Chama-se Copernicus Atmosphere Monitoring Service (CAMS) e, de uma forma muito básica, “manda” na meteorologia da Europa. Especificamente, tem a seu cargo a observação da “qualidade do ar e composição atmosférica, da camada de Ozono e radiação ultravioleta, dos fluxos de emissão, da radiação solar e das alterações climáticas". Faz isso com a ajuda dos satélites Sentinel do programa Copernicus, lançado há 20 anos pela União Europeia em parceria com a ESA.

Chefias, colaboradores e demais interessados ligados ao sistema, que tem o ambiente e clima da Terra “debaixo de olho” 24 horas, sete dias por semana, escolheram Lisboa para o encontro anual, que começou a 16 de outubro e termina esta sexta-feira, 18 de outubro.

Copernicus: o maior observador da Terra já leva duas décadas no Espaço
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Reunidos, oficialmente, em “assembleia geral”, mas também organizados em pequenos grupos de trabalho e discussão, a intenção é repensar a melhor forma de continuar a dar resposta aos diferentes desafios que o CAMS tem em mãos, sejam eles ao nível da meteorologia ou das alterações climáticas, passando pelos incêndios e outros desastres naturais.

Hoje, com sete satélites ao seu serviço, o programa Copernicus recolhe terabytes de dados todos os dias, preciosos para avaliar o estado do planeta Terra.

Dos registos que os satélites Sentinel fazem resultam, muitas vezes, imagens de rara beleza da Terra

Além do ambiente e clima, com a informação reunida o sistema europeu também dá resposta às áreas da emergência e segurança. Mas foi sobre os primeiros temas que o SAPO TEK falou com Vicente-Henri Peuch, diretor do CAMS, no European Weather Centre (ECMWF). A primeira pergunta tinha a intenção de quebrar o gelo inicial e brincar um pouco com o tema. Vicente-Henri Peuch respondeu muito a sério.

SAPO TEK: Como é ser responsável pelo tempo que faz na Europa? Recebe muitas queixas? É que as previsões nem sempre funcionam…

Vicente-Henri Peuch: No mundo somos conhecidos como quem fornece previsões com a melhor qualidade. Desse ponto de vista, comparam-nos muito com o modelo norte-americano. Na Europa tentamos ser melhores. Primeiro que tudo somos uma instituição europeia, com apoios e recursos. Depois temos a maior base de dados de observação do mundo para a meteorologia. Conseguimos “escolher a dedo” as melhores mentes do mundo para trabalharem connosco em diferentes aspectos, que preenchem diferentes áreas. Temos centenas de pessoas a concorrerem e como resultado temos uma força de trabalho muito diversa, tanto em origem, porque são de vários países, como em expertise.

“Mudou tudo com o Copernicus. Antes estes serviços na área do ambiente não existiam”

Uma grande diferença face aos Estados Unidos talvez também seja o facto de os orçamentos norte-americanos  nesta área oscilarem muito consoante a Administração que toma posse. Tem altos e baixos e isso não é bom para implementar uma política a longo prazo. No nosso caso temos um plano que vai até 2025, com o compromisso dos Estados-membros. Por isso, sim: Tratar do “tempo” é difícil, é difícil fazer previsões, mas somos uns sortudos por termos todo este apoio, nesta organização.

SAPO TEK: Os instrumentos de observação e de medição evoluíram muito nos últimos anos? Há muitas diferenças face a 1998 quando o programa foi lançado? Como é que a tecnologia tem ajudado?

Vicente-Henri Peuch: Em 1998 quando foi assinado o acordo para o programa Copernicus as capacidades de observar o ambiente eram muito limitadas. Já existiam algumas observações, mas nada de especial. Se não tivéssemos meios para medir a forma como o meio ambiente na Terra está a mudar, basicamente, significava que nunca o iríamos fazer, porque não conseguiríamos fazê-lo, ver se havia avanços ou não, se as medidas estavam a funcionar. Assim temos um sistema operacional 24/7, com capacidade permanente de analisar a atmosfera, a superfície da terra, oceanos, emergência e segurança.

