Os deputados usaram uma figura do regimento para pedir que os projetos baixem à comissão sem votação, um agendamento que partiu do BE, a que se juntaram depois as propostas do PS, PSD, PCP, CDS-PP, PAN, PEV e da deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

Desta forma, permite-se que todas as propostas sejam discutidas em comissão e, havendo acordo, a comissão propõe um texto de substituição que depois é votado na generalidade, especialidade e em votação final global. Os partidos que não se revejam nesse texto podem levar os seus projetos a votação.

No debate parlamentar que se realizou ontem, o secretário de Estado Adjunto, do Trabalho e da Formação Profissional, Miguel Cabrita, admitiu "margem" para encontrar "soluções e equilíbrios" no parlamento sobre a regulamentação do teletrabalho, depois de o PS, através da líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, ter dito o mesmo.

Entre as propostas, identificam-se convergências na necessidade de a opção pelo teletrabalho depender de acordo com o trabalhador, de acautelar as questões de privacidade, de prever que os acidentes que aconteçam em casa, quando em teletrabalho, possam ser considerados acidentes de trabalho e na garantia da igualdade de tratamento entre os trabalhadores "à distância" e aqueles que estão presencialmente.

Contudo, há ainda muitos pontos divergentes entre as propostas dos partidos, destacando-se o pagamento das despesas dos trabalhadores em teletrabalho com a eletricidade, a água ou as telecomunicações.

Conheça ao detalhe as propostas apresentadas pelos partidos

Bloco de Esquerda

O Bloco de Esquerda propôs uma alteração ao regime jurídico-laboral de teletrabalho que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais

O deputado José Soeiro indicou que o partido espera que o debate seja o “pontapé de saída” para uma mudança legislativa, sublinhando os desafios das condições vividas pelos teletrabalhadores, assim como as despesas extra que o regime acarreta para os mesmos.

O projeto de lei pretende explicitar que, “em regime de teletrabalho, se mantém o direito ao subsídio de alimentação e que é responsabilidade do empregador o fornecimento dos meios de informação e comunicação utilizados em teletrabalho”. A proposta ambiciona também clarificar as regras de pagamento pelo empregador das despesas que originaram durante o trabalho remoto, nomeadamente, com telecomunicações, água e energia.

“O teletrabalho não significa isenção de horário” ou a disponibilidade e conexão permanente do trabalhador, indicou o deputado. O “direito a desligar” já existe, mas o partido defende que precisa de ser, de facto, esclarecido, consagrado na lei e exercido.

A privacidade dos trabalhadores afirma-se como uma questão prioritária e o partido defende que se deve proibir que os empregadores imponham através de software uma conexão permanente “por meio de imagem ou som durante a jornada de trabalho”.

No que toca à proteção dos trabalhadores remotos, o Bloco de Esquerda argumenta que é necessário alargar na regulamentação em questão o conceito de “local de trabalho”, de modo a que seja aplicada quando este é exercido no domicílio, “impedindo a qualificação de acidentes profissionais ocorridos em casa como «acidentes domésticos»".

O partido propõe ainda que, no regime de teletrabalho, passe a ser um direito aceder a regimes de trabalho flexíveis para quem tenha filhos ou outros dependentes menores de 12 anos ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica, ou ainda no caso de trabalhador que seja cuidador não principal de pessoa dependente.

De acordo com José Soeiro, o projeto de lei tem como grande objetivo “disciplinar o regime de teletrabalho seguindo dois princípios fundamentais”: só pode existir se for voluntário e tem de ser sempre reversível.

PCP

O projeto de lei apresentado pelo Partido Comunista pretende regular o regime de trabalho em teletrabalho, com uma particular ênfase na compensação do trabalhador pelos gastos acrescidos com comunicações, eletricidade ou água, através de um valor fixado de ajudas de custo, proposto nos 11 euros por dia.

A deputada Diana Ferreira sublinhou que o partido se manifesta contra as situações de “tele-exploração” vividas por muitos trabalhadores, rejeitando também a ideia de teletrabalho como uma “panaceia para todos os males” e a desresponsabilização das entidades patronais que, nas suas palavras, são quem “sai efetivamente a ganhar” com esta situação.

Os trabalhadores em teletrabalho têm de ter os mesmos direitos dos trabalhadores presenciais, defendeu a deputada, acrescentando que estes não devem ser “esvaziados dos seus direitos”.

O PCP indica na sua proposta que as entidades patronais devem garantir também o fornecimento e manutenção dos instrumentos de trabalho necessários aos trabalhadores. O partido rejeita também a ideia de que a casa do trabalhador seja considerada como uma “extensão” da empresa.

O projeto pretende garantir a possibilidade de os trabalhadores poderem regressar a qualquer momento ao posto de trabalho na sua empresa, além de assegurar que os trabalhadores tenham o poder de “rejeitar a proposta de teletrabalho” quando considere que não estão reunidas as condições para poder prestar a sua atividade.

Deputada não-inscrita Cristina Rodrigues

Já a deputada Cristina Rodrigues apresentou dois projetos de lei, com o primeiro a ter em vista o reforço os direitos dos trabalhadores em regime de teletrabalho, prevendo também o “direito a um acréscimo remuneratório para pagamento do aumento das despesas que o trabalhador tenha decorrentes da prestação de trabalho em regime de teletrabalho”.

A proposta pretende também reforçar a igualdade de tratamento dos trabalhadores em regime de teletrabalho, reforçar a sua privacidade e dar aos trabalhadores o direito de preferência para o exercício de funções neste regime, quando seja trabalhador-estudante, tenha deficiências ou doenças crónicas, ou filhos de idade igual ou inferior a 12 anos ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica.

