Por Hugo Volz Oliveira (*) 

A fraude da FTX tem causado mossa. Mas o seu irónico efeito colateral não se cinge apenas ao mercado. Os media também têm sido afectados. Mais do que nunca, importa perceber as diferenças entre a última insolvência do espaço, a da BlockFi, e a queda da bolsa de Sam Bankman-Fried. E abrir a porta à comparação entre estas e algumas críticas apontadas ao sector.

Ora, a BlockFi era, até à segunda-feira passada, uma das grandes financeiras centralizadas da indústria. Fundada em 2017, esta empresa começou por intermediar empréstimos em dólares por contrapartida de criptoactivos. Os clientes ou pagavam de volta ou ficavam sem o colateral, sendo este um negócio popular no contexto do planeamento fiscal comum nos EUA.

Mais tarde, para além de se iniciar na compra e venda de criptoactivos, ou trading, também expandiu a actividade financeira, tentando assemelhar-se a um banco. Assim, em 2019 passou a oferecer produtos financeiros mais complexos, tendo deixado de apenas emprestar dinheiro. Ou seja, passou a aceitar depósitos com o objectivo de os reinvestir em nome dos clientes. 

O sucesso destas contas, que pagavam juros de até quase 10%, catapultou a empresa para uma nova escala e, em Março de 2021, já estava avaliada em $3 mil milhões, gerindo $15 mil milhões em activos de 225,000 clientes. Tal como experienciado por outras fintech, como a Revolut, este crescimento acelerado atraiu o faro dos reguladores, que antecipavam problemas de gestão.

Vários estados americanos começaram a proibir as actividades da BlockFi e em Fevereiro deste ano, a SEC, a agência equivalente à CMVM nos EUA, eventualmente chegou a acordo com a empresa. Mas isto só depois de a condenar ao pagamento de uma multa de $100 milhões e de a ter obrigado a deixar de servir o mercado norte-americano. E entretanto os preços desciam.

Isto pois, no rescaldo da mudança de política monetária da Reserva Federal dos EUA no final de 2021, a maioria das acções e os preços dos criptoactivos começaram a cair à medida que os investidores antecipavam que os bancos centrais do mundo iam diminuir a liquidez global, aumentando as taxas de juro, para tentar mitigar os efeitos da inflacção que se avizinhava.

Estas condições adversas levaram ao colapso de outros participantes da indústria que tinham recebido empréstimos da BlockFi, o que desencadeou o pedido de falência da semana passada. Já que no verão, para colmatar esses créditos malparados, a empresa tinha recorrido à mão de Sam Bankman-Fried, fundador da FTX, que estendeu uma linha de crédito de $400 milhões. 

Com o colapso daquela bolsa, a BlockFi ficou sem financiamento – e também perdeu cerca de $1000 milhões, parte sob custódia da FTX e parte emprestada à Alameda Research, outra empresa detida por Sam Bankman-Fried. Apesar de ter sido forçada a fechar, os advogados do processo têm indicado que, neste caso, não houve fraude nem falta de regulação ou de controlos.

Em resumo, estamos perante um caso de má gestão, como acontece no mundo empresarial. Também várias empresas tecnológicas sofreram com esta crise, quer por gestão, quer por contágio. A Meta do Facebook chegou a perder 77% da sua avaliação bolsista e até a Amazon perdeu cerca de 50%. A Zoom perdeu quase 90% e a Bird, das infames trotinetes, perdeu 97%. 

Só que, quando se trata da cripto economia, vemos que algumas instituições têm aproveitado a crise generalizada no sector tecnológico para reforçar o ataque à tecnologia descentralizada. Um post publicado no blogue do Banco Central Europeu, com o título “O último reduto da Bitcoin”, é um excelente, embora triste, exemplo. Porque a argumentação é pobre e desonesta. 

Dada a suposta credibilidade institucional do canal de comunicação, este exemplo merece um artigo à parte para detalhar as suas falácias, transversais a outras críticas que teimam em bater nas mesmas teclas. Entretanto há que continuar atento porque os interesses instalados, à esquerda e à direita, vão continuar a investida. Ah, é tão fácil atacar quem já está no chão!

(*) Secretário do  Instituto New Economy