Hoje assinala-se o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. A data, comemorada pela Organização das Nações Unidas desde 1992, tem como objetivo promover os direitos e bem-estar das pessoas com deficiência em todas as esferas da sociedade e aumentar a consciencialização da sua presença em todos os aspetos da vida política, social, económica e cultural.
A pandemia de COVID-19, que forçou muitos a tornarem os seus hábitos ainda mais digitais, é um dos temas que marca atualidade, assim como a temática que dá o mote para a comemoração desta data, que, neste ano, se centra em torno da liderança e participação das pessoas com deficiência com vista a um mundo pós-COVID-19 mais inclusivo, acessível e sustentável.
A acessibilidade web está consagrada na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Porém, espelhando o que acontece em muitos outros aspectos da vida em sociedade, ter plataformas digitais, de facto, acessíveis continua a ser uma autêntica luta para os 15% da população mundial que vivem com alguma forma de deficiência.
As associações com quem o SAPO TEK falou destacam que, embora tenha vindo a ser feito algum progresso no que toca à tomada de medidas para fazer com que a Internet seja um espaço mais inclusivo, o panorama está longe de ser o mais adequado, sendo a acessibilidade web um dos campos pelos quais estão também a lutar.
“A evolução das acessibilidades online está claramente melhor que a existente no passado, mas há ainda um longo caminho a percorrer nestas áreas”, afirma Rui Coimbras, presidente da Federação das Associações Portuguesas de Paralisia Cerebral (FAPPC), sobretudo “na vertente de quem desenvolve plataformas de interação «Homem-Máquina»", que muitas vezes nem sequer está alerta para estes temas das acessibilidades”.
A tecnologia evolui, mas há barreiras que persistem
É certo que os websites podem ter um design e aspecto apelativos, sendo ricos em conteúdos interativos, como sons, imagens ou vídeos, porém, como enfatizam as associações, nem todos são acessíveis à maioria das pessoas com deficiência.
Pedro Costa, presidente da Federação Portuguesa das Associações de Surdos (FPAS), destaca as “barreiras na acessibilidade à comunicação/informação pelas pessoas surdas”, em particular a “falta de conteúdos acessíveis em Língua Gestual Portuguesa (LGP) e com legendagem”.
“A maioria dos websites não tem conteúdos plenamente acessíveis para as pessoas surdas”, indica Pedro Costa.
Já Joaquim Cardoso, dirigente na Associação Portuguesa de Deficientes (APD), explica que a acessibilidade web continua a ser uma “questão complexa” para as pessoas que, tal como ele, têm deficiências visuais.
Por um lado, a forma como várias plataformas digitais estão estruturadas não permite um funcionamento adequado por parte dos programas de leitura de ecrã. Até tarefas online consideradas simples, como aceder a uma conta de correio eletrónico, tornam-se quase impossíveis e, mesmo depois se exporem os problemas de acesso às entidades que gerem as plataformas, não há uma resposta adequada.
Por outro, existem outras questões tecnológicas que impactam a experiência online das pessoas com deficiências visuais, incluindo em sistemas operativos como o Windows, cujas atualizações “não têm trazido grandes benefícios à acessibilidade”, enfatiza o responsável. Por exemplo, a funcionalidade de Narrador tem “muitos defeitos de linguística e de leitura” na sua versão em português.
Para lá do leitor de ecrã da Microsoft, é possível encontrar outros programas como SuperNova, JAWS, ou NVDA, sendo esta última open-source e gratuita. Para lá das traduções para português serem “frequentemente muito más”, o preço de alguns destes programas, que pode mesmo chegar à casa dos milhares de euros, é para muitos uma barreira, apesar dos apoios que existem.
“Grande parte das pessoas com deficiência vive de pensões ou de salários baixos e, portanto, muitas vezes não tem condições para comprar estes sistemas”, detalha Joaquim Cardoso.
No que toca às pessoas com deficiências motoras, Rui Coimbras afirma que se fazem sentir algumas mudanças positivas que advêm da evolução da tecnologia, como o “aparecimento de novos periféricos que ajudam em toda a articulação entre homem e a máquina”, assim como funcionalidades adaptadas incluídas em sistemas operativos.
