Os leitores de ecrã são uma parte fundamental da experiência de navegação das pessoas com deficiências visuais, mas como é que tudo se processa? Ao SAPO TEK, Ricardo Teixeira, que perdeu a visão há cerca de 21 anos, dá a conhecer mais sobre as suas vivências.
Ricardo, de 36 anos, é osteopata, mas também trabalha na área da produção e, anteriormente, também deu cartas no mundo da stand-up comedy e escreveu um livro, “Curva no Escuro”, publicado em 2014, onde partilha a sua história de vida.
A sua relação com a Internet é diária. “Faço de tudo”: de trabalhar com emails a utilizar plataformas como WeTransfer, YouTube, Google e redes sociais, se bem que estas últimas menos regularmente, não por questões relacionadas com o acesso, mas sim por opção pessoal.
As plataformas de compras online também fazem parte, embora detalhe que, nestes casos, existam situações em que tem de por vezes “pedir ajuda a outras pessoas por causa da introdução de alguns dados”. Em questão, está a forma como estão estruturados os websites, que impede uma leitura adequada pelos programas que leem o ecrã, em linha com o que Joaquim Cardoso, dirigente na Associação Portuguesa de Deficientes (APD) explicou ao SAPO TEK.
“Alguns sites continuam a não estar preparados para leitores de ecrã e têm erros de várias ordens, ou fazem auto refresh constante que tiram o foco do sítio, ou têm mesmo informação inacessível”, realça Ricardo Teixeira.
Atualmente, o JAWS e o NVDA são os dois leitores de ecrã que utiliza, com a segunda opção a ser a mais frequente. Numa breve viagem pelo tempo, Ricardo recorda que passou a conhecer este tipo de programa através de alguém que conhecia e que trabalhava para a Associação Promotora de Emprego de Deficientes Visuais (APEDV), local onde fez o curso de massagem de recuperação.
“Antes de fazer o curso, foi através de uma pessoa que trabalhava lá [na APEDV] que soube da existência dos leitores de ecrã”, relembra. “O primeiro leitor de ecrã que tive foi me oferecido por um amigo. Na altura ainda não sabia de ajudas de apoios técnicos. “O JAWS é pago e, se o comprares diretamente, custa à volta de 1.200 euros. O que há são ajudas técnicas do Estado para quem as recebe, o que não é sempre”, explica.
Fora dos leitores de ecrã pagos, há opções gratuitas, seja para computador, como o NVDA, que também é open-source, ou para dispositivos móveis. Nos smartphones e tablets, “tudo o que é Android ou iOS já traz leitores de ecrã instalados”, destacando-se ainda várias opções maioritariamente grátis fora daquelas desmobilizadas pela Google e Apple.
Este tipo de programas dá uma grande ajuda, se bem que possam implicar um tempo mais demorado na realização de algumas tarefas: “temos de estar à espera que o leitor consiga ler tudo até conseguirmos perceber o que se está a passar”, indica Ricardo.
É por este motivo que as Directrizes de Acessibilidade de Conteúdo da Web (WCAG, na sigla em inglês) do W3C apresentam um papel fundamental. Recorde-se que a operabilidade é um dos quatro princípios-chave do WCAG 2.1, indicando que deve ser garantida a navegação a todas as funcionalidades do conteúdo web, independentemente dos dispositivos de input usados e do próprio perfil do utilizador.
No entanto, como reforça Ricardo, a realidade continua a estar longe do ideal, com múltiplos websites cuja construção, em termos de design gráfico, “completamente impossível de utilizar” por quem tem de recorrer a leitores de ecrã.
Bancos, sites do Estado, de operadoras de telecomunicações são alguns dos principais exemplos que aponta, assim como em plataformas de streaming nacionais, à semelhança da OPTO, que não consegue ser lida por leitores de ecrã na sua versão mobile, algo que não acontece, por exemplo, com a Netflix.
Para Ricardo, a principal barreira de acessibilidade web para as pessoas com deficiências visuais continua a ser o design dos websites. “É o facto da maioria dos web-designers, e já falei com muitos que me confirmaram isso, não fazem ideia do que é um leitor de ecrã e nunca viram um a funcionar na sua vida”, enfatiza.
Embora, em Portugal, a entrada em vigor do Decreto-lei nº83/2018, que transpôs a diretiva europeia de acessibilidade, tenha simbolizado algum progresso, pelo menos em “papel”, Ricardo sente que há uma falta de preocupação e de conhecimento por parte maioria das pessoas que estão por trás dos websites.
O que é necessário para tornar a Internet um local mais acessível? Para Ricardo, acima de tudo, é preciso uniformidade. “Os websites, plataformas, aplicações serem construídos numa base totalmente acessível para todas as pessoas”, algo que “ainda não o é”.
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