"Queremos incentivar os cidadãos a usar o digital em primeiro lugar, depois o telefone e, finalmente, o local. Queremos evitar que as pessoas se desloquem fisicamente", explica Jani Ruuskanen, especialista da Agência de Serviços Digitais e de Informação sobre a População.
Num país com uma população de 5,6 milhões de pessoas, todos os registos são feitos em tempo real, pelo que não há necessidade de fazer recenseamentos.
Apenas cerca de 300 mil cidadãos não recorrem aos serviços digitais, mas as autoridades criaram 'mandatos digitais', que permitem que uma pessoa trate online dos assuntos de outra pessoa - por exemplo, filhos podem resolver questões relativas aos pais, mais idosos e com mais dificuldades para utilizar a Internet.
"Queremos ser 100% digitais", refere o responsável.
O programa do Governo estipula que os serviços digitais devem ser o canal primário para aceder aos serviços das autoridades públicas.
Entregar a declaração do IRS, interagir com a polícia, pedir subsídios da Segurança Social ou requisitar receitas para medicamentos são algumas das soluções digitais oferecidas pelos organismos públicos.
A Finlândia, que lidera a tabela DESI (Digital Economy and Society Index), da União Europeia (UE), vê a digitalização "essencialmente como uma ferramenta para poupar tempo e esforço" e com "outros benefícios, como uma pegada ecológica reduzida", segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Os finlandeses têm um elevado grau de literacia digital, que começa nas escolas: desde o ensino primário, as crianças podem utilizar os telemóveis nas aulas e partilham computadores, e, mais tarde, cada estudante recebe o seu próprio computador.
"Ao mesmo tempo, as empresas também beneficiam das soluções de fácil utilização que os privados usam, poupando aos seus funcionários tempo e dinheiro", indica o ministério.
Nos impostos, quase 89% dos contribuintes entregaram no ano passado as declarações por via eletrónica, enquanto nas empresas a percentagem subiu para 92%.
"Ainda estamos a trabalhar. Queremos que todos entreguem 'online'", afirma Veijo Romppainen, diretor de impostos corporativos da Autoridade Tributária.
Na Segurança Social ('Kela'), 79,2% dos pedidos de subsídios foram submetidos 'online', em 2022, enquanto apenas 600 mil cidadãos se deslocaram fisicamente aos centros da instituição.
Nos organismos públicos, a Inteligência Artificial (IA) ainda está a ser testada, mas já há algumas aplicações: na 'Kela', recorrem à IA para poupar trabalho aos funcionários, nomeadamente endireitar ou dar novos nomes a anexos enviados por correio eletrónico.
"Temos mais sete soluções em estudo e dez investigadores a trabalhar nisto", diz Reelta Tilvis, responsável do Desenvolvimento do instituto.
A 'Kela' já utiliza robôs: há 68 "companheiros de trabalho digitais", que no ano passado desempenharam mais de 1,6 milhões de tarefas. Na biblioteca nacional, também são pequenos robôs que repõem nas prateleiras os livros devolvidos.
No município de Helsínquia, a IA foi aplicada para avaliar as centenas de alertas falsos gerados no metro, por exemplo, por portas, luzes ou travões, identificando quais são as falhas verdadeiras, o que permitiu reduzir em 90% a necessidade de manutenção.
Na Yel, televisão pública, financiada através de um imposto específico, a IA também é um recurso para permitir ouvir um texto escrito ou para fazer a voz da meteorologia.
"Estamos a estudar que tipo de ferramenta de IA é necessária para ajudar os jornalistas a fazerem o seu trabalho, mas sem substituir os jornalistas", avança Jahri Lahti, responsável de exploração e investigação da Yel.
Responsáveis finlandeses justificam a elevada adesão dos cidadãos com o facto de estes serem bons conhecedores das tecnologias e, por outro lado, por a sociedade se basear na "confiança e transparência", valores "centrais na Finlândia".
Conetividade e competências digitais são prioridade
Promover o acesso à Internet, aumentar as competências digitais e fomentar a inovação no setor privado são prioridades da Finlândia na ajuda ao desenvolvimento, disse à agência Lusa um responsável do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) finlandês.
"Uma das áreas prioritárias que a Finlândia está a financiar e a priorizar no contexto da ajuda ao desenvolvimento global é a conectividade, promovendo acesso à Internet e conectividade com a Internet no Sul global", adiantou o responsável de Política de Desenvolvimento da diplomacia finlandesa, Aki Enkenberg.
O representante do MNE salientou que Helsínquia está a coliderar, com a França, um dos grupos de trabalho da estratégia europeia Global Gateway - que pretende promover ligações inteligentes, limpas e seguras a nível dos setores digital, da energia e dos transportes -, envolvendo a tecnológica finlandesa Nokia e a instituição de financiamento do desenvolvimento, Finnfund.
"Estamos a tentar aumentar o nosso papel na promoção da conectividade com a Internet em continentes como África ou Ásia e América Latina, no âmbito desta prioridade", avançou.
Por outro lado, prosseguiu, a cooperação finlandesa pretende incentivar as competências digitais e a utilização da tecnologia na educação, "uma área tradicionalmente forte a nível nacional".
As autoridades finlandesas estão envolvidas através do centro FinCEED (Centro Finlandês de Especialidade em Educação e Desenvolvimento), que tem o mandato de expandir além-fronteiras o bem sucedido modelo educativo finlandês, e também cooperam com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), que criou em Helsínquia um centro de inovação focado na aprendizagem inovadora e na promoção de oportunidades de aprendizagem através da tecnologia e da inovação.
A Finlândia também quer promover a inovação no setor privado, envolvendo as empresas finlandesas na ajuda ao desenvolvimento, "utilizando a sua tecnologia e experiência em vários campos", em vários países.
O país destinou 80 milhões de euros para apoiar projetos relacionados com tecnologia e inovação, mas que também têm em conta a igualdade de género.
Helsínquia integra uma coligação, juntamente com a Tunísia, Arménia, Chile e Ruanda, no âmbito da campanha das Nações Unidas Generation Equality, focada na promoção do papel das mulheres no domínio da tecnologia e inovação, mas também na utilização destas mesmas competências para promover a igualdade de género em vários campos.
"Uma das prioridades tem sido combater a violência de género online, por exemplo, uma prioridade partilhada entre os Governos e o setor privado, as partes interessadas e as organizações da sociedade civil que fazem parte da coligação", disse Enkenberg.
O tema é "especialmente importante agora porque há uma grande reação contra os direitos das mulheres em todo o mundo", comentou.
O objetivo é "tentar garantir que os espaços online, como as redes sociais, sejam seguros, em primeiro lugar, para mulheres e meninas", e, prosseguiu o representante, procurar que "haja regulamentação ou legislação em vigor para lidar com a violência 'online' baseada no género nestas plataformas".
Outra iniciativa da coligação, juntamente com a UNICEF, é a criação de um espaço virtual seguro para mulheres e raparigas, que "pode ser usado em contextos que são bastante difíceis, como contexto humanitário ou países onde os direitos das mulheres não são respeitados", e onde elas possam "aprender sobre os seus direitos".
A campanha da ONU já reuniu até agora 300 milhões de dólares (cerca de 284 milhões de euros).
"O progresso tem sido muito bom até agora, mas a campanha continua até 2026. Portanto, estamos apenas na metade do caminho", acrescentou.
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