SAPO TEK: O que é que mudou com o Copernicus? Sem os satélites em órbita que nos dão toda esta informação, o que aconteceria “cá em baixo”?

Vicente-Henri Peuch: Mudou tudo. Antes estes serviços na área do ambiente não existiam. Tínhamos cientistas e académicos a fazerem estudos sobre algumas coisas, mas não tínhamos formas de monitorização. Se o Copernicus não existisse teríamos um sistema experimental sem garantias. Com o programa temos um compromisso a longo prazo. A Europa transformou-se num player importante na área do ambiente. Tem um papel crucial no estabelecimento de serviços relativamente às alterações climáticas.

O conjunto de dados sobre as temperaturas de 2017 mostram que este foi o terceiro ano de seguida excecionalmente quente

O Copernicus veio preencher esta lacuna de fornecimento de instrumentos de observação, mostrar como os oceanos mudaram ao longo do tempo, como mudou a qualidade do ar, entre outros aspectos. Essa é a principal motivação do programa.

"A Europa transformou-se num player importante na área do ambiente. Tem um papel crucial no estabelecimento de serviços relativamente às alterações climáticas"

Essas foram as intenções iniciais, dar resposta em termos de monitorização ambiental, mas depois surgiu a crise, em 2007/2008, e a ideia de que as economias do futuro iam estar menos dependentes das indústrias da manufaturação e mais nas indústrias baseadas do conhecimento e este foi um segundo nascimento para o Copernicus, ao perceber que não só a sua informação era necessária para assegurar que os tratados e regulação decididos a nível internacional estavam a ter os resultados esperados, mas também uma forma de gerar uma economia. Hoje estamos em 2018 e temos esses dois pilares da informação pública monitorizar os tratados e ajudar as empresas a desenvolverem-se mediante a informação que fornecemos.

SAPO TEK: Acerca dessa vertente mais “empresarial”, estão também em Portugal para falar sobre as oportunidades que o Copernicus pode oferecer às organizações na chamada “economia do Espaço”, relativa aos negócios que podem nascer da exploração do Espaço. Como é que fazem isso?

Vicente-Henri Peuch: O Copernicus é um serviço público, financiado por dinheiros públicos, mas medimos o nosso sucesso pelo sucesso dos nossos utilizadores. Digamos que fazemos o “trabalho pesado”, porque os satélites são muito engraçados, mas são muito complexos, com muitos instrumentos, com diferentes modelos de operação para fazerem as observações necessárias, com supervisionamento… É mesmo um grande desafio.

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O princípio do Copernicus é fazer este trabalho todo mais custoso e complexo para a Europa, apresentar os resultados de uma forma “pré-digerida”, de modo gratuito e aberto, acompanhado de suporte. Depois as várias entidades, desde a Administração Pública às PMEs podem usá-los para prestarem serviços aos utilizadores, sem terem que contratar serviços especializados ou peritos. O objetivo é sermos uma fonte de confiança para estes negócios, independentemente das aplicações e serviços desenvolvidos.

SAPO TEK: Acha que Portugal está bem posicionado para vir a representar um papel importante nesta nova economia do Espaço, com os planos de criação da base de lançamento de micro satélites nos Açores e toda a dinâmica de startups e parcerias a que se está a assistir?

Vicente-Henri Peuch: Ter a capacidade para lançar micro satélites é certamente um ponto importante. O Centro Internacional de Investigação do Atlântico – AIR Centre também é interessante porque penso que, nesta economia em desenvolvimento, o papel da investigação e da investigação para aplicação são importantes. Esta é uma economia que é muito mais ágil… Se houver investimento público em investigação e se os resultados dessas investigações chegarem às pequenas empresas, às parcerias, aos projetos conjuntos, para se desenvolverem aplicações inovadoras, será uma excelente estratégia por parte de Portugal.

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