Por Carlos Zorrinho (*)

A nova regulamentação dos mercados e serviços digitais visa regular esses mercados com os mesmos princípios e valores que se aplicam nos mercados analógicos e que derivam dos princípios e valores comuns da parceria europeia e em particular do mercado único.

Num quadro de globalização acelerada, ainda mais evidente no mundo digital, o objetivo fundamental é garantir que qualquer empresa que atue no mercado europeu, o faça no quadro legal vigente, criando assim mercados mais justos, abertos, transparentes e competitivos.

Para conseguir assegurar esse objetivo os regulamentos aprovados, tendo consciência da forte concentração existente e do papel dominante de alguns operadores,  baseiam-se no princípio da designação das grandes plataformas em linha de muito grande dimensão, dos motores de pesquisa em linha de muito grande dimensão e dos controladores de acesso, como primeiros responsáveis por garantir a aplicação das regras, com o incentivo de desenvolverem de forma sustentada os mercados e os serviços e de evitarem serem multadas por incumprimento. Numa imagem simples, atribui-se à raposa o papel de guardar o galinheiro, ou seja, de manter um ecossistema justo e aberto de utilizadores e consumidores como condição da sua própria sobrevivência enquanto parte desse ecossistema.

Para este efeito são nomeados plataformas e motores de pesquisa em linha de muito grande dimensão, no contexto dos serviços digitais, aqueles que tiverem mais de 45 milhões de utilizadores ativos na União Europeia (UE). No contexto dos mercados digitais será considerado controlador de acesso quem tiver realizado na UE um volume de negócios anual de pelo menos 7500 milhões de euros em cada um dos últimos 3 anos ou tiver uma capitalização bolsista no valor de pelo menos 75 mil milhões de euros e contar com pelo menos 45 milhões de utilizadores finais ativos mensalmente e pelo menos 10 000 utilizadores profissionais estabelecidos na UE.

O que podemos esperar da aplicação da nova regulamentação para tornar os serviços e os mercados digitais mais justos e abertos? Sem ser exaustivo, destaco que as plataformas e os motores de busca deverão garantir nos serviços digitais, a não divulgação de conteúdos ilegais, o respeito dos direitos fundamentais, a não promoção da violência física ou psicológica, a não utilização de interfaces enganadores, e a não divulgação de publicidade dirigida não autorizada e de publicidade específica dirigida a menores.

Já os controladores de acesso aos mercados digitais deverão assegurar o direito de cancelar assinaturas indesejadas, não impor software no sistema operativo, assegurar a interoperabilidade das funcionalidades básicas das mensagens instantâneas, permitir o acesso a funcionalidades para criar novas aplicações, informar os vendedores dos seus dados de vendas e perfis de desempenho e impedir publicidade direcionada não autorizada.

O não cumprimento destas atribuições será penalizada com multas de 6% do volume de negócios anual no caso das plataformas e motores de pesquisas e de 10 a 20% nos controladores de acesso. No caso dos serviços, o sistema de supervisão é assegurado pela Comissão Europeia em articulação com os Estados-membros, sendo o sistema reforçado, no caso dos mercados por um comité consultivo e um grupo de alto nível que prestarão assistência à Comissão Europeia.

A aplicação da nova regulamentação não é fácil, mas será determinante para afirmar um mercado único digital inspirado pelos princípios e valores comuns da União Europeia que incorporam a sua identidade digital. Uma identidade que é a chave da relevância, da autonomia estratégica e da competitividade da UE nos mercados digitais globalizados dos nossos dias.

(*) Eurodeputado. Relator do Regulamento dos Mercados Digitais (DMA) na Comissão de Indústria, Investigação e Energia