No entanto, o presidente da FAPPC indica que a necessidade da utilização do rato de computador para aceder às plataformas continua a ser das principais barreiras no acesso para as pessoas que têm deficiências motoras.
Note-se, por exemplo, o caso de plataformas com “interfaces complexas de autenticação”, como os websites de homebanking, onde é necessário usar o rato para clicar “em caixas de números extremamente pequenos”.
“Para quem não tem a precisão manual necessária para manipular o rato, corre o risco de ter de enfrentar um «pequeno filme» de cada vez que quer efetuar um login”, explica Rui Coimbras.
“A segurança neste tipo de sítios é vital, de acordo, mas há certamente outras formas de autenticação, mesmo em écrans «feios» mas funcionais”, sublinha Rui Coimbras, que indica ainda que “são as pessoas com deficiência, por uma questão de evidente necessidade, que acabam por criar estratégias na interação com os dispositivos tecnológicos”.
Como resolver os "pormaiores" da acessibilidade web?
A pandemia de COVID-19 veio por “a nu” muitas das dificuldades que existem no acesso ao mundo digital, incluindo para as pessoas com deficiência, servindo, em parte, como um alerta para a necessidade de mudança nas questões de acessibilidade.
Como destaca Pedro Costa, a criação do serviço de acessibilidade à linha SNS24 foi um passo em frente neste contexto, em linha com uma “das principais lutas que a FPAS e a Comunidade Surda travam há muitos anos: o “direito de acesso aos serviços de saúde”.
A aplicação mobile MAI112, disponível para Android e iOS, que permite que pessoas surdas possam contactar serviços de emergência, foi também um passo importante. “Consideramos fundamental que a Língua Gestual Portuguesa seja promovida em toda a sociedade, garantindo-se uma acessibilidade plena para todos”, enfatiza.
“De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, devem ser tomadas as medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em condições de igualdade com os demais, ao ambiente físico, ao transporte, à informação e comunicações, incluindo as tecnologias e sistemas de informação e comunicação”, sublinha Pedro Costa.
Mas como ultrapassar as barreiras que marcam o atual panorama da acessibilidade digital? Joaquim Coimbra da APD afirma a necessidade de uma entidade ou autoridade que esteja mais atenta à questão da acessibilidade digital e que efetivamente apoie corretamente as pessoas com deficiência na área das novas tecnologias”, sublinhando que, neste campo, sente que ainda há indiferença às necessidades das pessoas com deficiência por parte da Administração Pública.
“Considero que as tecnologias dão uma ajuda preciosíssima: quanto mais forem acessíveis e quanto mais efetivamente houver apoio para que nós possamos aceder”, afirma Joaquim Coimbra.
Já Rui Coimbras afirma que para serem ultrapassadas as atuais barreiras neste campo “a Academia deve ensinar e despertar para as questões das acessibilidades a todos os web designers e programadores front-end no sentido de promover as acessibilidades para todos em respeito das normas do desenho universal”.
A tecnologia pode fazer a diferença na vida das pessoas com deficiência , incluindo na forma como votam, indica Rui Coimbras, indicando que a FAPPC têm vindo a lutar pela acessibilidade neste campo através de um projeto desenvolvido em parceria com a IBM e apresentado desde 2017 a entidades públicas, privadas e decisores políticos.
Quem desenvolve aplicações e portais web deve também ter “em consideração, desde o início, todas as regras a nível de acessibilidade digitais”, indica o responsável da FAPPC. “Se calhar, ou tão ou mais importante, contratar para as suas equipas de testers pessoas com dificuldades no que diz respeito às acessibilidades digitais. Para as empresas que levem este assunto mais a sério, a contratação e o trabalho em equipa deve começar logo no início do desenvolvimento da solução.”
“Quanto mais cedo estes «pormaiores» e não pormenores forem analisados e discutidos, melhor será a acessibilidade. O início pode não ser fácil, mas no final todos vão sair a ganhar, realça o presidente da FAPPC.
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