Ao longo dos últimos dois anos, a Clearview AI vendeu às autoridades norte-americanas um software de reconhecimento facial que parece ter saído diretamente de um universo distópico. O sistema desenvolvido pela startup recorre a uma base de dados com mais de 3 mil milhões de fotos obtidas em redes sociais como o Facebook, ou plataformas à semelhança do YouTube, para rapidamente reconhecer a identidade de um indivíduo.

De acordo com o The New York Times, a aplicação criada pela Clearview AI permite aos agentes da autoridade pesquisar pela identidade de uma determinada pessoa utilizando apenas fotografias da mesma. O software consulta a sua extensa base de dados para verificar se existem correspondências, apresentando até os endereços das páginas web onde se encontram as imagens do indivíduo. Ao todo, mais de 600 departamentos da polícia já adotaram a tecnologia.

Ao que tudo indica, o sistema criado pelo empresário australiano Hoan Ton-That apresenta uma precisão na ordem dos 75%, sendo capaz de identificar alguém mesmo se a sua cara esteja apenas parcialmente visível. Embora a empresa não especifique que autoridades o utilizam, o software terá ajudado a polícia norte-americana a resolver diversos tipos de crime: desde furtos a homicídios, passando por roubos de identidade a casos de abuso sexual de menores.

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A aplicação não está disponível para uso do público, sendo apenas utilizada pelas autoridades policiais. A investigação levada a cabo pelo jornal revela ainda que a empresa está a desenvolver um protótipo de óculos de realidade aumentada que utiliza o sistema de reconhecimento facial criado para identificar instantaneamente um indivíduo.

Perante a descoberta do modo de funcionamento do software, um porta-voz do Facebook indicou, em comunicado à imprensa internacional, que a empresa está a investigar as práticas da Clearview AI para ver se vão contra as suas regras. Já plataformas como o Twitter, o YouTube, o Instagram e a Venmo confirmaram ao The New York Times que o sistema de reconhecimento facial viola as suas políticas.

A utilização de reconhecimento facial, quase ubíqua em países como a China, está a levantar diversas preocupações, nomeadamente, a criação de sistemas de vigilância repressivos por parte de governos. Segundo o jornal, são vários os grupos que afirmam que a tecnologia pode apresentar falhas que poderão colocar a vida das pessoas em causa, havendo também a possibilidade de cair nas mãos de criminosos.

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O caso da Clearview AI não é totalmente inédito. Em 2018, documentos obtidos pela União das Liberdades Civis Norte-Americana (ACLU, na sigla em inglês) revelaram que a Amazon estava a fornecer o seu sistema de reconhecimento facial à polícia dos estados do Oregon e da Florida. A tecnologia anunciada pela gigante do e-commerce em 2016 é capaz de identificar, seguir e analisar pessoas em tempo real e reconhecer até 100 indivíduos numa só imagem.