Recentemente, Matthias Maurer, astronauta alemão que passou 175 dias na Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), partilhou mais detalhes sobre a sua experiência junto dos 31 finalistas da iniciativa Zero-G Portugal, promovida pela Agência Espacial Portuguesa (Portugal Space). Mas como é que o astronauta encara o impacto da guerra na Ucrânia nas relações entre os países presentes na ISS?

O astronauta realça que as operações na ISS “são um esforço conjunto” . “Durante o nosso treino tivemos de aprender como viver e trabalhar no Espaço e de forma eficiente com pessoas de outras partes do mundo”.

Mas, como afirma Matthias Maurer, a cooperação não se pode limitar àquela que acontece entre os astronautas no interior da estação. “A cooperação internacional é a única forma de levarmos a cabo estes projetos no Espaço”, enfatiza.

“A ISS é gigante e muito importante. Os Estados Unidos provavelmente conseguiriam gerir sozinhos, mas teriam de gastar todo o dinheiro nisso: não poderiam voar até à Lua ou a Marte. A Rússia, atualmente, não a consegue operar sozinha”, afirma.Por outro lado, a Europa tem apenas um módulo, isto é, o equivalente a 8,3% da estação em si, explica o astronauta.

“Nós não temos forma de chegar ao Espaço e temos de voar com os norte-americanos ou com os russos. A cooperação internacional é a única forma de ter muitos países a participar [em projetos espaciais] e sem esta cooperação esses países nunca teriam acesso ao Espaço”.

A guerra entre Rússia e Ucrânia tem o potencial para causar disrupções neste processo. Recorde-se que, em julho, Yuri Borissov, chefe da agência espacial russa (Roscosmos), anunciou que a Rússia iria abandonar a ISS em 2024.

Ainda em março, Moscovo tinha advertido que as sanções ocidentais contra a Rússia podiam afetar o funcionamento das naves russas que abastecem a ISS, e, por extensão, o segmento russo da estação, com executivos da Roscosmos afirmarem que sem a colaboração do país a estação poderia perder o controlo e despenhar-se.

Mais tarde, a Roscosmos comunicou à NASA que, afinal, a estadia vai prolongar-se até que a futura estação espacial russa esteja operacional, algo que se espera que aconteça em 2028.

“A cooperação vai continuar e é preciso que continue, porque ninguém consegue gerir a estação espacial sozinho”, sublinha Matthias Maurer, lembrando que a ISS “demorou 20 anos a ser desenvolvida e, hoje, está a funcionar perfeitamente”, sendo esta a “altura de colher os frutos da investigação científica” feita a bordo.

A guerra na Ucrânia é uma “situação complicada” nas palavras de Matthias Maurer, que recorda que a crise levou, por exemplo, ao corte de relações entre a Agência Espacial Europeia (ESA) e a homóloga russa, incluindo na missão ExoMars e em futuras missões lunares.

"Não é preciso ser um super-Homem para voar ao Espaço” e Matthias Maurer recorda como lá chegou
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Para Matthias, o regresso à Terra de dois cosmonautas russos da Roscosmos e um astronauta americano da NASA a bordo da cápsula Soyuz MS-19, em março deste ano, afirma-se como um “bom exemplo” da cooperação entre países na ISS. “Isto é suficientemente simbólico para demonstrar que a cooperação entre NASA e Roscosmos irá continuar”.

“Para nós europeus esta é a única “bolha” de cooperação que temos [com a Rússia] que vai continuar. É preciso que a colaboração continue, caso contrário ficaremos sem a Estação Espacial Internacional”, destaca o astronauta.

Recorde-se que os jovens da iniciativa Zero-G Portugal – Astronauta por um Dia tiveram a oportunidade de experienciarem entre cinco a seis minutos de gravidade zero num voo parabólico de duas horas, o primeiro deste tipo em Portugal.

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