Por Sílvia Bessa Venda (*)

A Web Summit 2025 terminou, mas continua a gerar repercussão global. Na China, o evento foi alvo de ampla cobertura mediática, e a imprensa internacional, incluindo a portuguesa, foi unânime: Pequim conquistou o maior destaque desta edição. A mensagem é clara: a China quer liderar a próxima era da Inteligência Artificial (IA), mas reconhece os desafios regulatórios impostos pela Europa.

Um mês antes do evento, o cofundador Paddy Cosgrave escrevia no LinkedIn: “China has won the 21st Century. There is no great power competition. It’s over.” (tradução: A China venceu o século XXI. Não há competição entre grandes potências. Acabou.). Mais: anunciou uma edição do Web Summit na China em 2027, pedindo sugestões para a cidade anfitriã – Xangai e Shenzhen lideraram as preferências.

Este protagonismo traduziu-se na criação da China Summit, um espaço dedicado a IA, deep tech e transformação industrial, onde robôs humanoides roubaram a cena. O objetivo? Mostrar como a China está a moldar a inovação global e explorar oportunidades de colaboração com a Europa.

Tecnologia e Geopolítica: Ambição vs Regulação

A Europa deixou claro: inovação sim, mas com regras. Com a entrada em vigor do AI Act em 2024, a União Europeia (UE) estabeleceu o primeiro quadro regulatório abrangente para a AI, aplicável a empresas, de dentro e fora da UE, que pretendem comercializar no mercado interno. Entre as práticas proibidas estão a manipulação do comportamento e técnicas que comprometem a autonomia do consumidor. As sanções podem atingir 35 milhões de euros ou 7% do volume de negócios global.

Esta nova legislação não prejudica a aplicação das regras da concorrência, nomeadamente no que respeita à utilização de IA para a prática de ilícitos anticoncorrenciais, tais como a fixação de preços através da utilização de algoritmos inteligentes e softwares de reprecificação fornecidos por terceiros (configuração hub and spoke, em que o terceiro atua como intermediário), ou os abusos de posição dominante, designadamente através do autofavorecimento nos resultados de pesquisa, da discriminação de preços, da recusa de acesso a infraestruturas essenciais, ou da imposição de vendas ligadas.

A Web Summit 2025 demostrou que tecnologia não conhece fronteiras – mas a regulação sim. O sucesso das empresas chinesas em solo europeu dependerá da sua capacidade de inovar e, ao mesmo tempo, cumprir com as regras europeias. Na nova era digital, o compliance é tão estratégico quanto a tecnologia.

(*) Advogada e Professora de Direito da Concorrência e do Consumidor na Universidade Portucalense.