A internet, tal como sempre a conhecemos, tem vindo a evoluir e a transformar-se e certamente já ouviu falar no conceito Web3. Inicialmente a internet não era mais que servidores ligados por cabos que permitiam a comunicação entre computadores. A navegação pelas páginas estáticas permitiam ao utilizador ter acesso à informação, mas apenas num modo de leitura.
A Web2 é aquilo que ainda estamos a presenciar, uma maior interação, sendo as redes sociais a principal bandeira desta geração da internet: o Facebook, o YouTube, o Twitter. Plataformas onde os utilizadores deixam de ter um papel passivo das visitas das páginas, para se tornarem, eles próprios, criadores de conteúdos, sejam os vídeos ou fotografias, mas também a possibilidade de expressar a sua opinião sobre os assuntos que assiste.
Esta é também considerada a versão centralizada da internet, uma vez que as grandes empresas tecnológicas mantêm os dados dos utilizadores, que se tornam eles próprios o produto: seja pela venda dos seus dados a terceiros ou a possibilidade de serem alvo de publicidade personalizada, com base na sua navegação e pesquisas online.
É nesse sentido que surge a Web3, um futuro da internet que se está a moldar e que procura, acima de tudo, tentar corrigir os problemas da Web2. Ou seja, procura-se uma descentralização das bases de dados, utilizando uma tecnologia chamada blockchain. Blockchain, criptomoedas e NFTs são os principais termos que mais representam esta revolução da Web3.
A tecnologia blockchain foi inventada em 1991 pelos criptógrafos Stuart Haber e Scott Stornetta, num projeto ligado a selos temporais para documentos digitais. Apenas em 2009 a ideia iria ter o reconhecimento atual, com o lançamento da Bitcoin, criada pelo inventor que dá como pseudónimo Satoshi Nakamoto, durante o período da crise financeira mundial. A ideia destas criptomoedas estava ligada a um registo público partilhado, em projetos de resolução de problemas matemáticos complexos. Sempre que era criado um bloco do objetivo traçado era criado um bitcoin de recompensa pelo esforço. E foi com o projeto Bitcoin que surgiu associado o conceito generalizado de Web3.
Para Hugo Volz Oliveira, Secretário e membro fundador do Instituto New Economy, a Web3 é uma visão alternativa para um futuro da internet e que se recupera a natureza descentralizada do ciberespaço, como se integram os direitos de propriedade na experiência do utilizador. Ou seja, há uma otimização da forma como se comprova a identidade digital, como se partilham dados ou se transferem e comercializam ativos.
Web3 pretende criar os alicerces para um sistema financeiro global a funcionar de forma eficiente e confiável
Hugo Volz Oliveira esclarece que Web3 tem semelhanças com a Web 3.0, a terceira geração da internet que foi proposta por Tim Berners-Lee, mas diz ser uma alternativa diferente, mesmo que “ambas estejam focadas na descentralização e no combate à concentração do poder nos grandes grupos tecnológicos”. Explica que o próprio pioneiro da World Wide Web não gosta do conceito da Web3, “criticando o espaço por ser muito lento, caro, e público - tudo criticismos que estão a ser endereçados e que também foram apontados às primeiras versões da internet, e que interessam a Tim Berners-Lee fazer pois tem uma startup na área cujo sucesso depende do falhanço da criptoeconomia”.
Nas palavras do especialista, a grande vantagem que a Web3 pretende trazer aos utilizadores é a consolidação de uma infraestrutura pública de internet e das aplicações mais críticas que nela correm e que dominam a nossa vida, mas que também seja capaz de sobreviver aos desafios dos tempos no futuro.
“A tecnologia blockchain e a criptoeconomia querem-se aborrecidas, mas a liquidez constante e a volatilidade atraem a curiosidade das pessoas”, salienta Hugo Volz Oliveira. A frase explica que se tratam da infraestrutura de base, “a canalização”, que depois gera impacto através da automatização de processos. Apesar de considerar que esta automatização não é novidade, sendo apenas uma transformação digital, esta está associada a processos que permitem transferir valor a nível mundial, “daí a expressão criptoeconomia, o que permite abranger áreas da automação que nunca tinham sido tocadas e pelas quais ainda teríamos de esperar muitas décadas para vir a ter um sistema financeiro global a funcionar de forma eficiente e confiável”.
E é neste ponto que entra a tal descentralização dos processos, aumentando a resiliência de alicerces críticos “que hoje estão malcuidados, porque não os vemos no dia-a-dia, mas que se olharmos atentadamente podemos antever os seus riscos”, apontando como exemplo as recentes falências no sistema bancário norte-americano, tal como já tinha comentado num artigo de opinião para o SAPO TEK.
Mas as ferramentas da Web3 também têm as suas desvantagens. Sendo uma tecnologia emergente, ainda está a passar pela fase de ganhos de eficiência para melhorar os seus custos, rapidez e capacidade de escala, explica o especialista. No entanto, salienta o ritmo de evolução como “gigante”, apontando a evolução das versões originais do Bitcoin e Ethereum com as de hoje em dia, onde se vê melhorias consideráveis, dentro do seu escopo de atividade. E mesmo outros projetos concorrentes, “que tentam destronar estes líderes”, também são apontados como inovações muito promissoras que vão ultrapassar as vantagens iniciais apontadas, levando a que a “maioria dos incumbentes as ignorassem”.
Reputação dos criptoativos “nunca esteve melhor”
Questionado sobre a reputação atual dos criptoativos, Hugo Volz Oliveira considera que “nunca esteve melhor, com a aprovação estrondosa do MiCA, o regulamento europeu para a criptoeconomia”. Afirma que este poderá tornar-se no exemplo mundial da área, com mais de 90% dos votos dos eurodeputados no Parlamento Europeu e que, entretanto, foi validado pelo Conselho da União Europeia. Por outro lado, afirma que o uso ilícito de criptomoedas também atingiu mínimos históricos em 2021 (0,12%) e 2022 (0,24%), citando dados da Chainalysis, uma empresa de análise forense em blockchain.