“É importante assegurar tempo livre ao trabalhador”, afirmou a deputada. Assim, a sua segunda iniciativa quer garantir o direito dos trabalhadores à desconexão profissional, relembrando que, em Portugal, a lei não o prevê expressamente.

PEV

O partido “Os Verdes” propõe também uma alteração ao código do trabalho com vista a regular o teletrabalho de forma mais justa. O deputado José Luís Ferreira enfatizou que o pressuposto que deve nortear o regime é o da voluntariedade. “A atual legislação laboral não dá resposta aos problemas que se impõem” atualmente, afirmou.

“O que se está a verificar é que existem limites da dignidade humana” que estão a ser ultrapassados pelas entidades patronais, defende o deputado, acrescentando que é necessário zelar pela privacidade os trabalhadores e que tenha o direito a poder desligar-se, sem que o seu horário não seja desregulado.

A proposta do PEV defende também que as entidades patronais devem garantir o fornecimento dos materiais necessários aos trabalhadores, além do pagamento de custos acrescidos relacionados com o teletrabalho.

O partido argumenta que os trabalhadores devem poder rejeitar a proposta de teletrabalho quando verificar que não estão reunidas as condições necessárias. A proposta indica também que quem tem “filhos, ou outros dependentes a cargo até aos doze anos, com deficiência ou com doença crónica, bem como os cuidadores, os cidadãos portadores de deficiência ou de doença crónica, ou os trabalhadores estudantes” possam solicitar, por iniciativa própria, a prestação de trabalho em regime de teletrabalho.

PS

A necessidade de regular o teletrabalho estava patente há muito, a pandemia veio apenas exacerbar a situação, afirmou a deputada Ana Catarina Mendes. A proposta apresentada pelo Partido Socialista tem como objetivo proceder à regulação do teletrabalho, centrando-se em seis pontos-chave: da sua implementação à igualdade de tratamento, passando ainda pela direção do trabalho, deveres específicos e tempos de descanso.

O partido defende que a sua iniciativa procura mitigar os riscos e a criar um equilíbrio entre trabalhadores e empregadores. “O teletrabalho só avança por mútuo acordo entre as partes”, enfatizou a deputada.

Ana Catarina Mendes sublinhou que a iniciativa do PS garante que os trabalhadores remotos terão os mesmos direitos dos trabalhadores presenciais, assegurando que as despesas acrescidas são suportadas pelas entidades patronais e que a privacidade e as condições de segurança são prioridades.

“O Partido Socialista escolhe o trabalho com dignidade” no mundo moderno, zelando pelos direitos e pela igualdade, afirmou Ana Catarina Mendes, relembrando que esta é uma das promessas do processo de transição digital.

PAN

O PAN teve sobre a mesa de debate dois projetos: o primeiro com vista a regulamentar o teletrabalho no setor público e privado, criar o regime de trabalho flexível e reforçar os direitos dos trabalhadores em regime de trabalho à distância e o segundo centrado no direito de desconexão profissional.

“É importante estabelecer um modelo de trabalho flexível”, defendeu a deputada Inês de Sousa Real, que sublinhou que o partido espera que a discussão seja “o início de um caminho” com vista ao equilíbrio entre os interesses dos trabalhadores e dos empregadores, garantindo uma sociedade laboral mais justa.

O projeto propõe um alargamento das situações em que o trabalhador tem o direito ao exercício do trabalho à distância, seguindo quatro princípios essenciais: a promoção e conciliação da vida familiar e profissional; a promoção da inclusão social, o aumento da qualificação do trabalhador e a promoção da coesão territorial.

O PAN pretende clarificar também direitos que “não foram respeitados” no contexto da pandemia, incluindo o do subsídio de refeição e o da privacidade, além de garantir que as entidades patronais compensam o trabalhador remoto pelas despesas acrescidas.

A proposta indica ainda que se deve estabelecer um conjunto de medidas que previnam os riscos de isolamento associados ao trabalho à distância, prevendo-se a “obrigatoriedade de o empregador assegurar um conjunto de medidas de proteção da saúde do trabalhador”:

PSD

O PSD tem também em vista a alteração do regime jurídico-laboral do teletrabalho e o deputado Pedro Roque indicou também que importa “perspetivar a realidade” do teletrabalho pós-pandemia. “Torna-se assim importante que se possa revisitar o código do trabalho tendo em consideração uma realidade que era residual antes da crise de saúde pública”, afirmou.

A iniciativa do partido propõe que o empregador tenha de suportar as despesas inerente ao teletrabalho, as quais devem ser consideradas, para efeitos fiscais, custos para as empresas. A reserva da vida privada do trabalhador deve assegurada, respeitando a sua privacidade e do seu agregado familiar.

O partido defende ainda que, sempre que o teletrabalho seja realizado em casa, “a visita ao local de trabalho só possa ter por objeto o controlo da atividade laboral”, e que possa apenas ser realizada durante o “período normal de trabalho”. O PSD propõe também “clarificar e acautelar situações de acidentes de trabalho, introduzindo a flexibilização do conceito de local de prestação de trabalho”.

CDS-PP

O deputado Pedro Morais Soares relembro que o partido já tinha apresentado uma proposta acerca do teletrabalho há cinco anos, a qual foi rejeitada.

Agora, tendo em conta o contexto da pandemia de COVID-19, o debate torna-se urgente, defendeu o deputado, com ênfase no “Direito ao Desligamento”, algo que o partido considera como algo que não está consagrado explicitamente no Código do Trabalho.

“Defendemos que deve ficar explicitamente consagrado no Código do Trabalho o direito de o trabalhador dispor de «tempos mortos», nos quais poderá desconectar-se”, pode ler-se na proposta do partido.

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