o quão bem o país está a gerir a pandemia.
Numa outra crítica velada ao regime, os internautas uniram-se para colocar a obra de ficção de George Orwell “1984” no topo da classificação do portal Douban, o equivalente ao portal IMDB na China, mas que serve também para classificar livros. Aquele romance, um dos mais influentes do século XX, retrata um regime totalitário e opressivo, onde a vigilância é constante.
Os censores tiveram mesmo de banir referências ao primeiro verso do hino nacional do país - “Ergam-se, aqueles que se recusam a ser escravos” -, após ter sido compartilhado em conjunto com imagens e críticas a denunciar as medidas de confinamento altamente restritivas do país.
A China condena frequentemente à prisão ativistas ou dissidentes por "perturbação da ordem pública" ou "subversão do poder do Estado".
No entanto, críticas abertas ao regime têm-se multiplicado numa altura em que o novo coronavírus volta a paralisar o país. Imagens de suicídios, pessoas a passar fome, a enlouquecer ou a morrer por causas como apendicite aguda, devido à falta de acesso a tratamento hospitalar, multiplicam-se nas redes sociais, apesar dos esforços do regime para censurar críticas.
É difícil medir o descontentamento popular no país, devido à ausência de estudos de opinião ou imprensa livre, mas vários chineses, sobretudo jovens urbanos e educados, passaram a ser mais vocais nas críticas à estratégia atual.
A agência Lusa confirmou que, na última semana, pelo menos duas universidades da capital chinesa foram palco de protestos pelos estudantes - Universidade de Pequim (‘Beida’) e Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim (BISU) -, contra a imposição de medidas de confinamento nos campus.
“Estamos cansados de políticas idiotas”, diz Yang, de 25 anos, e residente em Pequim, à Lusa. “Fui ensinada, desde a escola primária, que este país pertence ao povo”, aponta. “Mas somos meros escravos”.
Pequim está a tentar conter a propagação do vírus através do isolamento de bairros e rondas quase diárias de testes em massa. A capital chinesa decretou teletrabalho e encerrou restaurantes, ginásios e outros estabelecimentos.
Xangai, a “capital” financeira da China, com 26 milhões de pessoas, está sob confinamento total há sete semanas, num esforço desesperado para suprimir o vírus.
“As cenas de violência, regras sem nexo, estão a levar muita gente a querer ir-se embora, e não são só os jovens, mas também pessoas na casa dos 50 e 60, que me dizem: nunca experienciei isto em Xangai”, diz um empresário português ali radicado. As medidas afetaram também importantes cidades industriais como Changchun e Cantão.
Xu Jianguo, professor de Economia na Universidade de Pequim, estimou que o prejuízo causado pelas interrupções na atividade económica ascende a 18 biliões de yuans (2,54 biliões de euros).
“A gravidade dos surtos este ano é mais de 10 vezes superior à de 2020 (…) em termos da população afetada e de custo económico”, apontou, num seminário realizado online, na semana passada. Xu considerou que é questionável se a China vai conseguir alcançar a meta de crescimento económico oficial de “cerca de 5,5%”, estabelecida para este ano, ou mesmo igualar o crescimento de 2,3%, registado em 2020.
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