Associa as questões dos riscos de investimento ligados a um tema de literacia financeira, e não propriamente a ver com os criptoativos. “Qualquer investimento acarreta riscos e uma pessoa pode envolver-se na criptoeconomia sem ter de investir nesta, interagindo apenas como utilizador”. Acredita que quem investe, a maioria dos perigos tem estado associada com o day trading, por oposição a investimentos realizados a longo prazo, ou com a utilização de plataformas de investimento que não estão reguladas.
Os NFTs são outro aspecto ligado à Web3, em que basicamente os itens digitais são únicos e transferíveis. O SAPO TEK registou coleções com valores astronímicos durante 2022, mas o tema tem vindo a perder algum fulgor mediático. Para o especialista do Instituto New Economy, este continua a ser um mercado muito ativo. Refere a falência do stablecoin do projeto Terra em maio de 2022, que diz ter acelerado a chegada do chamado bear market, com a mudança de política económica dos grandes bancos centrais. “Nas partes mais negativas dos ciclos de mercado ouve-se falar menos dos projetos ou sectores já existentes pois a maioria dos investidores está à procura da próxima pedra que reluz que acorde os seus espíritos animais”.
Veja na galeria imagens de alguns NFTs mais caros
É referido que a regulação das criptomoedas em Portugal já é muito madura. No entanto, como Estado-membro da União Europeia, o país responde aos regulamentos europeus, como o MiCA e TFR, sobre as stablecoins, emissões de tokens associados a novos projetos de investimento, as plataformas de câmbio, assim como a custódia dos criptoativos e respetivas atualizações às regras existentes de branqueamento de capitais. Acrescenta que a nível nacional já há um regime de tributação referente aos ganhos em criptomoedas que é competitivo, estando alinhado com o alemão, mantendo-se entre os três regimes de liderança dentro da União Europeia.
Nesse sentido, Hugo Volz Oliveira considera um excelente projeto aquele que foi apresentado recentemente pelo Banco de Portugal, por estar totalmente alinhado no tema da literacia financeira digital, que acaba por ser um objetivo importante do Instituto New Economy, que lidera. Afirma ainda que existem mais fraudes ligadas ao MB Way e cartões de crédito e com mais impacto do que as relacionadas com criptoativos.
Como será a tecnologia associada à Web3 na próxima década?
O SAPO TEK pediu a Hugo Volz Oliveira que traçasse o futuro das tecnologias como o blockchain, NFTs e criptomoedas para os próximos 10 anos. Na sua visão, “daqui a uma década estas tecnologias já terão de ter evoluído para a maturidade ou então arriscam ser ultrapassadas por outras desenvolvidas por incumbentes ou por novos players”.
E não tem problema em mencionar que foi isso que aconteceu com o sector das criptomoedas, que devido à transformação digital da banca e das fintech de pagamentos internacionais, tornou menos relevante as promessas dos pagamentos globais instantâneos. Os maiores projetos evoluíram para servir outras necessidades dos utilizadores, “ainda que as transferências entre continentes tenham muita fricção para resolver, que nem as fintech ou as criptomoedas conseguiram endereçar por enquanto”.
Nos próximos 10 anos deverá haver um aumento de adoção das tecnologias, mesmo que isso signifique que mais aplicações passem a utilizar esta infraestrutura, sem que os utilizadores notem necessariamente essa mudança. Passam a beneficiar de custos inferiores, maior controlo dos seus dados, assim como uma experiência mais integrada e segura com os seus ativos digitais, acrescenta o especialista.
Será que a descentralização torna a tecnologia mais complicada e inacessível a utilizadores básicos? Hugo Volz Oliveira concorda que numa primeira fase sim, tal como nos primórdios na internet e do email isso aconteceu, “porque tínhamos poucos utilizadores, porque ninguém tinha os seus próprios servidores ou clientes. Considera que a blockchain está nesse ponto, mas começou a sua transição para a fase seguinte, onde a tecnologia é abstraída e os utilizadores passam a poder interagir de uma forma mais acessível com as aplicações que usam. Considera que é preciso haver maior promoção na educação, de forma a cativar talento a desenvolver para esta área.
Mesmo que a tecnologia descentralizada da Web3 não se torne o sucesso esperado, há um ponto importante a reter: a concorrência centralizada começou a diminuir custos e a melhorar as suas ofertas nos mercados, e para Hugo Volz Oliveira, essa já é uma vitória. “É altamente plausível que os bancos e as fintech tivessem resistido durante muito mais tempo a transformação digital se não tivessem sentido a picada de uma indústria concorrente paralela”. Considera que as fintech estavam a ter dificuldade em serem respeitadas e até integradas pelo paradigma regulador, mas com a entrada em cena de Bitcoin “percebeu que se não aceitasse a inovação dentro do sector bancário iria ter inovação externa mais difícil de incorporar no sistema existente”.
O especialista afirma que este exemplo serve para outras indústrias ou sectores, tais como as finanças ou mercados de crédito, gestão de identidade e propriedade, assim como as indústrias da arte e música, “em que estas novas tecnologias estão a mostrar aos artistas, especialmente aqueles que não dominam os topos dos rankings, que podem ganhar mais com os frutos da sua criatividade”.
De uma forma resumida, os entusiastas da Web3 argumentam que vão (estão) ser criadas novas economias, novas classes de produtos e serviços online. Mas acima de tudo, defendem que haverá um regresso da democracia na web, definindo a próxima era da internet.
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