O Observatório Pierre Auger foi fundado há mais de duas décadas e os dados que recolheu já ajudaram a desvendar alguns dos
enigmas que rodeiam as partículas cósmicas mais energéticas algumas vezes detetadas, com energias que podem ultrapassar os 1020 eV (o que corresponde à energia macroscópica de 16 joules). Estas partículas são predominantemente núcleos de átomos de diversos elementos (do hidrogénio ao silício) e chegam até nós de fontes astrofísicas fora da nossa galáxia.

Agora os dados recolhidos vão estar disponíveis de forma aberta, numa lógica de open data, e este mês a Colaboração Pierre Auger acaba de tornar públicos 10% dos seus dados. "Estes dados estão acessíveis a todos aqueles que, com diferentes objetivos, possam beneficiar com a sua utilização: não apenas à comunidade científica em diversas áreas relacionadas, da física de partículas à astronomia, e à formação avançada em qualquer parte do mundo, mas também a todos os que os queiram utilizar no âmbito de projetos educativos ou de divulgação cientifica, assim como em projectos de ciência feita pelos cidadãos", pode ler-se no comunicado à imprensa.

A disponibilização de dados, que se junta à política de acesso aberto aos resultados científicos, promove também a criação de redes abertas de ciência e de ciência cidadã e 0 objetivo é aumentar a quantidade e diversidade de pessoas com a acesso real à ciência, aumentado assim o potencial de desenvolvimento global.

À procura dos mistérios das partículas cósmicas

No observatório, localizado na Argentina, os cientistas observam as partículas cósmicas que chegam à Terra de fontes astrofísicas fora da nossa galáxia.  Quando uma partícula cósmica de muito alta energia atinge a atmosfera origina uma cascata de milhões de partículas, que é observada pelos detetores do Observatório Pierre Auger numa área de 3000 km2 na pampa Argentina, reconstruindo a partir da informação recolhida as características da partícula inicial.

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Este é mais um canal de observação do Universo, neste caso por meio de partículas, que se vem juntar à astronomia baseada na radiação eletromagnética de uma diversidade de comprimentos de onda, dos raios X às ondas rádio passando pela luz visível. O observatório explica que, todos juntos, estes canais de observação constituem a chamada astronomia multi-mensageiros, em que se têm feito grandes avanços nos últimos anos.

Apesar da sua relativa complexidade, espera-se que os dados do Observatório Pierre Auger consigam captem a atenção de uma parte da comunidade de astrónomos amadores, em Portugal e noutros países, adianta também o LIP, Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas, que é a instituição de referência para a física experimental de partículas e as tecnologias associadas em Portugal.

Os dados do Observatório estão acessíveis a partir do site da colaboração Pier Auger e do LIP, e incluem os dados “em bruto” directamente recolhidos pelos instrumentos e dados já tratados por programas de reconstrução e análises com diversos níveis de complexidade. Em acesso aberto estão todos os diversos níveis, de forma a permitir a sua utilização mais alargada. São também disponibilizados programas que permitem analisar os dados, assim como toda a documentação associada.

Colaboração com Portugal no desenvolvimento de instrumentos

O LIP tem um núcleo de investigação ligado ao observatório Pierre Auger que também está envolvido na melhoria dos detetores. Segundo a informação partilhada, a colaboração está a instalar cintiladores no topo de cada detetor de Cherenkov, e a eletrónica de aquisição de dados esta a ser substituída por outra mais rápida. O objetivo é melhor o conhecimento das diferentes componentes das cascatas de raios cósmicos.

Uma parte do Observatório será equipada com detetores adicionais que permitirão calibrar e estudar de forma detalhada as partículas. Nos últimos anos, a equipa do LIP esteve envolvida no desenvolvimento do projeto MARTA, um esforço conjunto Portugal-Brasil para medir diretamente a componente muónica dos chuveiros utilizando detetores de câmaras de placas resistivas (RPCs) instaladas por baixo dos detetores de Cherenkov.

"Estas RPCs com baixo fluxo de gás, capazes de trabalhar num ambiente hostil, ao ar livre com pouca manutenção, foram desenvolvidas na LIP em Coimbra e construídas em cooperação com o grupo de São Carlos, Brasil", refere-se no site do LIP. O grupo do laboratório português adquiriu também conhecimento da física dos chuveiros atmosféricos e desenvolveu métodos e ferramentas de análise inovadores que permitirão dar contributos importantes para a análise dos novos dados do Auger.